Para baixar este livro gratuitamente em formato PDF, acessar o
site do “Projeto Livro Livre”: http://www.projetolivrolivre.com/
(Download)
↓
(Download)
↓
Os livros estão em ordem alfabética: AUTOR/TÍTULO (coluna à
esquerda) e TÍTULO/AUTOR (coluna à direita).
Linguagem e Formalismo em
Broquéis
O livro de Maria Helena
Camargo Regis, Linguagem e Versificação em Broquéis, é o único a que tive
acesso que trata exclusivamente do livro Broquéis. Publicado em 1976,
tem o grande mérito de
desenvolver uma análise focada sobre as virtudes do livro e os significados de sua linguagem.
Antes dela, pelo menos um
outro estudo de fôlego incidia sobre a linguagem do poeta simbolista. Trata-se do texto de Antônio
de Pádua, À Margem do Estilo de Cruz e Sousa, publicado originalmente em
1946 e reunido também na Fortuna Crítica do poeta. O estudo de Pádua, ainda que não centrado em Broquéis, precisa
dele retirar matéria para a pesquisa.
As
considerações de Pádua partem da premissa de que o solo comum aos simbolistas foi
o parnasianismo. Para o estudioso, nenhum defeito, em si, nasceria dessa origem
comum.
Afirma
textualmente que “os mestres do simbolismo seriam esse mesmo Baudelaire, e,
mais diretamente, Verlaine e Mallarmé, que haviam pertencido ao parnasianismo e
eram agora os corifeus da poética nova” (In: COUTINHO: 1979: 190). Logo, mesmo
na França não se pode afirmar uma “pureza estética”; o “parnasianismo” de
Mallarmé e de Verlaine já era uma mescla. Uma compreensão moderna, compartilhada por outros escritores e críticos mais contemporâneos,
aparece na perspectiva que alimenta inicialmente Pádua:
O simbolismo correspondeu a uma
transformação por que passou o pensamento nos fins do século passado: a
revivescência do idealismo.
Como os parnasianos (ao lado dos realistas na prosa) foram um reflexo do positivismo filosófico, do cientificismo, os simbolistas reagiram num retorno à subjetividade, à
contemplação interior das imagens do mundo. A fórmula de Schopenhauer: “o mundo
é minha representação” - assenhorava-se dos domínios da arte
e da literatura, incentivando o individualismo, o desconvencionalismo estético” (PÁDUA, in COUTINHO: 1979: 191)
Sua visada
crítica, no entanto, é aquela da Estilística, que se difundiu entre nós nas décadas
de 40 e 50, como afirma Bosi, em seu “Sobre alguns modos de ler poesia:
memórias e reflexões”, presente na coletânea de textos críticos Leitura de
poesia, de sua organização. Logo, o estudo de Pádua busca mostrar o “virtuosismo
expressional” de Cruz e Sousa em uma “análise estilística [que se] dedicava aos
fenômenos linguísticos, correndo às vezes o risco de hipersimbolizar este ou aquele elemento fonético ou
gramatical” (BOSI: 2007: 13).
Por isso, a análise de
Pádua tenta traçar analogias entre o nível formal e o nível simbólico, buscando sempre exemplos
retirados dos poemas do escritor. Mostra o valor dos sons, das metáforas, da
linguagem lúdica, dos neologismos – sempre se apoiando em outros estudos e fazendo analogias com outros escritores simbolistas, sobretudo, franceses. O levantamento consegue, de fato, demonstrar a
“expressividade” do poeta. Ao contrário do que sugeriram os seus primeiros
críticos, a obra como um todo revela riqueza e não repetição de técnicas, embora alguns traços mantenham-se constantes.
Entretanto,
por ser tratar de um “breve estudo”, como afirma o próprio autor, as interpretações
dos aspectos de expressão levantados são raras, quando não inexistentes. Fica-se no levantamento, sem discutir, por exemplo, “as vantagens e prejuízos da criação de palavras” (PÁDUA, in COUTINHO: 1979: 216). O
pesquisador elenca um conjunto de classes gramaticais criadas pelo poeta sem
mencionar realmente o valor expressivo de tais criações. O levantamento impede
uma síntese, porque, deslocados dos poemas, muitos versos e palavras perdem o
espírito que os anima e permitiria recolher um significado de totalidade.
O estilo
aí compreendido como técnica trata do processo de criação, mas não dos
resultados que esse processo nos dá.
Esse ponto
é importante, porque parto dele para voltar ao livro de Maria Helena Camargo
Regis. Distanciados no tempo por três décadas e partindo de pressupostos
teóricos diferentes, a análise empreendida em Linguagem
e Versificação em Broquéis também acaba por focar muito os processos de criação, os mecanismos e técnicas que permitem o “virtuosismo
expressivo” de Cruz e Sousa.
Outros
tempos, porém, revelam um olhar talvez mais refinado. O primeiro indício disso já fica evidente pelo recorte que a autora faz e pela delimitação dos pressupostos teóricos que assume desde o início. Alinha-se ao Formalismo
Russo e demonstra ser uma estudiosa da linguagem poética nos seus diversos
níveis (fonético, morfológico, sintático, semântico).
Não pretende ver o “estilo” de Cruz e Sousa através de enumerações retiradas de
diferentes obras, mas reflete sobre a linguagem em um só livro: Broquéis.
Assim, embora isole versos,
sons ou palavras, tem em mente o poema, quer perscrutá-lo de modo a evidenciar
os significados que o processo de criação teria deixado ocultos. Como afirma Alfredo Bosi (2007), no texto
citado mais acima, o formalismo entra nos estudos literários como moda e
repercute criando certos artificialismos na leitura da poesia.
No
entanto, o movimento no interior do próprio Formalismo, tendo como centro a
figura de Roman Jakobson, consegue criar
instrumentos na leitura analítica, que a enriquecem. Desse modo, Regis, além das referências
múltiplas a Jakobson, também se refere, por exemplo, a Chklovski, cuja apreensão por Bosi parece ser fecunda. Vale a pena citar a
compreensão de Chklovski por
Bosi, para que possamos depois verificar em que sentido essa compreensão também teve Regis ao analisar os poemas de Broquéis.
Cito, a propósito, a controvertida definição de Chklovski de arte
como procedimento. Tomada em abstrato, é
um lema ultraformalista e, como tal, serve de escudo a jogos maneiristas. No
entanto, vista no seu contexto, essa fórmula abre-se para
o projeto maior de aproximar linguagem poética e percepção original de pessoas e objetos. (…) O
novo em poesia não é efeito de arranjos cerebrinos de fonemas ou de palavras:
arranjos que, com graça e propriedade, os italianos chamam de freddure, frioleiras, dada a baixa
temperatura poética que os ditou. Ao contrário, o novo depende de uma
ingenuidade radical do olhar e do sentir que atenta para a coisa e a diz como
se o fizesse pela primeira vez. Ingenuidade no sentido que lhe atribui Schiller
no extraordinário A
poesia ingênua e sentimental. Só o poeta ingênuo é gênio, afirmava
Schiller, e, enquanto gênio, capaz de criar novos procedimentos de expressão. (BOSI: 2007: 30)
Veremos
que a autora, ao longo da terceira parte de seu livro, “Leitura de alguns poemas”,
oscila entre observar os “arranjos cerebrinos de fonemas ou de palavras” e
captar “novos procedimentos de expressão”. Na base dessa oscilação, há, como me
referi antes, a intenção de revelar o processo
de criação. Não como Pádua, preocupado com o “estilo do autor”, mas vinculado a esse pressuposto
teórico da arte como procedimento, da arte como técnica de montagem, como
quando se refere às reflexões de Serguei Eisenstein. Arte que cria sentido, que
se vincula a estéticas preexistentes, que organiza uma visão do mundo, como ela
salienta na conclusão do livro.
Observemos
algumas de suas
análises que, posteriormente, devem servir também como
ponto de partida para escolhas que farei na análise de poemas da obra.
---
Fonte:
Douglas Ferreira de Paula :
“Mescla
estilística e ambiguidade em Broquéis de Cruz e Sousa ”.Dissertação apresentada ao Programa de Pós- Graduação em
Literatura Brasileira do Departamento de Letras, Clássicas e Vernáculas da
Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo como requisito para obtenção do título de Mestre em Letras.
Orientador: Prof. Dr.
Jefferson Agostini Mello ). São Paulo , 2013 . Disponível em: www.teses.usp.br
Douglas Ferreira de Paula
Nenhum comentário:
Postar um comentário