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esquerda) e TÍTULO/AUTOR (coluna à direita).
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Livro das Noivas (1896)
Estado incerto, dúbio, o da
noiva, ao ver aproximar-se a hora do seu casamento. Tudo em que não pensou
durante meses, muitas vezes anos, ocorre-lhe no último dia ao pensamento.
Sente-se feliz; sente-se desditosa!
Em fins do século XIX e começo do
XX Júlia se preocupou com a instrução das moças, noivas, mães e donzelas da
sociedade carioca. Para isso, a mesma encarregou-se da tarefa de escrever o
compêndio Livro das Noivas (1896). A necessidade de se escrever um livro deste
porte se deu no quadro de mudanças em que se encontrava a capital fluminense, pois
havia um processo de transição na sociedade, em que essa passaria de senhorial,
com base essencialmente agrária, para uma burguesia, progressivamente urbana e industrial.
Neste sentido, as mulheres se
dedicariam e se adaptariam às novas relações sociais da cidade, bem como aos
desafios da educação e formação profissional, em contrapartida à vida anterior
a esta mudança, em que se dedicavam ao trabalho privado da casa. Sob a égide da
República que alvorecia e preocupada com a reviravolta que ocorria no universo
feminino a partir de então, Júlia Lopes de Almeida escreveu este primeiro livro
voltado para as moças inexperientes que tinham a intenção de se casar.
No que se refere à materialidade,
elemento de adornamento para alguns, mas que têm muita importância na pesquisa
histórica, como bem mostrou Tania Regina de Luca, é importante estar atento aos
“aspectos que envolvem a materialidade dos impressos e seus suportes, que nada
têm de natural”. É preciso perceber as “condições técnicas de produção vigentes
e a averiguação, dentre tudo que se dispunha, do que foi escolhido e por quê”.
Ao manusear o primeiro manual de ciências domésticas de Júlia Lopes de Almeida
notou-se a clara função social desses impressos, visto que não eram endereçados
a qualquer público, e sim, destinados às moças leitoras das famílias da elite
fluminense. Conforme pode-se constar em vários exemplares, O Livro das noivas
foi confeccionado com todo o aparato técnico que até então dispunham as
tipografias da época.
Trazia a capa dura em vermelho,
adornado com uma flor branca e verde e escrito em dourado. Continha tanto os
nomes – do livro e da autora – como a imagem da flor em alto-relevo. Segundo
Joaquim Marçal Ferreira de Andrade, foi devido ao desenvolvimento do processo chamado
autotipia pelo alemão George Meisenbach, patenteada em 1882, que ocorreu uma verdadeira
revolução na imprensa ilustrada da época.
Nele, a imagem original de tons
contínuos era reproduzida através de uma malha (ou retícula) de vidro, sendo
então fragmentada em pequenos pontos, distribuídos de maneira regular e cujo
tamanho variava em função da tonalidade específica de cada área da imagem.
Através desse processo, gravava-se uma chapa denominada clichê, onde os pontos
em alto-relevo, correspondiam as áreas escuras da imagem.
No que diz respeito à ilustração,
teve a colaboração dos desenhos de E. Casanova, Roque Gameiro e Julião Machado.
Este último,foi considerado por muitos o “pai da caricatura no Brasil” devido à
colaboração em periódicos como o Jornal do Brasil e Gazeta de Notícias, o que o
tornou um dos mais influentes ilustradores na virada do século.
Cabe destacar no livro o tom de
intimidade com que a escritora conduziu a narrativa, recurso utilizado para
seduzir o seu público leitor. Como bem lembrado por Lajolo e Zilberman, este
auxílio teve êxito para a formação de uma sociedade leitora, que só por volta da
segunda metade do século XIX, momento em que o Rio de Janeiro passou a exibir
traços necessários para a formação e o fortalecimento de um público leitor. Tal
auxílio estava materializado nos mecanismos mínimos para a produção e a
circulação da literatura, como tipografias, livrarias e bibliotecas. Observa-se
que a escolarização era precária, mas manifestava-se o movimento visando à
melhoria do sistema, e o capitalismo ensaiava seus primeiros passos graças à
expansão da cafeicultura e dos interesses econômicos britânicos.
Em capítulo intitulado “A
construção do Leitor”, Lajolo & Zilberman dão exemplos de como foi a
estratégia de sedução do público leitor ainda em formação e a consolidação do espaço
para que suas obras nascessem, crescessem e se multiplicassem.
Ao publicar Memórias de um
sargento de milícias (1852-1853), Manuel de Antonio de Almeida tomou cuidado
diante da formação de tal público, sendo representativo seu empenho em tratar o
leitor como frágil e despreparado. O escritor parecia conduzir o leitor pela
mão, como se o caminho a percorrer – leia-se leitura autônoma da obra – fosse
difícil.
Outra conduta bastante frequente
do literato, nesse primeiro momento da formação do leitor no Brasil, foi simular
reações do leitor e legitimá-las, dando-lhe razão, sugerindo indiretamente sua
competência e, às vezes, até mesmo sua superioridade. Indicativas dessa
cortesia de salão são expressões que aludem ao fato de o leitor já ter
adivinhado o que estaria acontecendo ou ser suficientemente perspicaz para
compreender o que se passa e tirar conclusões próprias.
Tais estratégias, se não garantem
ao narrador a fidelidade do leitor a um texto que se prolonga, estreitam a
cumplicidade entre ambos: o leitor é uma figura para quem se conta, em segredo,
os acontecimentos da trama.
A técnica, também aplicada aos
romances-folhetins, se adensou na época, tanto que foi mantida no desenrolar do
gênero romance e reapareceu anos mais tarde na obra de Machado de Assis. No
conto “Questão de vaidade”, datado de 1864, parece não haver limite para o esforço
do narrador em estabelecer um clima de intimidade com o leitor. Com este
objetivo, Machado traçou um cenário em que o autor e o leitor compartilharam um
ambiente comum, íntimo e propício ao desfiar de histórias, ficcionais ou
verídicas, como se verá no segmento a seguir, necessariamente longo para
exemplificar a contento o que se afirma:
Suponha o leitor que somos
conhecidos velhos. Estamos ambos entre as quatro paredes de uma sala; o leitor
assentado em uma cadeira com as pernas sobre a mesa, à moda americana, eu a fio
comprido em uma rede do Pará que se balouça voluptosamente, à moda brasileira,
ambos enchendo o ar de leves e caprichosas fumaças, à moda de toda a gente.
Imagine mais que é noite. A
janela aberta deixa entrar as brisas aromáticas do jardim, por entre cujos
arbustos se descobre a lua surgindo em um límpido horizonte.
Sobre a mesa ferve em aparelho
próprio um pouca de água para fazer uma tintura de chá. Não sei se o leitor
adora como eu a deliciosa folha da Índia. Se não, pode mandar vir café e fazer
com a mesma água a bebida de sua predileção.
Ora, como é noite, e como não
hajam cuidados para nós, temos ambos percorrido toda a planície do passado,
apanhando a folha do arbusto que secou ou a ruína do edifício que abateu.
Do passado vamos ao presente, e
as nossas mais íntimas confidências se trocam com aquela abundância de coração
própria dos moços, dos namorados e dos poetas.
Finalmente, nem o futuro nos
escapa. Com o mágico pincel da imaginação traçamos e colorimos os quadros mais
grandiosos, aos quais damos as cores de nossas esperanças e de nossa confiança.
Suponha o leitor que temos feito
tudo isto e nos apercebemos de que, ao terminar a nossa viagem pelo tempo, é já
meia-noite. Seriam horas de dormir se tivéssemos sono, mas cada qual de nós,
avivando o espírito pela conversação, mais e mais deseja estar acordado.
Então o leitor que é perspicaz e
apto para sofrer uma narrativa de princípio a fim, descobre que eu também me
entrego aos contos e novelas, e pede que lhe forje alguma coisa do gênero.
E eu para ir mais ao encontro dos
desejos do leitor imaginoso, não lhe forjo nada, alinhavo alguns episódios de
uma história que sei, história verdadeira, cheia de interesse e vida. E para
melhor convencer o meu leitor vou tirar de uma gaveta algumas cartas em papel
amarelado, e antes de começar a narrativa, leio-as, para orientá-lo no que vou
lhe contar.
O leitor arranja as suas pernas,
muda de charuto, e tira da algibeira um lenço para o caso de ser preciso
derramar algumas lágrimas. E, feito isso, ouve as minhas cartas e as minhas
narrativas.
Suponha o leitor tudo isto e tome
as páginas que vai ler como uma conversa à noite, sem pretensão nem desejo de
publicidade.
Anos mais tarde, com a mesma
proposta dos escritores Manuel Antonio de Almeida e Machado de Assis, é a vez
de Júlia Lopes conduzir uma narrativa íntima com suas leitoras. A relação é de
estreita intimidade tanto que por todo o livro vê-se a escritora chamar seu
público leitor de “amigas”. Para respaldar esta aproximação, ela apresentou-se
no livro como uma “velha conhecida” para suas leitoras. Aquela que vivenciara
várias experiências comuns a todas as outras mulheres, entre elas, mães, moças,
senhoras e noivas com quem Júlia procurou dialogar e ter uma íntima relação.
Este tom fica claro nas palavras “as minhas leitoras que me desculpem,
lembrando-se que isto não é literatura, mas uma palestra apenas”.
O livro é dividido em três
partes. A primeira consiste nas seguintes crônicas: “O dia do casamento”,
“Saber ser pobre”, “A roupa branca”, “A poesia da vida”, “Os doentes”, “Os livros”,
“Belas artes”, “Concessões para a felicidade”, “Os bailes”, “As jóias”, “Os
pobres”, “Falta de tempo”, “Carta a uma noiva”. Nesta primeira parte, o conselho
foi dirigido às damas e donzelas nubentes, que aspiravam ensinamentos
referentes ao grande dia de suas vidas, o casamento. Essas crônicas também
pretendiam instruir em relação à convivência social, ao saber portar-se em
situação de pobreza, com observações referentes ao altruísmo e, o principal
eixo que praticamente em todas as suas obras pode-se encontrar, o incentivo à leitura.
Percebe-se na narrativa uma preocupação em preparar as noivas para os conflitos
que envolvem o casamento, o comportamento adequado e os primeiros anos de
convivência em uma situação de estreita intimidade com o futuro marido.
Já na segunda parte figuram os
seguintes textos: “A mesa”, “A cozinha”, “Os animais”, “As aves”, “Os criados”,
“Notas de uma ménagère”, “Floricultura”, “Horticultura”, “Da sala à cozinha”.
Nesses, os ensinamentos destinam-se às mulheres que já se encontravam casadas.
As instruções recaíam no aperfeiçoamento da mulher em relação aos seus afazeres
de ménagere: como se portar em determinadas situações domésticas, de que
maneira organizar e disponibilizar os vários recintos da casa, qual deve ser a
relação entre uma ménagere e um criado, além de sugestões para as mulheres
aperfeiçoarem-se em floricultura e horticultura.
Por fim, no último capítulo podem
ser vistas as crônicas: “Uma carta”, “Ser mãe”, “Entre dois berços”, “As
crianças”, “Educação”, “Carinhosa hospitalidade” e “Carta de uma sogra”. Essa
última parte concluiu a seqüência de pensamentos da autora, segundo a qual a mulher
já se preparou para o matrimônio; tem conhecimento de como administrar um lar -
tanto do ponto de vista físico, como arrumar e dispor os móveis pela casa - bem
como tratar dos seus criados. Porém, ainda há uma última preocupação, com a
incumbência de instruir as damas para serem mães. Como uma mãe deve se portar?
Como educar seus filhos? E como às vezes uma sogra pode representar o papel de
mãe de uma nora?
Apesar das três fases
apresentadas por Júlia Lopes - noiva, esposa e mãe - a partir daqui, dividirá a
análise em temáticas, dedicando-se primeiramente à higienização da família.
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Fonte:
Deivid Aparecido Costruba: “Conselho às minhas amigas”: Os manuais de ciências domésticas de Júlia Lopes de Almeida (1896 e 1906). (Dissertação apresentada à Faculdade de Ciências e Letras de Assis – UNESP – Universidade Estadual Paulista para a obtenção do título de Mestre em História (Área de conhecimento: História e Sociedade) Orientador: Prof. Dr. Milton Carlos Costa). Assis, 2011.
Fonte:
Deivid Aparecido Costruba: “Conselho às minhas amigas”: Os manuais de ciências domésticas de Júlia Lopes de Almeida (1896 e 1906). (Dissertação apresentada à Faculdade de Ciências e Letras de Assis – UNESP – Universidade Estadual Paulista para a obtenção do título de Mestre em História (Área de conhecimento: História e Sociedade) Orientador: Prof. Dr. Milton Carlos Costa). Assis, 2011.
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