01/01/2014

A Cachoeira de Paulo Afonso, de Castro Alves

 Castro Alves - A Cachoeira de Paulo Afonso - Iba Mendes
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A Cachoeira de Paulo Afonso, de Castro Alves

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No que se refere ao poema de A Cachoeira de Paulo Afonso (1876), a apresentação do estupro seguido de desvirginamento forçado de Maria, pelo filho do senhor-de-engenho provocaria em Lucas um sentimento de revolta ante o anúncio exterior que lhe causara torpor e ódio; logo o escravo vem a bradar em uníssonas palavras pela vingança, através do poema Sangue de africano, cujo título distingue claramente o “eu” do “outro” (Ver anexo 24):

Aqui sombrio, fero, delirante
Lucas ergueu-se como o tigre bravo...
Era a estátua terrível da vingança...
O selvagem surgiu... sumiu-se o escravo.

Crispado o braço, no punhal segura!
Do olhar sangrentos raios lhe ressaltam,
Qual das janelas de um palácio em chamas
As labaredas, irrompendo, saltam.

Com o gesto bravo, sacudido, fero,
A destra ameaçando a imensidade...
Era um bronze de Aquiles furioso
Concentrando no punho a tempestade!

No peito arcado o coração sacode
O sangue, que da raça não desmente,
Sangue queimado pelo sol da Líbia,
Que ora referve no Equador ardente.

Observamos pelas quadras acima que o eu poético atribui o sentimento de vingança como único sentimento possível diante de tanto ultraje, aliás, texto e realidade encontram-se quando confrontamos a pretendida vingança de Lucas frente às inúmeras violências perpetradas pelos escravos. Tais argumentos sobre a violência serviria ainda mais para que a sociedade avaliasse o mal social sobre a escravidão.

Como orientação para explicar o comportamento de Lucas que desconstrói a imagem de escravo, buscando nas origens de sua linhagem, no caso dele a Líbia, a força que redefiniria sua identidade, que agora se apresentava metaforicamente como de um negro guerreiro e destemido: “Era um bronze de Aquiles furioso”, “Concentrando no punho a tempestade!”. Tudo isso seria típico, como ilustra o poema, do sangue de sua raça, ou seja, “Sangue queimado pelo sol da Líbia,”, “Que ora referve no Equador ardente.” E diante do que ouve, ele pede a sua amada que cesse a história e denuncie-lhe o nome do criminoso, porque “Se a justiça da terra te abandona,”, “Se a justiça do céu de ti se esquece,”, “A justiça do escravo está na força...”, “E quem tem um punhal nada carece!...”.

 A vingança, que para ele seria o mais nobre dos presentes à amada, deixa-o sedento, ansioso pelo amanhã, a fim de que ele possa alterar o fim do mencionado desfecho, mas Maria, na condição agora de conselheira, pois ela o lembra da condição social de ambos, suplica, através do poema Anjo, que ele não manche suas mãos num crime; diante disso, em tom de revolta ele se desespera.

Todo o instante o ritmo do poema é alternado pela fala mansa dela e a fala vingadora, audaz, instantânea da dele. Após ouvi-la, ele lhe questiona exclamativamente quem lhe falou em crime e replica-lhe dizendo que ela não sabe o que é crime, através do poema Desespero: “Crime! Pois será crime se a jibóia”, “Morde silvando a planta, que a esmagara?”, “Pois será crime se o jaguar nos dentes”, “Quebra do índio a pérfida taquara?”

E após esses questionamentos, ele exclama-lhe que ela para falar em crime ao cativo é porque nada sabe sobre o que é ser escravo. Então, ele encadeia diversas definições conceituando o ser escravo de forma arrebatadora, chocante, abjeta e principalmente em caráter de revolta; então, ele a questiona quem lhe falara de crime, se foram os próprios criminosos, é porque eles zombam da sorte de sua amada, então ele a questiona se vale a pena morrer todos os dias debaixo do chicote, enquanto a fronte do assassino não vem a revelar-lhe um só remorso.
[...]

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Fonte:
Valter Gomes Dias Junior: “poesia e identidade em Castro Alves”, (Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Letras, do Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes, da Universidade Federal da Paraíba, como requisito para a obtenção do grau de Mestre em Letras, na área de concentração Literatura e Cultura. Orientadora: Profa. Dra. Zélia Monteiro Borá). João Pessoa, 2010.

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