AS REFORMAS POMBALINAS E O ILUMINISMO EM PORTUGAL
Desde a primeira metade do século
XVIII existia em Portugal um grupo de intelectuais e políticos que,
tendo como exemplo as nações onde o Iluminismo se propagara, sugeria mudanças e
reformas que poderiam alterar a situação portuguesa no contexto europeu; as Reformas
Pombalinas, neste sentido, significavam o fortalecimento desse movimento.
No entanto, existiam tentativas
anteriores de modernização que, desde o século
XVII, vinham sendo registradas por alguns economistas
portugueses. No livro Antologia dos economistas portugueses (1974), Sérgio citou Luís Mendes de Vasconcelos que exerceu o cargo de capitão-mor
nas armadas do oriente e o de governador do reino da Angola, que escreveu em
1608 os Diálogos do Sítio de Lisboa,
onde discutem um filósofo, um soldado
e um político. Neste texto, o autor
buscou relatar o que seria ideal para Portugal como:
aperfeiçoar a agricultura; desenvolver, por ela e pela indústria, a economia
metropolitana; nacionalizar por essa indústria o comércio do ultramar.
Outro autor que escreveu sobre a necessidade de modernização em
Portugal foi Severim de Faria (1583-1654) que escreveu
Do muito que importará a
conservação e aumento da monarquia de Espanha assistir Sua majestade com sua corte
em Lisboa e dos Meios com que Portugal pode crescer em grande número de
gente, para aumento da milícia, agricultura e navegação.
Segundo Sérgio, para Faria, havia um problema em Portugal que era a diminuição do povo. Houve essa diminuição por três causas: devido às conquistas, o fato de não estar organizada a indústria e os defeitos da agricultura. A solução era a introdução das artes mecânicas, o desenvolvimento industrial.
Cumpria proibir a exportação das matérias-primas, e trazer
oficiais excelentes de outras províncias (do estrangeiro, dir- se-ia hoje),
dar-lhes salários e comodidades convenientes, favorecer os bons engenhos
e estimar as invenções e as obras que participam do singular e do raro, e
assinalar prêmios à perfeição e excelência. (É o que tentamos fazer há pouco com a criação
da Junta de orientação dos estudos:
Favorecer os bons engenhos, estimular as invenções, instruir os Portugueses nas
técnicas modernas mais urgentes, - sem lograr em S. Bento a indispensável atenção.
Cumpre insistir...). (SERGIO
1974: 147)
Os problemas expostos por Faria sobre a agricultura e a indústria
foram retomados pelo Dr. Ribeiro de
Macedo (1618-1680) no seu Discurso sobre a
Introdução das Artes no Reino (1675),
onde relatava o problema da balança comercial. Ele mesmo questionava: “Qual há de nós [pergunta ele] que traga sobre
si alguma cousa feita em Portugal? Acharemos (e não ainda todos) que só o pano de linho e os sapatos
são obras nossas.
[...] o único meio que há para evitar
este dano e impedir que o dinheiro
saia do reino é
introduzir nele as artes”. (SERGIO
1974: 174).
Realmente, se os artigos
de luxo de cujo uso alguns se queixavam
fosse feito no país, não seria realmente um mal. Macedo sugeriu que fossem
produzidos em Portugal os cereais, as sarjas, baelas, meias de seda, panos e
papel e os produtos industriais fáceis de manufaturar. Segundo ele, não
faltavam matérias-primas para isso e o que faltasse poderia ser providenciado.
O que deveria ser feito, a princípio, era proibir a saída de artesãos que pudessem desenvolver as indústrias. Observe-se o que ele diz:
Cumpria usar ao mesmo tempo, não só a isenção de direitos para os mestres que tentavam indústrias novas, mas prêmios, também, para os que melhor fabricassem nos vários gêneros, e facilidades para o estabelecimento nos lugares abundantes em água e lã; atrair com grossos salários os melhores artífices do estrangeiro; e desenvolver o ensino público. (SÉRGIO 1974: 23)
Ele alertava também que se Portugal não tivesse manufaturas, as colônias portuguesas iriam dar vantagem a outros povos;
acreditava nisso porque as
colônias tinham muita matéria-prima.
Deve-se observar que as
iniciativas de modernização desses economistas portugueses foram iniciativas que antecederam as propostas
iluministas representadas na Reforma Pombalina.
Assim, a partir do século XVII, aconteceram na Europa inúmeras mudanças no modo de produção e de ideias,
que se refletiram de forma ascendente na vida dos homens. Sua disseminação atingiu a economia, a ciência,
a política, a arte, a religião e a filosofia. A transformação não ocorreu
somente na produção material, e sim em todos os aspectos da consciência humana.
Desenvolveram-se no mundo todo profundos movimentos como: a Revolução Industrial, que se iniciou na Inglaterra; a Revolução
Francesa; a Reforma Pombalina, em Portugal; e as Inconfidências, no Brasil.
Em termos filosóficos, o iluminismo dominou
o campo das ideias. Trata-se de um momento histórico em que o homem abandona
as superstições medievais e abraça as ideias iluminadas
pela razão e pela ciência.
Os homens com ideais iluministas tinham por objetivo
libertar o pensamento do domínio das ideias sobrenaturais, para o homem conquistar a liberdade intelectual, política e religiosa, motivo pelo qual se condenava toda forma de pensamento pautado
no absolutismo político e religioso.
Para verificar como foi a influência que os intelectuais desse período receberam e que estudaram na Universidade de Coimbra, é necessário entender as transformações que ocorreram por todo o mundo, principalmente a Revolução Francesa e o Iluminismo. É necessário verificar como repercutiram no Brasil e nas Inconfidências, que posição tomou Gonzaga, autor de Tratado de Direito Natural em relação ao que estava acontecendo em Portugal e quais as ideias de reforma trouxe para o Brasil.
É preciso para isso verificar que, nos primórdios da transformação manufatureira, o comércio desestruturou a produção tradicional de todos os países. As nações se modificaram. Os países onde o comércio se
desenvolveu viraram grandes potências como foi o caso da Inglaterra, França,
Holanda e Países Baixos, mas em Portugal a aristocracia se fortaleceu,
colocando rédeas nos comerciantes e se enriquecendo da riqueza colonial,
impedindo assim que a manufatura não se desenvolvesse internamente.
No início dos tempos modernos,
Portugal encontrava-se na vanguarda das
transformações. No século XVI, esse país constituía-se,
juntamente com a Espanha, na principal potência marítima do mundo ocidental. Em
busca de riquezas, os lusitanos haviam produzido a expansão marítima e
contribuído decididamente para a gestação do comércio mundial. Refletindo esse vanguardismo, Lisboa transformou-se
numa das capitais do mundo. Voltar a este patamar sempre foi uma questão
para os portugueses.
Segundo Menezes (1998), a antiga
forma social resistiu à destruição e, neste embate, houve um equilíbrio de
forças que deixa a impressão de que os portugueses não conseguiam imprimir
uma direção à sua história,
mas que também a antiga sociedade não conseguia estancar totalmente as
transformações.
Seguindo a ideia de que o Iluminismo propagava-se por todos os países europeus e que essa propagação
ocorria de forma diferente em cada um deles é que se focaliza Portugal, local
principal de muitas discussões, mais especificamente as Reformas Pombalinas.
Sebastião José de Carvalho e Melo, o Marquês de Pombal, foi um homem
reconhecido por ter renovado profundamente a política econômica
do governo português.
Analisar Portugal do século XVIII sem levar em conta a figura do Marquês de Pombal (1699-1782) é quase impossível.
Com as Reformas Pombalinas no país, toda a parte administrativa
se alterou. Criou-se a Real Mesa Censória (1771), para secularizar o controle e as proibições que, de longa data, impediam
ou dificultavam a introdução de novas ideias
no país. Desse
modo, a Real Mesa Censória substituiu a Inquisição e
tornou-se o juiz do que se supunha aceitável para o público leitor português.
Algumas transformações educacionais foram feitas nos Estatutos
do Colégio dos Nobres, criado em Lisboa a 7 de março de 1771, anteriormente,
portanto, à Reforma da Universidade de Coimbra, mas elas não foram cumpridas. Isto levou à criação da Real Mesa Censória,
que tinha como função estabelecer medidas rigorosas para que as reformas fossem
cumpridas.
Paradoxalmente, portanto, a censura do Estado foi planejada para fornecer os meios suscetíveis de estimular o Iluminismo, o que revela
a complexidade dos embates que davam os contornos das transformações.
A Mesa liberava livros para seus proprietários que antes haviam sido
banidos pela Inquisição – entre eles as Oeuvres
de Voltaire (teatro), a Pamela, de Richardson, o Esprit de lois, de Montesquieu, e os Essays on humam
understanding, de Locke.
Deve-se citar também Antônio Nunes
Ribeiro Sanches (1699- 1783), que, antes de
Pombal, em suas Cartas sobre a educação
da mocidade (1760), propôs a separação total entre a Igreja e o
Estado, fazendo algumas sugestões para a reforma da educação portuguesa, o que
sem dúvida alguma é importantíssimo para a análise de Tratado de Direito Natural, uma vez que Sanches expõe os princípios
de Direito Civil, Político e Pátrio,
áreas que também
foram tratadas por Gonzaga.
Entretanto, Sanches expõe a liberdade de consciência, criando o Colégio dos Nobres isento da influência direta da igreja, destinado a uma preparação para as funções do estado; já Gonzaga expõe o imperante diretamente ligado às leis divinas. Na citação transcrita a seguir, Cidade (1968: 58-59) mostra a relação entre essas cartas e a transformação ocorrida nos Estatutos do Colégio dos Nobres, cujas repercussões incidem sobre a Reforma da Universidade de Coimbra.
São dois os trabalhos com que
tenta reformar a educação da mocidade portuguesa: - ‘Carta sobre a educação da
mocidade nobre’ e o ‘Método para aprender a estudar a medicina, ilustrado
com os Apontamentos para estabelecer-
se uma Universidade real, na qual deviam aprender-se as Ciências Humanas
de que necessita o estado Civil e Político’. A elaboração do primeiro destes
trabalhos determinou a extinção,
em 1759, dos colégios dos jesuítas.
Foi tal elaboração instigada pelo embaixador português em Paris, Monsenhor Salema? Assim
este o afirma. O que se sabe é que foi em conformidade com o plano exposto
nessas cartas que o Conde de Oeiras, futuro Marquês de Pombal, organizou em
1761 o Colégio dos Nobres. Em verdade, nelas Ribeiro Sanches defende muitas das
ideias gratíssimas ao primeiro Ministro e
por ele realizadas. Assim, a da secularização do ensino; a transformação numa função
exclusiva do estado,
porque a seu benefício
era destinada, do ensino até aí
monopolizado pelos eclesiásticos, que Sanches não sofre ver privilegiadíssimos,
mesmo já em tempo em que as condições
de vida, que poderiam explicar tais privilégios, haviam
profundamente mudado; a viva condenação do anacrônico peripatetismo, que numa
carta para Teodoro de Almeida qualificava de parvoíce de frades;
finalmente, a adaptação
do ensino à criação de valores que pudessem integrar-se na vida do tempo – uma escola militar
para nobres, com muito exercício
para o desenvolvimento da agilidade e robustez – ginástica, esgrima,
dança – mas também com línguas modernas - castelhano, francês, inglês
– Matemáticas elementares,
geografia e História, princípios
de Direito Civil, Político e Pátrio, além de conhecimentos de armas, evoluções e táctica.
Outras ideias não agradariam, decerto, ao Conde de Oeiras, como a da liberdade de consciência, a que punha limitações longe de
coincidirem com as que o ministro absolutista julgava convenientes, como a da organização rousseauliana
do estado, por um contrato entre os povos e o soberano, etc.
Em todo o caso, os princípios essenciais aproveitou-os o conde na fundação do Colégio dos Nobres, que viveu, como Sanches preceituara, isento de directa influência da igreja, destinado à preparação para funções do estado, e de programas animados por vivo sopro de pragmatismo.
Segundo Maxwell (1996), os escritos de Antônio Pereira de Figueiredo e João Pereira Ramos de Azevedo Coutinho forneceram a justificativa para as reivindicações seculares quanto a assuntos até então de domínio da Igreja e para a captura, pelo estado, da jurisdição antes atribuída ao domínio espiritual.
Observe-se que, o Brasil era colônia de Portugal onde não existiu o feudalismo tal como nos termos da Europa. Talvez isto explique o porquê de os primeiros experimentos na educação serem iniciados aqui. Tratava-se de um local onde não existiam leis rígidas, não habitando também homens com culturas tradicionais como os nobres e clero em Portugal. É essa secularização que se destaca nos objetivos da reforma educacional de 1760, a qual segundo Maxwell visava:
três objetivos principais: Trazer a educação para o controle do Estado, secularizar a educação e padronizar o currículo, assim como muitas das medidas de Pombal, os experimentos iniciais ocorreram no Brasil. (...) Os diretores deveriam ocupar os lugares dos missionários e duas escolas públicas deveriam ser estabelecidas em cada aldeia indígena, uma para meninos e outra para meninas. Aos meninos se ensinaria a ler, escrever e contar, assim como a doutrina cristã, enquanto as meninas, em vez de contar, aprenderiam a cuidar da casa, costurar e executar outras tarefas “apropriadas para esse sexo”. Os diretores, diferentemente dos missionários, deveriam impor às crianças indígenas o uso do português e proibir o uso de sua própria língua. (1996: 104)
Em suas reformas educacionais, Pombal inspirou-se nas recomendações dos oratorianos, como Luís António
Verney, cujo livro resumia tanto o
radicalismo como as limitações da filosofia educacional de Pombal: “era um método
destinado a ser útil para a República e a Igreja
na proporção do estilo e da necessidade de Portugal” (MAXWELL 1996: 104).
Luís António Verney, o vigoroso autor do Verdadeiro Método de
Estudar, publicado
pela primeira vez, em 1746, nascido em Lisboa de pai francês,
fez os seus primeiros estudos no Colégio de Santo Antão dos Jesuítas, em Évora. Com vinte e três anos foi estudar
em Roma voltando a formar-se em teologia e Jurisprudência. Em 1742, foi designado pelo Papa arcediago na Catedral
de Évora, havendo
tomado posse em Roma.
Permaneceu na Itália até sua morte. Desenvolveu uma enorme atividade literária compondo
numerosas obras pedagógicas e filosóficas, das quais algumas
permaneceram inéditas. Insurgiu-se contra a
fraca cultura dos mestres portugueses, indicando no seu Verdadeiro Método
de Estudar a propósito de cada setor da cultura,
as obras que considerava mais eminentes e que os professores nacionais ignoravam no ensino.
Para dar execução à reforma, Pombal criou o posto de diretor
de estudos, com a finalidade de fiscalizar o estabelecimento de um sistema nacional de educação secundária, para o qual indicou Dom Tomás de
Almeida. Somente mais tarde é que foi criada a Junta da Providência Literária,
para preparar a reforma da educação superior. O diretor de estudos tinha como
tarefa coordenar, preparar os relatórios anuais, inspecionar e administrar o
sistema. Quanto aos professores, estes seriam
pagos pelo Estado,
deveriam passar por um exame
público para obter suas
posições, teriam privilégios só concedidos a nobres e residiriam nos conventos
dos jesuítas expulsos. Ressalta-se que esse era o desejo
de Gonzaga, tornar-se professor só que do Ensino Superior, talvez pelos privilégios existentes.
Em 1771, houve a substituição do diretor de estudos pela Real Mesa Censória, ampliando o sistema educacional com a incorporação de escolas de leitura, composição e cálculos e aumentando as aulas de latim, grego, retórica e filosofia, estendendo-se até os territórios ultramarinos. Destaca-se que:
a legislação de 1772 incluía um plano nacional relacionando as escolas e os professores com a situação socioeconômica das regiões e estabelecendo uma base financeira para o sistema mediante a introdução de um novo imposto ou subsídio literário para cobrir esse custo. (MAXWELL 1996: 105)
A
Reforma da Universidade de Coimbra, ocorrida
em 1772, foi um dos mais importantes aspectos da reforma
educacional de Pombal, pois tiveram um resultado que se prolongou pelas demais
gerações. Sua síntese pode ser exposta nos seguintes termos:
Para preparar os novos estatutos da universidade, criou-se a Junta da Providência Literária em dezembro de 1770. O onipresente e maleável Dom João Cosme da Cunha era o presidente da Junta e Francisco de Lemos tornou-se o reitor da reforma. Francisco de Lemos e seu irmão compuseram os novos estatutos da universidade. João Pereira Ramos coordenou a parte jurídica em estreita colaboração com o Marquês de Pombal, enquanto Francisco de Lemos concentrou-se nos novos estatutos relacionados com as ciências naturais e a matemática. Frei Cenáculo foi também membro da Junta da Providência Literária. A intervenção pessoal de Pombal colocou Cenáculo nessa comissão, onde Pombal tomou parte ativa em discussões, tendo ele próprio presidido algumas sessões da junta. A universidade foi fechada durante as fases finais da reforma e Pombal supervisionou pessoalmente a inauguração da instituição reformada durante uma estada de 32 dias em Coimbra, de setembro a outubro de 1772. Os indivíduos-chave que o auxiliaram foram: José Seabra da Silva, co-autor da Dedução Cronológica, Frei Manuel do Cenáculo, João Pereira Ramos, Dom Francisco de Lemos, Pascoal José de Melo Freire, Antônio Nunes Sanchez, Jacobo Castro Sarmento e, é claro, Verney. (MAXWELL 1996: 110)
Ou seja, a Reforma da Universidade
confirma o caráter empreendedor de Pombal. Ele visava modernizar as faculdades
de teologia e de lei canônica, incorporar o estudo de fontes portuguesas no
currículo da faculdade de direito,
atualizar a faculdade
de medicina, fazendo
voltar o estudo de anatomia
por intermédio da dissecação de cadáveres, que antes era proibida
por questões religiosas.
Dessa forma, o novo currículo e a existência de laboratórios eram inovações excepcionais para a época.
Um dos primeiros trabalhos da Junta foi justificar a reforma, atribuindo a decadência da universidade aos jesuítas.
A declaração dos objetivos do processo da reforma da universidade veio do próprio
Francisco de Lemos:
Não se deve encarar a universidade como um corpo isolado, preocupado apenas com seus próprios negócios, como sucede normalmente, mas como um corpo no coração do Estado que, mercê de seus intelectuais, cria e difunde a sabedoria do Iluminismo para todas as partes da Monarquia a fim de animar e revitalizar todos os ramos da administração pública e de promover a felicidade do Homem. Quanto mais se analisa essa ideia, maiores afinidades se descobrem entre a universidade e o Estado; quanto mais se vê a dependência mútua desses dois corpos, mais se percebe que a Ciência não pode florescer na universidade sem que ao mesmo tempo floresça o Estado, melhorando e aperfeiçoando a si mesmo. Essa compreensão chegou muito tarde a Portugal, mas enfim chegou, e estabelecemos sem dúvida o exemplo mais perfeito e completo da Europa atual. (MAXWELL 1997: 232)
Pombal, da mesma forma que seus
antecessores em suas reformas econômicas, defrontou-se com a limitada
capacidade empresarial de Portugal. Na área da reforma educacional, Pombal
utilizou-se dos estrangeirados, os quais
iam se revezando de instituição em instituição,
devido à não existência de indivíduos com mentalidade moderna em Portugal.
Deve-se salientar que o nome estrangeirado equivale à concretização do iluminismo em Portugal. Pode-se
até dizer que é uma forma
maldosa de tratar
estes homens, mas esses eram essenciais para a
implantação do Iluminismo.
No plano econômico, sua proposta
enfrentava a complexa situação externa de concorrência entre as potências europeias.
Ele acreditou inicialmente que poderia manter
uma política de neutralidade,
mas os franceses estendiam sua política de dominação à Península Ibérica, cujo
objetivo era impedir a entrada do comércio britânico no continente, inclusive
fechar o acesso
britânico aos portos
de Portugal no Atlântico, forçando assim
Portugal a entrar na disputa. Acaba, então, por
incentivar a construção de manufaturas no Brasil, assinalando uma inovação na política colonial
portuguesa.
Sua Reforma atinge o Brasil não apenas quanto
a uma nova forma de aproveitar as riquezas coloniais, mas também quanto a racionalizar e padronizar a administração, a organização militar e o
treinamento educacional sob a alçada do Estado. Medidas foram tomadas também
para que, onde fosse necessário, as diferenças de raça e etnia não fossem
barreiras. A língua portuguesa deveria ser utilizada como um meio de integrar
as comunidades nativas; e os casamentos de nativos com europeus eram
encorajados no interesse de aumentar a população. Porém, essas boas intenções
foram modificadas pelas circunstâncias locais. Quando Pombal podia governar de
perto, o governo agia com eficiência, mas nem sempre isso era possível, principalmente no Brasil.
A
última década do governo de Pombal foi um período
de muitas alterações no
ambiente econômico de Portugal e vários setores da economia colonial
enfrentaram dificuldades; a pressão da concorrência
restringiu o acesso ao mercado do açúcar brasileiro, o que se percebeu
rapidamente nos portos
portugueses. Muitos comerciantes se retiraram; entretanto, aqueles,
com grande suporte
econômico, com quem Pombal
tinha contato, permaneceram. As exportações de vinho e tabaco não foram afetadas.
Somente quem estava ligado ao comércio do ouro sofreu impacto
drástico.
Entrar nos detalhes dos avanços e
retrocessos da política modernizadora de Pombal
não é o meu objetivo.
O que merece destaque é o
fato de que essas novas condições econômicas produziram um ambiente favorável
ao crescimento das manufaturas. Pombal viu a competitividade dos produtos
aumentada pela queda na capacidade de importar
dos portugueses. Muitas das manufaturas criadas estavam ligadas aos produtos de luxo e o
Estado português concedia-lhes privilégios de monopólio, isenção de impostos e
fornecimento de matérias-primas.
Todas as mudanças ocorridas em
Portugal não podem ser atribuídas apenas a Pombal, mas a uma complicada
interação das transformações sociais e econômicas, da política internacional e
das decisões diplomáticas que fizeram gerar tantas alterações e inovações no campo
interno de Portugal e seus domínios.
Assim, segundo Maxwell (1996: 152), nota-se que Portugal nunca se esquece de sua colônia, pois
ela era quem sustentava o reino. Desta forma,
as mesmas condições que ajudaram a introdução de manufaturas
em Portugal também incentivaram a criação de manufaturas no Brasil, especialmente em Minas Gerais, a grande produtora do ouro. O Marquês
de Lavradio percebeu que, no caso de Minas Gerais, algo de novo iria
surgir, “dada a sua vastidão e o espírito rebelde de sua população, tal
independência era uma questão momentosa e um dia talvez viesse a produzir
graves consequências para Portugal” (MAXWELL 1996: 152).
Quanto ao legado de Pombal,
pode-se dizer que ele exerceu amplos poderes, mas sempre dependendo do apoio do
rei. Tanto era assim que, quando D. José I sofreu um ataque apoplético em 1765,
o futuro de Pombal pareceu comprometido.
Pombal preocupava-se com a
continuidade de suas reformas e acreditava mais na reforma da Universidade de Coimbra, porque,
a seu ver, era através das
reformas educacionais que se poderia dar continuidade ao impulso modernizador,
ao transformar e reformar a mentalidade dos portugueses e brasileiros que lá
estudassem. Assim sendo, ao lado de tantos aspectos de sua reforma, a de Coimbra foi um dos mais elogiados pelos poetas modernos
da época.
Pode-se observar que a política econômica de Pombal protegia o comércio vantajoso e aspirava desenvolver uma classe nacional de homens de negócio, desafiando os concorrentes estrangeiros.
Para as grandes câmaras de comércio, que ajudou a criar, ele foi um herói; para os pequenos negociantes, que suprimiu, ele foi um tirano. Para os cultivadores de vinho do Porto, que protegeu, ele foi um patrono; para os proprietários de vinhedos, cujas vinhas mandou arrancar, foi uma calamidade. Diferentemente da maioria dos governantes esclarecidos, mais preocupados com a teoria do que com a prática, de uma maneira geral ele alcançou seus objetivos. Sua reforma educacional abriu as portas para o florescimento, no final do século XVIII, da ciência e da filosofia portuguesa. Os comerciantes que favoreceu tornaram-se a base de uma rica e opulenta burguesia. Em ambos os casos o papel do estado como patrono, parceiro e protetor foi decisivo. Como sublinhava Dom Luís da Cunha em seu Testamento Político, a liberdade de muitos foi restringida para o benefício de poucos. Desse modo, o Portugal do século XVIII foi o Estado que criou a burguesia, e não, como na América britânica, a burguesia que restringiu o Estado. (MAXWELL 1996: 170)
A história da administração de
Pombal é muito importante para se ter uma visão de que o progresso do
Iluminismo no século XVIII na Europa não foi linear e passava por ações políticas que pareciam se opor
aos seus próprios princípios. Nesse sentido, as iniciativas de Pombal tinham
seus limites. De um lado, Portugal era dominado pela igreja portuguesa que era
católica, defendida pelo Santo Ofício e pela Companhia de Jesus e, de outro
lado, sofria a pressão dos setores produtivos
que aderiam ao espírito moderno
científico. Entretanto, com seu
sistema de “iluminismo português”, essencialmente reformista e pedagógico, com ideais progressista, nacionalista e humanista, Pombal provocou satisfação em grande parte
dos intelectuais.
O ENTUSIASMO DOS ÁRCADES INCONFIDENTES COM AS REFORMAS POMBALINAS
Segundo Lúcia Helena (1996), os árcades surgiram para combater o mau gosto que na época era o gosto espanhol dos excessos
conceptistas e cultistas do seiscentismo. Para Candido (1985: 88), Arcadismo
deve ser distinto de Neoclassicismo e Ilustração. Neoclassicismo para Candido
era a denominação através da qual espanhóis e ingleses costumavam designar a
imitação do Classicismo francês, verificada em toda a Europa durante o século
XVII e por Ilustração, o conjunto de tendências ideológicas próprias do século
XVIII, de fonte inglesa e francesa e que, exaltava a natureza, a divulgação
apaixonada do saber, a crença na melhoria da sociedade, a confiança na ação governamental para promover a civilização e o bem- estar coletivo.
Já o Arcadismo, segundo Candido (1985: 88), surgiu à influência dos italianos, que reagiram contra o maneirismo das agremiações chamadas Arcádias e teria sua teoria poética oriunda de Muratoti, e sua prática poética devia-se a Metastásio. Essas agremiações intelectuais originaram as Arcádias, que tiveram na Arcádia Romana, de 1690, o primeiro modelo do gênero:
o grupo se organiza reunindo eruditos, filósofos, pensadores livres, com programa definido e número fixo de membros, com a finalidade de produzir, ler, discutir e divulgar trabalhos no âmbito da ciência e das artes, principalmente a literatura. Seus membros se autodenominavam “pastores” e adotavam nomes gregos e latinos, e tinham por patrono, num gesto de sincretismo, o Menino Jesus. (HELENA 1996: 558)
O Arcadismo manifestava uma
consciência de integração e de ajustamento a uma nova ordem social e literária. O Arcadismo recupera Aristóteles relido a partir da Arte Poética de Horácio e preconiza o caráter
racional da arte e da cultura. Preocupa-se em exaltar a finalidade moral da literatura. Os árcades buscam
motivos bucólicos, cristalizados em cenários fixos, nos quais o clima ameno e
campestre esmaece a transformação urbana que se realizava no contexto
político-social circundante. O princípio
retórico de base é a imitação dos antigos.
O
Arcadismo penetra Portugal,
onde se funda a Arcádia
Lusitana (1756). São escritos, no período, diversos tratados portugueses
de arte poética: a Nova Arte dos Conceitos, de Francisco
Leitão Ferreira (1721), a Arte Poética de Francisco José Freire,
cujo nome árcade é Cândido Lusitano (1745) e a de Paiva e Melo (1765).
Gonzaga, um árcade foi exposto por Lúcia Helena (1996: 563) que comenta que a obra Tratado de Direito Natural louva, em
teses ainda absolutistas, o direito divino do monarca que, segundo Gonzaga, não
devia ser de modo algum subordinado ao povo e expõe: “Daquele que louva o Monarca como ser supremo,
ao intelectual que se envolveria na Inconfidência, ainda que de forma discutível e com aspectos
sombrios, Gonzaga desenvolveu diversificada trajetória, na qual,
sobretudo, destaca-se sua faceta sem dúvida maior, a do poeta lírico-amoroso”
(HELENA 1996: 563)
Nesse período, então, da escrita
do Tratado de Direito Natural,
existia uma Inglaterra com experiência no Parlamento e contava com dois
partidos, o dos trabalhadores e o da nobreza; a França vivia o absolutismo de
Luís XVI e Portugal experimentava o despotismo esclarecido do Marquês
de Pombal. Trata-se da passagem de uma ordem social
em que há conexão entre o poder secular e a fé para uma ordem social em que se
busca a conexão da razão com o iluminismo e com a figura do indivíduo e da qual emerge a figura do homem empreendedor.
Assim, contradições são encontradas no Brasil, especialmente em Minas que tinha uma elite letrada.
Nos últimos quarenta
anos, mineiros ricos tinham
enviado seus filhos à Universidade de Coimbra, o que lhes possibilitara o contato com fontes intelectuais europeias, apesar do clima conservador daquele
centro cultural português.
Segundo Candido (1985), os homens
que escreveram no Brasil durante todo o período colonial eram formados em
Portugal ou formados à portuguesa, como foi Gonzaga. Este era o caso dos
inconfidentes, cuja produção literária está, com maior ou menor intensidade,
ligada às Reformas Pombalinas, ou seja, no Brasil, a Inconfidência Mineira
(1789), a Inconfidência Carioca (1794), a Inconfidência Baiana (1798) e a
Revolução Pernambucana (1817) são consideradas como expressão do iluminismo
europeu e, em particular, do português.
Segundo Paim (1997), a principal
inovação no campo da intelectualidade nacional foi resultante da expulsão dos jesuítas, em 1759, que
favoreceu a propagação do pensamento racional da ilustração. A situação de Portugal era peculiar em relação aos países vizinhos,
onde o pensamento escolástico parecia de todo superado.
Em substituição à administração jesuítica, tanto em Portugal como no Brasil, Pombal instituiu as
“aulas régias”, sistema de disciplinas isoladas. Segundo Fernando de Azevedo
(1958), no Brasil, a primeira aula régia de filosofia criou-se no Rio de
Janeiro em 1774. Posteriormente, foram sendo organizadas nas principais cidades.
A reunião desses professores de disciplinas isoladas num mesmo estabelecimento,
em 1837, no próximo século, portanto, foi o que deu lugar à formação do Colégio
Pedro II, no Rio de Janeiro e dos Liceus Estaduais.
As reformas econômicas como as
educacionais criaram um ambiente intelectual produtivo em Portugal e no Brasil.
Esse é um dado que contribui
para a compreensão da questão, cuja abrangência requer também uma breve
reflexão sobre o que acontecia em outras nações recentemente libertadas do sistema colonial,
com a América do Norte.
Reitera-se que muitos desses homens foram influenciados pelas novas ideias que estavam surgindo no mundo. Um fato que merece destaque foi o que ocorreu em 1776, quando as treze colônias inglesas da América do Norte proclamaram sua independência, constituindo um novo país – os Estados Unidos. Esse exemplo teve forte repercussão entre os inconfidentes mineiros. Vale lembrar que as Inconfidências não ocorreram no governo de D. José I e sim no de D. Maria I, quando Pombal já não mais governava. Entretanto, elas foram promovidas por intelectuais da geração formada na época de Pombal e cujas ideias inovadoras, mesmo com avanços e recuos, foram cantadas em prosa e verso por vários poetas das gerações vindouras, como é o caso de Castro Alves (Gonzaga e a Revolução de Minas) e, atualmente, Cecília Meireles (Romanceiro da Inconfidência), só para citar alguns deles.
Deve-se destacar que os inconfidentes defendiam a independência da colônia, o regime republicano e os princípios iluministas dos
pensadores Locke, Montesquieu, Rousseau e Adam Smith, cujas
ideias foram fundamentais para o movimento de Independência dos Estados
Unidos em 1776 e para o sucesso
da Revolução Francesa
de 1789.
Quando se analisam os poemas
produzidos pelos inconfidentes, percebe-se que eles destacam nas Reformas Pombalinas exatamente os
aspectos ligados aos princípios iluministas, seja relativamente ao comércio e à
produção manufatureira, seja com relação ao empreendedorismo político e
educacional. Evidentemente, não foram apenas as ideias ilustradas que levaram à inconfidência, mas alguns fatos circunstanciais,
que ora não cabe enumerar, também tiveram
um papel predominante no desencadear
desses movimentos. Merece menção apenas o mais conhecido de todos, a grave
ameaça da derrama no governo de D. Maria I. A ideia de tornar a capitania
independente de Portugal ficava cada vez mais forte entre
alguns homens importantes de Minas Gerais. Sucediam-se frequentes reuniões. Discutiam-se
ideias e planos para concretizar o desejo de independência. Estava nascendo a
Inconfidência de 1789.
Participaram do movimento: Joaquim
José da Silva Xavier, Francisco de Paula Freire de Andrade, José Álvares
Maciel, Carlos Correia de Toledo, Inácio José de Alvarenga Peixoto, José da
Silva e Oliveira Rolim e Silva Alvarenga. Os ideólogos Tomás Antônio Gonzaga,
Luís Vieira da Silva, Cláudio Manuel da Costa. Os contratadores eram Domingos
de Abreu Vieira, Joaquim Silvério dos Reis e João Rodrigues de Macedo.
Os inconfidentes mineiros tinham
vários planos que significavam
uma
continuidade às Reformas Pombalinas. Segundo Anastásia (1997),
os mais importantes deles eram: mudança da capital para São João Del
Rei;
construção de uma Universidade; constituição de fábricas de tecidos,
ferro e pólvora; organização de milícias populares
para defender a nova
República; criação de uma casa da moeda; emissão de papel moeda; aumento do
valor monetário do ouro; liberação da circulação dos diamantes. Quanto à
escravidão, havia interesse em que ela fosse mantida, pois era necessário
manter o trabalho nas minas e na agricultura.
A Inconfidência Mineira não foi um
fato isolado, ela estava relacionada com a situação social, econômica e política do Brasil daquela
época. Na própria
capitania de Minas
Gerais houve muitos
movimentos rebeldes. Todas essas revoltas coloniais, por sua vez,
estavam diretamente relacionadas com as transformações ocorridas na Europa; nos
Estados Unidos a ação de filósofos e políticos condenavam o absolutismo e o
colonialismo e defendiam uma sociedade mais justa, com o fim dos privilégios e da desigualdade entre as pessoas.
Pode-se destacar que os
inconfidentes pensaram ainda em conseguir auxílio estrangeiro para garantir o sucesso de seu levante.
Em 1786, o estudante José Joaquim da Maia teve um encontro, na França,
com o ministro americano Thomas Jefferson, com essa finalidade. O estudante não chegou a retornar ao Brasil, falecendo na Europa.
A Inconfidência Carioca7
foi um movimento diferente daquele sufocado
em Minas Gerais
cinco anos antes.
A Revolução Francesa
foi
7 A Inconfidência Carioca foi um movimento liderado por Silva Alvarenga (1749-1814); estudante da Universidade de Coimbra, escreveu O Desertor em que expressou seu otimismo educacional em relação às Reformas Pombalinas. Sua primeira iniciativa no Brasil foi a criação em 1786, sob o governo de Luís de Vasconcelos, da Sociedade Literária: “a academia científica, fundada no Rio em 1771 por médicos, e reformada sob o nome de Sociedade Literária em 1786, para durar intermitentemente até 1795, propagou a cultura do anil e da cochonilla, introduziu processos industriais, promoveu estudos sobre as condições do Rio e acabou criticando a situação da colônia, com base em Raynal e inspirações também em Rousseau e Mably”. (Candido 1985: 97). Essa Sociedade Literária voltava-se realmente para temas científicos, como: observação do eclipse da Lua, em 1787, determinação da longitude da cidade, estudo sobre o calor da Terra considerado fisicamente, análise da água, método de extrair a tinta do urucu, danos causados pelo alcoolismo e outros. A sociedade funcionou normalmente até 1790, mas com a chegada de Resende, as reuniões se encerraram, voltando a funcionar em 1794, prédio do Cano (Sete de Setembro), em cujo andar superior morava Manuel Inácio da Silva Alvarenga, professor régio de retórica e que era a alma da Sociedade. Os temas então científicos passaram a ser filosóficos e políticos, as reuniões eram realizadas sempre em horários noturnos sem uma duração exata. No entanto, as conversações ali tidas chegaram aos ouvidos do vice-rei, por um sócio da Sociedade, José Bernardo da Silva Frade, o que serviu de base à devassa, como também pelo Frei Raimundo Penaforte da Anunciação. A Sociedade foi suspensa pelo vice-rei. Mas os intelectuais continuavam a se reunir clandestinamente. O que levou à devassa, que se realizou em dezembro de 1794. Em junho, todos os bens e papéis de Silva Alvarenga foram juntados. Houve, também, dificuldade de julgamento dos presos, pois sua única atitude era a de se reunirem e propagarem as transformações que ocorriam na França. Como não tinham provas, os culpados foram soltos.
Esta indagação motiva toda a narração. Silva Alvarenga também valoriza a pátria portuguesa, quando diz na obra O Desertor:
À
vós, por quem a pátria
altiva enlaça Entre as pennas vermelhas
e amarellas Honrosas
palmas e sagrados louros, Firme columna, escudo
impenetrável
Aos assaltos do abuso e da ignorância. (SILVA ALVARENGA 1867: 12)
Verifica-se que o narrador pede a
proteção de seus versos “A vós pertence o proteger meus versos”(SILVA ALVARENGA
1867: 12), para que eles cheguem a outros lugares, divulgando assim esse novo
momento histórico de Portugal para o mundo.
Cláudio Manuel da Costa
em seus poemas e Basílio
da Gama na obra Uraguai e outros também valorizaram a reforma, entusiasmados pelas
mudanças ocorridas em Portugal. Na produção artística, como mencionado, em
meados do século XVIII, juntaram-se às literatura brasileira e portuguesa influências das correntes ilustradas do momento, especialmente a literatura clássica de inspiração francesa e do arcadismo
italiano.
A tendente confiança na razão
procurou substituir ou alargar a visão religiosa; o ponto de vista moral completou-se, principalmente nas interpretações
sociais, e, no lugar da transfiguração da natureza e dos sentimentos, sobressaiu a fidelidade ao real.
Segundo Candido:
As condições econômicas eram outras, impondo-se a libertação dos monopólios metropolitanos – sobretudo o do comércio – num país que sofrera o baque do ouro decadente e necessitava maior desafogo para manter a sua população. As revoluções norte-americana e francesa, o exemplo das instituições inglesas, o nascente liberalismo oriundo de certas tendências ilustradas, completariam o impacto do pombalismo, formando um ambiente receptivo para as ideias e medidas de modernização político- econômico e cultural, logo esboçadas aqui com a presença da Corte, a partir de 1808. No Brasil joanino conjuram-se as tendências e as circunstâncias, tornando inevitável a autonomia política. (1985: 96)
Assim, a Época das Luzes no Brasil
tem ligação direta com o ideal setecentista das Reformas Pombalinas exposta
anteriormente. Importante salientar que as manufaturas foram introduzidas no
Brasil, visando uma transformação na produção e consequentemente no campo
das ideias e o que aconteceu nesse momento teve repercussão na Independência
brasileira.
MARQUÊS DE POMBAL, UM HOMEM INFLUENTE
Sebastião José de Carvalho e Mello, donatário das Vilas de Oeiras, Pombal, Carvalho e Cercosa, ministro de sua majestade fidelíssima D. José I, foi a representação da imagem da pessoa mais poderosa abaixo de Deus na monarquia portuguesa daquela época. A política do Marquês de Pombal teve sempre como propósito mobilizador recuperar o atraso de Portugal e dos seus territórios coloniais em relação aos modelos de progresso dos países mais cultos e avançados da Europa.
Como mencionado anteriormente,
Pombal elegeu os jesuítas como a causa principal do atraso português e queria recuperar os tempos
áureos de Portugal no tempo de descobrimento e das grandes navegações. Pode-se
notar que o pombalismo nasceu
primeiramente da prática
política do regalismo e só depois é que foi haver a fundamentação e a legitimação teórica. Para a constituir foram impostas
a doutrina antijesuítica e a teorização da política regalista da coroa. Depois,
para dar continuidade houve a incorporação do discurso jusnaturalista, que se
revelou necessário para a desfeudalização das estruturas econômicas e sociais.
Para fundamentar a prática do
absolutismo esclarecido, Pombal dispôs de teólogos
e ideólogos que lhe fizeram
a instrumentação teórica das medidas legislativas de
redefinição das relações Igreja/Estado destacando-se a figura de Antônio
Pereira de Figueiredo (1725-1797), canonista e teólogo, padre oratoriano que
cria as bases teóricas do regalismo pombalino, buscando combater a tendência da contra-reforma
que reforçou o poder no pontífice
católico. O estilo pombalino de ação política foi caucionado pelo Tratado
Doctrina veteris Ecclesiae de suprema
regum de 1765. Esse tratado foi publicado em um período caótico da
Igreja portuguesa.
Marquês de Pombal escreveu
então um Compêndio Histórico
do estado da Universidade de Coimbra e dos novos estatutos desta
Universidade. Alguns homens
o ajudaram, entre
eles José de Seabra da Silva
(1732-1813) e Frei Manuel do Cenáculo Vilas Boas (1724-1814), que foram os redatores
dessas obras emblemáticas do regalismo e do antijesuítismo daquele período. A
Reforma do Ensino Superior, especialmente dos cursos de Cânones e Leis e de Teologia, é direcionada
no sentido de incorporarem nas aulas, as doutrinas regalistas e iluministas acerca
do poder e sanar as doutrinas favoráveis romanas.
João Lúcio de Azevedo
(2004) fez uma abordagem bem ampla da vida de Marquês de Pombal. Trata-se de
uma tentativa de expor uma perspectiva ampla e equilibrada, não só de Pombal, mas de toda a época decisiva na história lusa.
Sebastião Carvalho nasceu em 13 de maio de 1699, em Lisboa, de família de fidalgotes de mediana fortuna.
Aos 39 anos, dava o primeiro
passo a caminho da fama e da grandeza. Não lhe foram difíceis a separação, nem a viuvez. Seu espírito, sequioso de novas ideias, depressa
se afez ao diverso ambiente que, para ele, saído
do obscurantismo e da rotina peninsular, era a sociedade culta, inteligente, progressiva e liberal,
onde agora se encontrava. Não assimilou os princípios de tolerância, de respeito pelos direitos individuais,
que já ali eram comuns. Foi este o período da sua existência mais fecundo para
a formação da sua individualidade de estadista.
Dos seis anos passados
em Londres, Carvalho
não se familiarizou com o idioma,
tendo que recorrer
ao auxílio de intérpretes para entender
as Cartas Inglesas. E não conhecia
também o francês.
Na Inglaterra era chamado de ministro letrado, pela
cópia de citações e abuso das fórmulas de jurisprudência, que usava introduzir
nos papéis diplomáticos. Carvalho trabalhou sempre fervorosamente. Aprendeu
muito. Estudou, nos homens e nos costumes
da Inglaterra, o segredo da extraordinária e rápida prosperidade
desse país e sonhou para a sua pátria um destino
igual. Somente não enxergou que o que o reduzia
era a liberdade, por isso sua obra não frutificou.
Pombal acompanhava a política
do mundo. Suas cartas relatavam o seu dia-a-dia. A Corte de
Lisboa era informada das sessões do parlamento, das intrigas da diplomacia, dos
movimentos de tropas, do aparelhar das esquadras e até das anedotas correntes
no paço e nas embaixadas. O ministro elaborava extensos relatórios sobre
assuntos econômicos, como o que precedeu
o projeto da Companhia Oriental,
ou a dissertação acerca das relações comerciais com a Inglaterra, compêndio
erudito e volumoso.
Carvalho colheu abundantemente
cabedal de conhecimentos da Inglaterra, mas deteve-se na aparência das coisas,
que eram as leis e regulamentos, não percebeu
que o fundamento dessa grandeza
nacional era o respeito e o amor da liberdade, enraizados no ânimo dos cidadãos e consagrados
pelas leis: “Vira de perto, sem o compreender, um povo, cioso de seus direitos, e que já duas vezes,
para mantê-los, expulsara os monarcas do trono” (AZEVEDO 2004: 98).
Em Portugal tudo era ao contrário.
Lei era só a da vontade do soberano e esse dado está presente na obra Tratado de Direito Natural
de Gonzaga onde impera a vontade do rei, do soberano, o que comprova
a mentalidade daquela época em oposição
ao que acontecia na Inglaterra. Em Portugal, o rei fazia e reformava o código a sua vontade.
A fé era a única que
atingia todas as classes. O povo era fanatizado e experimentava um sacro temor.
Azevedo (2004: 99) expõe o pensamento dos homens europeus:
A
Europa, nos mesmos países do catolicismo, olhava com
pasmo o que se passava na Península, o abismo a que a superstição e a falta de cultura
mental tinham lançado
estes povos. Considerava que, enquanto nos estados do Papa os hebreus eram livres, na Espanha e em Portugal, por frágeis indícios, se votavam cristãos
à fogueira. Em toda a parte as pessoas ilustradas condenavam tão
atroz situação. O horror, o ridículo, que mais tarde, na frase de Voltaire,
caracterizou o suplício de Malagrida, acompanhava, em terras estranhas, o nome
português.
Diante dessa situação, Portugal
necessitava de um ministro de capacidade superior e acaba por escolher Sebastião José de Carvalho. Era um
homem novo na corte e não eivado dos vícios dela: “Em suas conversações, nos
trabalhos de gabinete, em aspirações que não escondia, dava mostras de um culto
espírito e de esclarecido patriotismo” (AZEVEDO 2004: 103). Logo, à primeira
entrevista, D. José manifestou ao novo secretário de estado o intento de o
ocupar em assuntos diversos
dos que particularmente lhe competiam.
Para muitos foi surpresa Alexandre
de Gusmão não entrar no Ministério e para ele foi uma desilusão. Entre os seus
escritos foi encontrado uma carta com o seguinte trecho: “O Baxá (Sebastião de
Carvalho?) conseguiu o fim do seu empenho, tais são as coisas do mundo! O povo
é quem o há de sofrer, e passará a notícia aos tempos futuros, que hão de
admirar os feitos das suas largas ideias, em tudo o que for da sua repartição,
se nas outras não tiver parte” (AZEVEDO 2004: 105).
Carvalho então, em 1751, diminuiu e tornou menos dispendiosa a formalidade dos despachos; facilitou
no porto as baldeações, reduziu
os direitos da entrada e concedeu abatimento de metade aos que se
destinassem para fora do País. Com isto, estimulou o mercado e a exportação favorecida, em breve fez desaparecer o excesso de produtos
acumulados, que trazia a ruína. Todo esse processo, Carvalho tinha estudado na Inglaterra. Havia
comentários de todos
os países a respeito de Carvalho, o que se via então é que crescia
nele a autoridade sobre os outros ministros e o seu ascendente no espírito do rei.
Azevedo traça o viver da corte
portuguesa daquele tempo; o teatro, a caça, a equitação eram os favoritos
prazeres da família
real:
Todos os dias, fizesse bom ou mau tempo, ia D. José para a quinta de Belém, acompanhado da rainha, que o não largava, algumas vezes das infantas suas filhas, e de um séquito de fidalgos e damas do Paço. Ali passavam o dia, em exercícios no picadeiro, ou então jogando as cartas. O pharaó, jogo de parar muito em voga, era o predileto. Das oito para as nove horas voltava-se para o Paço da Ribeira, indo o rei trabalhar com os ministros até à meia-noite ou depois; mas havia quem dissesse não entrar ele para o gabinete antes das 11 horas, limitando-se a dar as assinaturas, que eram em grande número. (2004: 126)
D. José vivia o tempo todo
envolvido na caça, jogos, concertos e diversões, deixando a Carvalho o poder.
Percebeu-se que as coisas de Portugal se faziam com lentidão. O Marquês de Pombal queria dar conta sozinho do mecanismo do Governo e que acabava
não vencendo, apesar da tarefa diária. Após sua
administração foram encontradas em seu gabinete mais de 10 mil cartas
fechadas, o que demonstra seu trabalho e sua preocupação em fazer tudo sozinho.
No seu propósito de tudo inquirir, reformar e prover, a cada momento assuntos
novos lhe reclamavam a atenção e o projeto do dia seguinte suplantava o da
véspera. Também os deveres sociais,
recepções e visitas
que não podia faltar; o adiantar de suas
ambições; o cuidar dos seus interesses domésticos, tudo representava tempo
perdido, que poderia ser compensado na distribuição dos serviços entre
adequados auxiliares, mas, nada disso acontecia; para Carvalho, seus colegas, secretários de
Estado, haviam de ser meros subordinados. Carvalho não podia então deixar de entrar em conflito com o clero.
Quanto à colônia, esta era pobre e precisava
de homens para tirar
as riquezas da floresta e, além de tudo, sob o clima
impiedoso. Para isso necessitavam usar da escravidão. Os
usos do reino e a tradição da Antiguidade consentiam a escravidão. As leis
diziam que o americano seria livre, mas permitiam o transporte de negros para serem escravos no Brasil: “A isto
retorquiam, no século XVIII, os colonos:
‘Se os etíopes podem ser cativados, por que não põem sê-lo os índios do Maranhão?’
Contra tal pugnavam os jesuítas
que, para salvarem
o índio, tinham
feito levar o africano
ao Brasil”. (AZEVEDO
2004: 137).
Outro acontecimento que demonstrou
o poder de Pombal foi o terremoto que aconteceu no dia 1º de novembro de 1755, em Portugal. Dez mil
casas foram destruídas, além dos edifícios públicos, igrejas, conventos,
palácio real e muitos de fidalgos. Às urgências da situação Carvalho
acudiu com a firmeza e inteligência que tornaram famoso o seu nome.
Azevedo relata:
Nas horas angustiosas, em que foi preciso proporcionar socorros, mantimentos, abrigo, defesa; prestar consolo a milhares de criaturas, vencidas de terror; enfim, cuidar dos vivos e enterrar os mortos, na frase sintética que lhe é atribuída; dos três ministros, Pedro da Mota, inválido, Diogo de Mendonça, fugitivo, ele foi só a dispor, agir e mandar. As célebres palavras podem ser que as não proferisse. Mas, neste caso, como em muitos outros da história, o inexato é mais verdadeiro que a própria realidade. O dito permaneceu na tradição como a fórmula de um caráter, e ficará para sempre vinculada ao nome de Pombal. (2004: 154)
Carvalho agiu sozinho diante daquela catástrofe. Ele enterrou os mortos, cuidou dos vivos, nivelou as ruínas, traçou ruas, desenhou as construções e fez-se retratar, delineando a nova Lisboa que ressurgia. Carvalho esteve à
altura da situação.
De fora do reino, a solidariedade humana
mandava socorros materiais.
Os jesuítas eram preocupação
máxima de Carvalho, eram os perpétuos inimigos. As aulas gratuitas dos jesuítas fecharam em 1759, até à
estrondosa Reforma da Universidade, treze anos depois (1772). O ministro queria
combater a ignorância e suprir os erros que, durante dois séculos, a pedagogia jesuítica havia instilado na mentalidade portuguesa.
A Mesa Censória vigiava os livros e divulgava os autores condenados
pelos jesuítas. Mas, os jesuítas não foram os instigadores das barbaridades. Em
compensação haviam já fornecido ao tribunal duas vítimas famosas: Antônio
Vieira, condenado um século antes por ofensas
a fé e ultimamente o visionário Malagrida.
Carvalho não satisfeito foi atacar o inimigo de outra maneira. Saiu uma obra
intitulada Dedução Cronológica, que
era contra os jesuítas, com dois volumes e o terceiro de provas, excertos e documentos em
abono do texto, com composição de estilo duro e fastidiosa leitura, abundante
em fatos:
A primeira parte ocupa-se dos jesuítas desde que entraram em Portugal e, revendo a história pátria, fá-los intervir, como funestos agentes, em todos os sucessos fatais ou condenáveis que ocorreram depois, a principiar no desastre de Alcácer Quibir e terminar no atentado contra D. José; para isso encadeia os fatos em uma série de suscitadas intrigas, conspirações e revoltas, por meio das quais a Companhia tentara sempre subordinar às suas ambições e supremo poder do estado. A segunda parte argúi os direitos dos soberanos contra as pretensões de supremacia da Santa Sé, rejeita os Índices Expurgatórios, publicados sem o régio beneplácito, e, sempre com inovação de fatos históricos, mais ou menos exatos, faz intervir os jesuítas em tudo o que, desde que tiveram existência, em semelhante matéria foi passado. Ambas as diversões constituem apenso a uma petição do procurador da coroa contra os abusos da corte de Roma e os manejos perniciosos dos seus protegidos. (AZEVEDO 2004: 299)
Tudo o que se havia juntado contra
estes religiosos se achava nos dois volumes:
A tese de Carvalho é esta: até a
entrada dos jesuítas, Portugal foi culto, próspero e poderoso; em seguida, as letras agonizavam, o comércio definha, a navegação decai, o poder
militar abate, perdem-se as virtudes cívicas e desaparece o equilíbrio nas relações assim entre a coroa e a
Igreja como entre o rei e os vassalos. Esta obra nefasta exercita-se por uma ação contínua.
Desde o reinado de D. João III os jesuítas conseguem
introduzir-se na Universidade e arruinavam a instrução. Educam D. Sebastião no fanatismo e impelem-no à jornada de África.
Por morte dele, intrigam a favor de Filipe II e, quando investido na coroa,
fazem morrer cerca de dois mil eclesiásticos e pessoas doutas, contrárias ao
domínio estranho. Na corte de D. João IV preponderam e urdem a desgraça de Francisco de Lucena. A Afonso VI, rei sensato e bom, fazem perder o trono, a
liberdade e a consorte. Pedro II é levado por eles a requerer ao Papa o perdão
geral dos hebreus, contra o voto das cortes e da nação; criam assim um conflito
grave da cúria com o Santo Ofício.
Reinando D. João V, instigam-no à criação dispendiosa da patriarcal e tramam
a propósito das missões do oriente e do
Brasil. Finalmente, continuam os malefícios sob o Governo
de D. José, até rematarem pela tentativa monstruosa do regicídio. Tal é, em vagos traços,
o tremendo libelo
oposto por Carvalho ao esforço impotente de Clemente XIII, libelo
inconsciente pelas próprias demasias, mas cujo espírito domina ainda hoje os
juízos sobre o debate e na interpretação da história.
(AZEVEDO 2004: 299-301)
Segundo Azevedo (2004), não há
dúvida que o autor de Dedução Cronológica
foi Carvalho; entretanto, é certo que teve colaboradores, porque a obra apresenta
um imenso material
de fatos, citações
e juízos. Entre os
colaboradores estão José de Seabra, o monge Cenáculo, o teólogo Antônio
Pereira, Verni e Platel. Só que o triunfo de Pombal não perdurou, os jesuítas continuavam
agitar-se e em todos os países fomentavam protestos e tentavam levantar a
opinião pública contra o golpe que os aniquilava. Com a enfermidade de D. José,
o poder de Pombal também terminou. Ao final de seu Governo estava com 77 anos, conservava a energia da juventude. A Reforma da Universidade recebia aplauso de toda a Europa culta.
Marquês de Pombal, desde 1770, emparelhava com a mais luzida
nobreza do reino. Fora do país tinha
um nome feito, e era a sua pessoa o alvo, nas discussões dos ataques e dos
louvores. Para a política internacional, D. José não existia.
Quanto à instrução
pública, a reforma obedeceu ao intuito de proclamar a nocividade pedagógica dos jesuítas e comprovar
que eles, em dois séculos, tinham arruinado a literatura em Portugal. A Reforma
da Universidade fora encarregada à junta da Providência Literária, em que
estavam encarregados o reitor D. Francisco de Lemos, o livro de Beja, Cenáculo e o ajudante
de Pombal, José de Seabra.
Transcorridos alguns anos da queda do ministro, lamentava-se já a decadência dos
estudos na Universidade, atribuindo-se à falta dele a situação. Em setembro de 1777, o reitor da Universidade, D. Francisco
de Lemos, fazia ver ao Governo a necessidade de se restaurarem os estudos das humanidades, que se achavam
na última decadência. Com o aprazimento de Pombal, a Mesa Censória proscrevia os filósofos Spinoza, Hobbes, La Mettrie,
Voltaire, Diderot e muitos outros: “simultaneamente com as produções de fantasia literária, a Nova Heloisa, de Rousseau, os Contos, de Lafontaine, e o licencioso Sophá, de Crébillon...” (AZEVEDO 2004:
351).
Essa era a vida mental do século XVIII e representava o arrojo, o saber, o requinte e a graça. Ler Locke,
só a quem a Mesa facultasse licença especial. Quem vendesse livros proibidos tinham
seis meses de cadeia e se acontecesse novamente, dez anos de degredo para Angola. Só que segundo
Azevedo (2004), condenar
os livros eram apontá-los para a
curiosidade ardente dos espíritos, atraídos
pelo risco e proibição.
Pombal era um déspota
esclarecido, que expôs uma situação
nova a Portugal, um homem autoritário que odiava a Companhia de Jesus e
era contra os nobres de empresa e se apaixonou pela coisa pública.
Vários historiadores como João
Lúcio de Azevedo, citado anteriormente, Waldemar Ferreira, Manuel Nunes Dias e
Marcos Carneiro de Mendonça apontam que Pombal preocupou-se com a economia metropolitana e ultramarina. Portugal
passava por uma crise e precisava de um homem de mão firme, pulso
forte e ação enérgica, pois os abusos, as desonestidades, o
afilhadismo, a beatice corrompida precisavam ser vencidos. Pombal chegou a
presidir a fundação da Arcádia Lusitana em 1756, protegendo os poetas e artistas;
certamente isso fazia parte da estratégia de divulgar e criar entre
os intelectuais um ambiente favorável às suas reformas.
Pombal precisou ter a confiança de
todos, não só do rei. Para se certificar de que os poetas
se identificavam com seus ideais,
colocou um espião na Arcádia, o poeta José Caetano de Mesquita e Quadros. Porém, a
confiança vinha mesmo era dos poetas brasileiros que não tinham
raízes em Portugal e, portanto, mais fáceis de assimilar as ideias e os valores
impostos. Assim, a arte contribuiu
para a unidade político- administrativa do Estado. O Tratado de Direito Natural
foi uma das obras que
confirmavam as ideias de Pombal e interpretava o ministro como modelo de virtude civil
e de ação política, ambas previstas pelo código
jusnaturalista.
---
Fonte:
SANDRA APARECIDA PIRES FRANCO: “O IDEÁRIO GONZAGUIANO NA OBRA TRATADO DE
DIREITO NATURAL” (Tese apresentada ao curso de Pós- graduação em Letras da
Universidade Estadual de Londrina). Londrina, setembro de 2008.
---
Notas:
A imagem inserida no texto não se inclui na referida tese.
As notas e referências bibliográficas de que faz menção o autor estão
devidamente catalogadas na citada obra.
O texto postado é apenas um dos muitos tópicos abordados no referido
trabalho.
Para uma compreensão mais ampla do tema, recomendamos a leitura da tese
em sua totalidade.
Disponível digitalmente no site: Domínio Público
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