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O jesuíta, os
jesuítas e a pregação
Sobre o autor, deixamos aqui algumas breves palavras.
Nascido em Lisboa em 1608, Vieira chegou ao Brasil com a família aos seis anos
de idade. Estudou no colégio dos jesuítas em Salvador e optou por entrar na
ordem religiosa. Em 1642 integrando a embaixada para saudar o novo rei após o
fim da união ibérica o então religioso e pregador retornou a Europa. Dez anos
depois voltou ao Brasil em uma missão no Maranhão onde fica até 1661, sendo
obrigado a se retirar por contendas com os colonos, torna a Portugal. Regressa
ao Brasil apenas em 1681, permanecendo aí até sua morte em 1697. Antônio Vieira
foi, reconhecidamente já em seu tempo, um dos grandes exemplos da oratória, bem
como figura de grande engajamento político. Personagem com uma fortuna crítica
muitas vezes controversa, sendo acusado ora de defender a manutenção da
exploração colonial e suas mazelas (como a escravidão), ora aclamado como
denunciante da mesma. Viera flertou com o poder em diversas cortes europeias (Portugal,
França, Roma, Holanda para citar algumas ), gozando de prestígio e
reconhecimento, criando também contendas e animosidades. Também teve intensa
vivência missionária nas selvas e sertões brasileiros. Foi conselheiro,
diplomata, réu da Inquisição, professor, mas principalmente exímio pregador.
Tratando-se da obra de sermões de Vieira deve se levar
em conta uma profunda variedade do material. Sendo sua produção sempre
vinculada ao contexto histórico pertinente ao pregador. O teor da fala é
acomodado segundo a audiência, o que vai de cortes europeias, à irmandades de
negros no Brasil. Além da diversidade de circunstâncias em que foram pregados
os sermões, estes obedecem ao calendário católico, seus tempos litúrgicos, e
temas e situações considerados predicáveis, como nascimento e exéquias de
nobres, dias de santos e de festas religiosas. Toda esta pluralidade poderia nos
dar a sensação de miscelânea, ou de uma prática oratória acomodada circunstancialmente
e com plasticidade ilimitada sem o cunho de uma face. Disse o próprio Vieira a
respeito de sua obra de Sermões, em seu prólogo:
Os que de presente tens nas mãos (e mais ainda os seguintes)
serão todos diversos, e não continuados, quaresmais, santorais, e mariais inteiros,
como se usa. Mas o meu intento não é fazer sermonário, e estampar os sermões
que fiz. Assim como foram prega dos ao acaso, e sem ordem assim tosofereço.
Porque hás de saber que, havendo trinta e sete anos, que as voltas do mundo me
arrebataram da minha província do Brasil, e me trazem pelas da
Europa, nunca pude professar o exercício de pregador, e muito mais de pregador
ordinário, por não ter lugar certo, nem tempo; já aplicado a outras ocupações
de Deus e da Pátria, já impedido de minhas frequentes enfermidades, por ocasião
das quais deixei de recitar alguns sermões, não poucos, que já tinha prevenido,
e também, agora, se darão à estampa (VIEIRA, 1993, v. I, p. 62-63).
Por outro lado, mesmo “pregados ao acaso” e “sem
ordem” , tais sermões não deixam de seguir certa “globalidade relativa”
e dar uma finalidade clara à retórica, onde a dimensão "sacramental [...]
fundamenta as analogias da retórica”, como afirma Pécora (1994, p.42):
[...] é impraticável uma análise rigorosa da retórica
desses sermões se não se examinar o valor que essa eficácia do divino recebe no
seio da sua produção humana. Ou seja, essa analise teria que se processar –
como diz José Mattoso a propósito da “escrita da Historia” que considera
adequada com “saber” – tendo em vista uma “lógica de base” que perpassa os
sermões individuais e os “insere numa totalidade” com a qual mantêm uma relação
essencial ”. E, como quer que se entenda essa relação essencial a ordenar os
sermões, não é possível deixar de considerar o que, nela, se reporta à
concepção cristã particular que justifica sua origem e proporciona sua
finalidade.
Outro fato importante a ser considerado é que este
trabalho ateve-se à parte da
retórica que se liga mais diretamente à estrutura formal
(estilística, linguística) presente nos sermões e às análises que podem
decorrer desta. Os sermões nos chegam hoje como literatura, e o próprio
pregador ao dar-lhes a estampa metamorfoseia-se em escritor. Assim, não tocamos
diretamente a parte que diz respeito a uma importante dimensão da eloquência
propriamente dita, que - como afirma Granada (1945) - é a pronúncia: “à
pronúncia cabe acomodar a voz, o gesto, e o rosto à coisa dita” (GRANADA, 1945,
p. 490). Voz e gesto são elementos que estabelecem uma comunicação direta via
sensorial, e em sua teatralidade expressam e articulam sentidos do universo
interior, dando toda uma roupagem de intenção à palavra. É importante lembrar
que os sermões são, a priori,
organizados para serem pregados, sendo assim a forma tão importante quanto o
conteúdo. É o modo como é dito, que dá força e substância à palavra. Para
isso nos chama a atenção o próprio Vieira (1993, p. 61): “Da folha que fica
atrás (se a leste) haverás entendido a primeira razão, ou obrigação, porque
começo a tirar da sepultura estes meus borrões, que sem a voz que os animava, a
inda ressuscitados são cadáveres”.
No seiscentismo, o tema da persuasão é produtivamente
explorado pela oratória religiosa da época, mais especificamente a dos
jesuítas. Estes tiveram influência marcante no Brasil, seja por terem assumido
o encargo da cristianização da colônia a partir de
1549, data de sua chegada na Terra de Santa Cruz, seja por serem os principais representantes
da política do padroado: definida amplamente como uma combinação de direitos,
privilégios e deveres concedidos pelo papado a Coroa de Portugal como patrona
das missões e instituições eclesiásticas católico-romanas em vastas regiões da
Ásia e do Brasil (BOXER, 1969).
A concepção “psicológica” própria dos Jesuítas – ordem
religiosa de pertença do Pe. Antônio Vieira – é uma das mais bem constituída s
da época, sendo também a mais difundida na colônia. Por se basear em uma visão
da estrutura antropológica advinda da tradição aristotélico-tomista,
proporciona um modelo explicativo do “psiquismo” humano, além de propor uma
modalidade de intervenção através da palavra, pelo uso da retórica.
Segundo esta perspectiva, a compreensão da vida
interior se daria a partir de certa visão de mundo e de homem. Esta análise assume
a forma explicativa de uma espécie de arquitetura da alma – ou arquitetura
humana, ou do coração como algumas vezes utiliza Vieira (1993). Esta
arquitetura oferece a possibilidade não apenas de articulação de conceitos que
formam saberes psicológicos, mas também de ter acesso à teoria do conhecimento
aristotélico-tomista que a fundamenta.
A espiritualidade da Companhia de Jesus é perpassada
pelos valores do Humanismo filtrados já pela sensibilidade da Idade-Moderna,
tradicionalmente rotulada como barroca. A essência do ideal humanista é a
valorização da personalidade em sua realidade completa (natural e sobrenatural)
e nas relações sociais enfatiza-se a importância da solidariedade de modo que
cada indivíduo é chamado para contribuir para a salvação do gênero humano, à
imitação de Cristo: “Assim era a espiritualidade que pregavam. Aproveita todos
os valores possíveis; se adaptando a mentalidade da época; movia-se em um clima
tanto elevado quanto humano; se alimentavam das grandes forças do entusiasmo e
do amor”.
Assim, a esfera do psiquismo humano é concebida como
sendo totalmente articulada ao homem integral, completo, tanto no campo
interior – sensações, afetos, vontade, intelecto, espírito – quanto no campo
exterior, como ser integrado ao mundo e dentro de um corpo social e místico. O
ser humano se atualiza em todas as suas potencialidades na medida em que
estiver imerso na realidade concreta, no mundo sensível; este último é ligado
diretamente ao mundo sobrenatural, através da “sacramentalidade”, ou seja, da
possibilidade de todas as coisas e fatos serem sinais e presentificação
de um sentido maior e dotado de transcendência e universalidade: a divindade
(PECORA, 1994).
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Fonte:
Sandro Rodrigues Gontijo: “Imaginação e memória nos sermões de Antônio Vieira”. (Dissertação apresentada à Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto da USP, como parte das exigências para a obtenção do título de Mestre em Ciências, Área: Psicologia. Orientadora: Prof. Dra. Marina Massimi). Ribeirão Preto – SP, 2011. Disponível em: www.teses.usp.br
Fonte:
Sandro Rodrigues Gontijo: “Imaginação e memória nos sermões de Antônio Vieira”. (Dissertação apresentada à Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto da USP, como parte das exigências para a obtenção do título de Mestre em Ciências, Área: Psicologia. Orientadora: Prof. Dra. Marina Massimi). Ribeirão Preto – SP, 2011. Disponível em: www.teses.usp.br
Nota:
A imagem inicial inserida no texto não se inclui na referida tese.
As notas e referências bibliográficas de que faz menção o autor estão devidamente catalogadas na citada obra.
O texto postado é apenas um dos muitos tópicos abordados no referido trabalho.
Para uma compreensão mais ampla do tema, recomendamos a leitura da tese em sua totalidade.
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