16/01/2016

Sermão das Cadeias de São Pedro em Roma, de Padre Antônio Vieira

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A pedagogia da escravidão em três sermões de Antonio Vieira

A escravidão africana no Brasil remonta aos primórdios do processo colonizador. Na Colônia, “desde 1539 – segundo Maurício Goulart –, jamais se cessara de clamar contra a falta de negros para o amanho das terras e o trabalho nos engenhos”. A estimativa é de que “entre os século XVI e XIX desembarcaram em portos brasileiros cerca de quatro entre cada dez africanos importados pelas Américas”. A escravidão se constituiu, assim, num dos alicerces da “sobrevivência para o colono europeu na nova terra”. No dizer de Sérgio Buarque de Holanda, o modelo colonial português assentado no latifúndio, na escravidão e na monocultura engendrou, nos trópicos, uma conformação econômica fundada na “produção de índole semicapitalista, orientada sobretudo para o consumo externo”. Essa base material produziu uma estrutura societária centrada na figura dos “senhores de engenho, opulentos, arbitrários, desdenhosos da burocracia, com a palavra desafiadora à flor dos lábios, rodeados de vassalos prontos a obedecer-lhes ao grito de rebeldia”. Foi nesse contexto histórico que o padre Antonio Vieira pregou para os escravos negros dos engenhos da Bahia.

A escravidão negra, para Vieira, estava em consonância com os próprios interesses econômicos professados pela Companhia de Jesus ao longo dos 210 anos (1549-1759) em que perdurou a sua hegemonia educacional no período colonial. A base material de sustentação da missão evangelizadora dos jesuítas, notadamente dos colégios mantidos pela Ordem, foi a unidade produtora típica do Brasil dos séculos XVI e XVII: a fazenda de agropecuária sustentada pelo braço escravo. A evidência desse fato pode ser comprovada desde o início da colonização. Em uma carta, datada de setembro de 1551, o padre Manoel da Nóbrega já reivindica ao D. João III, Rei de Portugal que lhes conceda escravos:

“(...) mande ao Governador[-Geral do Brasil] que faça cassas pera os meninos, porque as que tem sam feitas por nosas mãos e são de pouqua dura, e mande dar alguns escravos de Guiné hà cassa pera fazerem mantimentos, porque a terra hé tam fertil, que facilmente se manterão e vestirão muitos meninos, se tiverem alguns escravos que fação roças de mantimentos e algodoais”.

As condições de vida e trabalho dos escravos negros no Brasil Colonial eram brutalmente desumanas. Avaliase que a média de vida de um escravo no engenho de açúcar, durante os séculos XVI e XVII, era de 7 anos 14; pois, “o serviço é insoffrivel, sempre os serventes andam correndo, e por isso morrem muitos escravos” – registrou, em 1584, o padre Fernão Cardim. Inicialmente, o indivíduo feito cativo nas costas ocidentais da África era coisificado como mercadoria de um “desmedido comércio de seres humanos organizado entre dois territórios da mesma metrópole [e] entre duas províncias da mesma Companhia de Jesus”. E, depois, era vendido como escravo e incorporado a uma massa de trabalhadores, particularmente nos engenhos de açúcar, desprovido de quaisquer direitos. Os escravos de origem africana, segundo o historiador holandês Gaspar Barléu, eram “tolerantíssimos dos labores, alimentam-se com pouco. Nascidos para sofrerem a inclemência da natureza e miséria da servidão”.

Diante da brutalidade desse regime, o padre Antonio Viera não permaneceu insensível à dimensão do infortúnio, embora, contraditoriamente, buscasse justificá-lo . Eis a alegoria que fazia entre o negro e o engenho: “não se pudéra, nem melhor nem mais altamente, descrever que coisa é ser escravo em um engenho do Brasil. Não ha trabalho, nem genero de vida no mundo mais parecido á Cruz e Paixão de Christo, que o vosso em um d’estes engenhos”. Para ele, em termos de sofrimento, o engenho era a cruz e o negro a própria imitação do Cristo mortificado que redimiu a humanidade do pecado original. Mas, no mundo real das relações de produção, o escravo do Brasil Colonial era apenas a engrenagem principal da máquina mercantilista que alimentou historicamente a acumulação primitiva do capital necessário à Revolução Industrial do século XIX.

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Fonte:
Amarilio Ferreira Jr. (Universidade Federal de São Carlos) e Marisa Bittar (Universidade Federal de São Carlos). “O PADRE ANTONIO VIEIRA E A PEDAGOGIA DA ESCRAVIDÃO”.  ANPUH – XXII SIMPÓSIO NACIONAL DE HISTÓRIA – João Pessoa, 2003. Disponível em: http://anais.anpuh.org/

Nota:
As notas e referências bibliográficas de que faz menção o autor estão devidamente catalogadas na citada obra.


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