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A pedagogia da escravidão em três sermões de Antonio Vieira
A escravidão africana no Brasil
remonta aos primórdios do processo colonizador. Na Colônia, “desde 1539 –
segundo Maurício Goulart –, jamais se cessara de clamar contra a falta de
negros para o amanho das terras e o trabalho nos engenhos”. A estimativa é de
que “entre os século XVI e XIX desembarcaram em portos brasileiros cerca de
quatro entre cada dez africanos importados pelas Américas”. A escravidão se
constituiu, assim, num dos alicerces da “sobrevivência para o colono europeu na
nova terra”. No dizer de Sérgio Buarque de Holanda, o modelo colonial português
assentado no latifúndio, na escravidão e na monocultura engendrou, nos
trópicos, uma conformação econômica fundada na “produção de índole
semicapitalista, orientada sobretudo para o consumo externo”. Essa base
material produziu uma estrutura societária centrada na figura dos “senhores de
engenho, opulentos, arbitrários, desdenhosos da burocracia, com a palavra
desafiadora à flor dos lábios, rodeados de vassalos prontos a obedecer-lhes ao
grito de rebeldia”. Foi nesse contexto histórico que o padre Antonio Vieira
pregou para os escravos negros dos engenhos da Bahia.
A escravidão negra, para Vieira,
estava em consonância com os próprios interesses econômicos professados pela
Companhia de Jesus ao longo dos 210 anos (1549-1759) em que perdurou a sua
hegemonia educacional no período colonial. A base material de sustentação da
missão evangelizadora dos jesuítas, notadamente dos colégios mantidos pela
Ordem, foi a unidade produtora típica do Brasil dos séculos XVI e XVII: a
fazenda de agropecuária sustentada pelo braço escravo. A evidência desse fato
pode ser comprovada desde o início da colonização. Em uma carta, datada de
setembro de 1551, o padre Manoel da Nóbrega já reivindica ao D. João III, Rei
de Portugal que lhes conceda escravos:
“(...) mande ao Governador[-Geral do Brasil] que faça cassas pera os
meninos, porque as que tem sam feitas por nosas mãos e são de pouqua dura, e
mande dar alguns escravos de Guiné hà cassa pera fazerem mantimentos, porque a
terra hé tam fertil, que facilmente se manterão e vestirão muitos meninos, se
tiverem alguns escravos que fação roças de mantimentos e algodoais”.
As condições de vida e trabalho
dos escravos negros no Brasil Colonial eram brutalmente desumanas. Avaliase que
a média de vida de um escravo no engenho de açúcar, durante os séculos XVI e
XVII, era de 7 anos 14; pois, “o serviço é insoffrivel, sempre os serventes
andam correndo, e por isso morrem muitos escravos” – registrou, em 1584, o
padre Fernão Cardim. Inicialmente, o indivíduo feito cativo nas costas
ocidentais da África era coisificado como mercadoria de um “desmedido comércio
de seres humanos organizado entre dois territórios da mesma metrópole [e] entre
duas províncias da mesma Companhia de Jesus”. E, depois, era vendido como
escravo e incorporado a uma massa de trabalhadores, particularmente nos
engenhos de açúcar, desprovido de quaisquer direitos. Os escravos de origem
africana, segundo o historiador holandês Gaspar Barléu, eram “tolerantíssimos
dos labores, alimentam-se com pouco. Nascidos para sofrerem a inclemência da
natureza e miséria da servidão”.
Diante da brutalidade desse
regime, o padre Antonio Viera não permaneceu insensível à dimensão do
infortúnio, embora, contraditoriamente, buscasse justificá-lo . Eis a alegoria
que fazia entre o negro e o engenho: “não se pudéra, nem melhor nem mais altamente,
descrever que coisa é ser escravo em um engenho do Brasil. Não ha trabalho, nem
genero de vida no mundo mais parecido á Cruz e Paixão de Christo, que o vosso
em um d’estes engenhos”. Para ele, em termos de sofrimento, o engenho era a
cruz e o negro a própria imitação do Cristo mortificado que redimiu a
humanidade do pecado original. Mas, no mundo real das relações de produção, o
escravo do Brasil Colonial era apenas a engrenagem principal da máquina
mercantilista que alimentou historicamente a acumulação primitiva do capital
necessário à Revolução Industrial do século XIX.
[...]
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Fonte:
Amarilio Ferreira Jr. (Universidade
Federal de São Carlos) e Marisa Bittar (Universidade Federal de São Carlos). “O
PADRE ANTONIO VIEIRA E A PEDAGOGIA DA ESCRAVIDÃO”. ANPUH – XXII SIMPÓSIO NACIONAL DE HISTÓRIA –
João Pessoa, 2003. Disponível em: http://anais.anpuh.org/
Nota:
As notas e referências bibliográficas de que faz menção o autor estão devidamente catalogadas na citada obra.
As notas e referências bibliográficas de que faz menção o autor estão devidamente catalogadas na citada obra.
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