15/09/2015

Causas da Decadência dos Povos Peninsulares, de Antero de Quental

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Influências de Causas da decadência dos povos peninsulares de Antero de Quental na historiografia sobre poderes locais em Portugal e no Brasil no século XX

Escrito o discurso de Quental em um contexto turbulento é marcado pela situação de instabilidade político-partidária. Segundo Oliveira Marques, “de Julho de 1860 a Setembro de 1871 puderam contar-se nove governos, com a agravante de que o primeiro, teoricamente o mais longo, passou por várias remodelações” (2006:483).

Assim, de acordo com Oliveira Marques, as “chamadas «conferências do Casino», realizadas em Lisboa, no Casino Lisbonense, de 22 de Maio a 26 de Junho de 1871, representaram a primeira grande contestação ao establishment” (2006:500).

Segundo Sérgio Campos Matos, “o texto da conferência de Antero de Quental, concebido aos 29 anos, quando o seu autor era simpatizante de uma República Social ideal” (1998:363) constituiu 

uma síntese a partir da qual se devem compreender alguns aspectos da consciência histórica do republicanismo – o anticlericalismo, o anti-absolutismo e a valorização do povo na história – [...] e os prolongamentos do debate já no século XX, no seio do grupo da Renascença Portuguesa: Teixeira de Pascoaes, Jaime Cortesão, António Sérgio e outros” (1998:364).

A Inquisição foi apontada como principal fator do “atraso” cultural e científico, mas destacou o papel da Igreja católica como instituição repreensora de novas ideias e como promotora do atraso no qual Portugal se encontrava em fins do século XIX.

Ainda de acordo com Campos Matos, “nas Causas da decadência... de Antero de Quental, a lógica dedutiva é levada às últimas consequências, chegando a aludir-se uma ‘lei da evolução histórica’, que não passa afinal do encadear de um conjunto de conceitos abstractos numa inexorável sequência de causa-efeito” (1998:362-363).

Apesar de essa formulação ser a base do pensamento de Quental, focaremos em um aspecto aparentemente secundário, mas que tornar-se-ia central no debate historiográfico no século XX: o poder municipal frente à centralização monárquica.

Antero de Quental apontou que a descentralização político-administrativa é uma das características basilares dos povos ibéricos, mesmo antes da sua criação enquanto Estado. Afirmou que

logo na época romana aparecem os caracteres essenciais da raça peninsular: espírito de independência local e originalidade de génio inventivo. Em parte alguma custou tanto à dominação romana o estabelecer-se, nem chegou nunca a ser completo esse estabelecimento (2010:9).

Dessa forma,

o instituto político de descentralização e federalismo patenteia-se na multiplicidade de reinos e condados soberanos, em que se divide a Península, como um protesto e uma vitória dos interesses e energias locais, contra a unidade uniforme, esmagadora e artificial. Dentro de cada uma dessas divisões as comunas, os forais, localizam ainda mais os direitos, e manifestam e firmam, com um sem-número de instituições, o espírito independente: é, quanto à época o comportava, singularmente democrático (QUENTAL, 2010:10).

Sobre Portugal e Espanha definiu que “a liberdade era então estado natural da península” (QUENTAL, 2010:32).

Essa autonomia seria responsável pelo desenvolvimento das artes e da ciência, que culminariam no destaque que Portugal e Espanha tiveram no século XV e XVI com as Navegações e descobertas de novos continentes.

Para Quental, as navegações e a atenção dada às Conquistas foram as razões pelas quais a monarquia, fortalecida pelas riquezas do Oriente e, posteriormente, com o ouro das Minas Gerais, possibilitou o enfraquecimento dos poderes municipais.

No entanto o desejo pela de novas terras levou a perda da independência de Portugal, causada pela crise dinástica gerada pela morte de D. Sebastião quando da tentativa de conquista do Marrocos.
Assim,

deste mundo brilhante, criado pelo génio peninsular na sua livre expansão, passamos quase sem transição para um mundo escuro, inerte, pobre, ininteligente e meio desconhecido. Dir-se-á que entre um e outro se meteram dez séculos de decadência: pois bastaram para essa total transformação 50 ou 60 anos! Em tão curto período era impossível caminhar mais rapidamente no caminho da perdição (QUENTAL, 2010:15).

O responsável por essa mudança, que levaria à decadência dos peninsulares, notadamente Portugal, teria sido a União Ibérica. Nem tanto pela supressão nacional lusitana, mas pelo fato de um monarca, em especial, Felipe II, sob a Contrarreforma católica, pudesse influenciar toda a península com sua ideia de fanatismo religioso e, principalmente, de centralização absolutista.
Por isso, segundo Antero de Quental,

no princípio do século XVII, quando Portugal deixa de ser contado entre as nações, e se desmorona por todos os lados a monarquia anómala, inconsistente e desnatural de Filipe II; quando a glória passada já não pode encobrir o ruinoso do edifício presente, e se afunda a Península sob o peso de muitos erros acumulados, então aparece franca e patente por todos os lados a nossa improcrastinável decadência. Aparece em tudo, na política, na influência, nos trabalhos da inteligência, na economia social e na indústria, e como consequência de tudo isto, nos costumes (QUENTAL, 2010:15).

A centralização política e o controle religioso culminariam com a decadência de Portugal e Espanha. Anuncia que

vamos de século para século minguando em extensão e importância, até não sermos mais que duas sombras, dois espectros, no meio dos povos que nos rodeiam!... E que tristíssimo quadro o da nossa política interior! As liberdades municipais, à iniciativa local das comunas, aos forais, que davam a cada população uma fisionomia e vida próprias, sucede à centralização, uniforme e esterilizadora (QUENTAL, 2010:15).

Assim, notadamente em relação aos poderes municipais, “a centralização monárquica, pesada, uniforme, caiu sobre a Península como a pedra dum túmulo” (QUENTAL, 2010:33)

Concluiu Antero de Quental, portanto, que “esta causa [Concílio de Trento e catolicismo] actuou principalmente sobre a vida moral: a segunda, o absolutismo, apesar de reflectir no estado de espíritos, actuou principalmente na vida política e social” (2010:31).

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Fonte:
Fernando V. Aguiar Ribeiro (Doutorando em História Econômica pela Universidade de São Paulo e mestre em História Econômica pela mesma instituição. Bolsista CNPq. Artigo resultante de etapa de doutoradosanduíche realizado em Portugal no Instituto Universitário de Lisboa (ISCTE) e financiado pela CAPES - fvribeiro@gmail.com): " Influências de Causas da decadência dos povos peninsulares de Antero de Quental na historiografia sobre poderes locais em Portugal e no Brasil no século XX". Revista Eletrônica Cadernos de História, ano 8, n.° 1, julho de 2013: http://www.ichs.ufop.br/cadernosdehistoria/

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