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A dissolução do regime capitalista
Ninguém
hoje contesta que o homem tem direito à vida. A legislação punindo o aborto,
reconhece-lhe esse direito ainda antes mesmo de nascer. O direito à vida
subentende o direito ao trabalho, porque é o trabalho o meio legítimo de obter
recursos para viver, isto é, de ocorrer às necessidades iniludíveis e primeiras
do homem — a alimentação, o alojamento e o vestuário.
Na
sociedade atual, pode o homem exercer sempre o trabalho de maneira que
satisfaça a essas necessidades?
Digam-no
os fatos.
Um
pavoroso incêndio, em novembro de 1895, devastou em poucas horas as principais
oficinas da Companhia Real dos Caminhos de Ferro Portugueses, reduzindo à
miséria cerca de 600 operários, que nelas trabalhavam quotidianamente e que de
repente, por esse motivo, ficaram sem trabalho, e até sem ferramenta aqueles
que a tinham sua.
A
companhia tinha os valores, que o incêndio destruiu, devidamente garantidos por
meio de seguros contra o risco de fogo. Mas os operários? Esses, coitados, não
tinham o seu trabalho garantido, nem sequer as suas ferramentas no seguro.
Foram portanto estes as verdadeiras e únicas vítimas do espantoso incêndio.
Ora
600 operários sem trabalho representam 600 famílias na miséria, ou pouco menos.
Verdade é que o conselho administrativo ou fiscal da companhia procurou atenuar
o mal proveniente dessa terrível situação; deliberando licenciar os operários,
abriu uma inscrição para todos eles, a fim de os readmitir à proporção que as
oficinas se fossem reconstruindo; e pagando aos operários licenciados, até o
fim daquele ano, na razão de 50 por cento dos seus salários normais.
Mas
se esta providência melhorou um pouco a situação a que pelo incêndio ficaram
reduzidas perto de 600 famílias operárias, não era suficiente para que essas
famílias pudessem viver até a readmissão dos operários licenciados, já não
diremos medianamente, mas simplesmente como viviam antes do fatal incêndio.
Em
regra, a féria do operário, qualquer que seja a arte ou o ofício que exerce,
não excede um mínimo com que dificilmente pode ocorrer às despesas de
alimentação, alojamento e vestuário. Se dificilmente pode ocorrer a essas três
despesas de absoluta necessidade, sendo só, o que não acontece tendo família? E
é exatamente este o maior número de casos. A mulher e os filhos umas vezes, e
outras os pais impossibilitados de trabalhar pela idade ou pela doença
sobrecarregam o pobre operário, que com eles tem de repartir quotidianamente o
produto do seu parco salário.
Se
a mulher ou alguns dos filhos concorrem também para as despesas da casa com as
suas respectivas férias, não o fazem com partes iguais às do operário chefe de
família porque as férias das mulheres e dos menores são excessivamente
arrastadas. A exploração capitalista exerce-se com mais força sobre as mulheres
e os menores. E no entanto as mulheres e os menores para satisfação das suas
necessidades recebem proporcionalmente mais da casa comum do que a parte com
que para ela contribuem.
Nestas
circunstâncias as 600 famílias de operários, ou pouco menos, vendo reduzido a
metade o salário do chefe de família, a única ou a principal fonte do todas as
despesas domésticas, haviam de sentir a miséria entrar-lhes pela porta dentro
com todas as suas lamentáveis e horrorosas consequências.
De
um dia para o outro ficaram 600 operários sem trabalho e perto de 600 famílias
na miséria, e isto sem que por forma nenhuma tivessem contribuído com a sua
conduta para essa ruína. Mas sofreram todas as consequências da destruição que
não prepararam nem puderam evitar.
[Trecho do Livro]
[Trecho do Livro]
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