27/06/2015

Capítulos de História Colonial, de Capistrano de Abreu

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Capistrano de Abreu e o Descobrimento do Brasil

A obra relativamente exígua de Capistrano de Abreu teve, com freqüência, dois livros valorizados, Capítulos de história colonial e Caminhos antigos e povoamento do Brasil. A razão para o fato parece-nos estar em que, além do valor intrínseco como sínteses dos anos formativos coloniais e frutos amadurecidos de sólida pesquisa e reflexão, deixam os demais trabalhos do autor para trás pela própria natureza destes: a tese sobre o descobrimento do Brasil é vista como obra de juventude, presa ao esquema spenceriano; os opúsculos sobre o descobrimento e o trabalho acerca das línguas indígenas são forçosamente mais restritos; e os artigos de jornal reunidos nos Ensaios e estudos, após a morte do autor, ressentem-se às vezes da fugacidade dos comentários e do pequeno desenvolvimento.

Se examinarmos as obras principais buscando o tema do descobrimento, constataremos que o assunto está ausente dos Caminhos, o que é perfeitamente lógico,1 e nos Capítulos de história colonial é tratado no terceiro capítulo, de um conjunto de onze, correspondendo a 15 páginas de um volume com 297, o que significa 5%.2 Se o tema for alargado para os antecedentes europeus e a disputa inicial pela terra, isto é, para o capítulo antecedente e o posterior, a conjuntura dos descobrimentos cresce para 31 páginas. O tema preferido de Capistrano, o sertão, foi tratado nesse livro em capítulos de 105 páginas, correspondente a pouco mais de um terço da obra.

Devemos concluir, por esses dados, que Capistrano de Abreu, após um breve entusiasmo de juventude, desinteressou-se do tema do descobrimento? Teria sobre ele, na maturidade, um juízo semelhante a aquelas conhecidas opiniões sobre as invasões holandesas e a conjuração mineira?

Para responder às duas perguntas, temos de repassar os textos nos quais o autor se refere ao descobrimento.

Em 1880, publicou um texto não referente de modo direto ao descobrimento, mas à sua conjuntura: O Brasil no século XVI: a armada de d. Nuno Manuel, quando defendeu o ponto de vista do comando desta personagem na expedição de 1501. Trabalho de juventude, mais tarde o autor reformularia conceitos nele emitidos, a partir do próprio comando da expedição. Esse trabalho e a tese foram as obras nas quais se baseou o relator Manuel Duarte Moreira de Azevedo para dar parecer favorável ao ingresso de Capistrano no Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, em 14 de setembro de 1887.

Na tese apresentada em 1883 ao Imperial Colégio Pedro II, para a obtenção da cadeira de história do Brasil, o autor apresentou o trabalho Descobrimento do Brasil e seu desenvolvimento no século XVI. O assunto foi desenvolvido em pouco mais de oitenta páginas e compreendeu duas partes. Na primeira, foi tratado o descobrimento de 1500, sob o ângulo das pretensões francesas, espanholas e portuguesas. Na segunda, Capistrano continuou utilizando o conceito de descobrimento, estendendo-o para todo o século: “Descobrimento do Brasil no século XVI”. As duas partes possuem conclusões parciais.

Dezessete anos mais tarde, no contexto das comemorações do IV Centenário do Descobrimento, Capistrano publicaria mais dois trabalhos: “O descobrimento do Brasil pelos portugueses” foi publicado primeiro pelo Jornal do Comércio, na edição de 3 de maio de 1900, seguindo-se a edição em opúsculo, no mesmo ano, pela editora Laemmert. O outro texto, intitulado “O descobrimento do Brasil – povoamento do solo – evolução social”, foi concluído no Livro do centenário 1800-1900, publicado pela Associação do Quarto Centenário do Descobrimento do Brasil, entidade que fora fundada com o objetivo de centralizar as comemorações do evento.

Os dois trabalhos não se repetem. No primeiro, o autor descreveu e analisou a viagem de Cabral, as questões conexas (local da chegada, originalidade da carta de Caminha, a grafia da palavra Brasil) e as duas ‘correntes históricas’ das navegações, pelo litoral africano e no oeste.

O segundo texto de 1900 é mais abrangente, revelando a visão ampla do autor em relação aos antecedentes da expansão européia, quando remonta sua análise ao século XII. Levando em conta o estado da historiografia à época, a síntese de Capistrano era atualizada e muito superior ao que circulava no Brasil sobre o assunto, com exceção do então recém-lançado (também em 1900) compêndio de João Ribeiro, cuja filiação à Kulturgeschichte de Lamprecht explica a importância atribuída à sucessão de quadros conjunturais da baixa Idade Média.

No caso português, Capistrano trata da política do infante e de d. João II. Considera ainda os grupos indígenas existentes em 1500 e o papel que assumiria o Brasil nesse processo de expansão. Como na tese, organizou no texto as fontes para a história do descobrimento então disponíveis, trabalhando com as cartas de Caminha e do mestre João.

Em 1905, voltaria ao tema dos descobrimentos com dois artigos publicados na Revista Kosmos. Neles trata das controversas expedições de 1501 e 1503, descrevendo os acontecimentos com base nos documentos existentes e elaborando inferências fundadas no conhecimento dos portugueses sobre o tema. Nesses artigos, chamou a atenção para a exploração do litoral brasileiro daí por diante em duas vertentes, a da costa leste-oeste (Rio Grande do Norte ou Pará) e sudoeste (litoral do Rio Grande do Norte ao rio da Prata).

O último texto, de 1908, intitula-se “Vaz de Caminha e sua carta” e foi publicado na Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, saindo uma segunda edição no Livro de ouro do centenário da independência, em 1922.

O autor elabora seu estudo com o levantamento das edições da carta, os dados biográficos de Caminha, a descrição da estrutura da narrativa e a avaliação dos juízos nela contidos. Discute no texto, ainda, as dúvidas sobre a autenticidade do documento e sobre o acaso, referindo-se à carta de mestre João e ao controvertido trecho de Duarte Pacheco Pereira, no Esmeraldo de situ orbis, de 1906, de sua vinda ao Brasil em 1498, tema que já considerara na tese do Colégio Pedro II.


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Fonte:
Arno Wehling (Professor titular da Uni-Rio e da UGF. Presidente do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro). Acervo, Rio de Janeiro, v. 12, nº 1-2, p. 27-36, jan/dez 1999 - pág.29. Disponível em: www.revistaacervo.an.gov.br

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