Para baixar este livro gratuitamente em formato PDF, acessar o
site do “Projeto Livro Livre”: http://www.projetolivrolivre.com/
(Download)
↓
(Download)
↓
Os livros estão em ordem alfabética: AUTOR/TÍTULO (coluna à
esquerda) e TÍTULO/AUTOR (coluna à direita).
A ressurreição da obra
Em 1966, no Clube de Leitura de
Porto Alegre, são encenadas as comédias “Mateus e Mateusa”, “Eu sou vida; eu
não sou morte” e “As relações naturais”, sob a direção de Antônio Carlos de
Sena. A partir de então, outras montagens se seguiram, e a imprensa de Porto
Alegre e do centro do país passou a atentar para a obra do escritor
sul-riograndense. Essa encenação foi a consagração do trabalho do professor
Guilhermino Cesar, que há anos tentava estudar e publicar a obra de
Qorpo-Santo. Nessa época, apenas três dos nove volumes da Ensiqlopèdia
qorpo-santense eram conhecidos: os de número II, IV e VII. O volume IV, que
contém os textos dramáticos do autor devidamente datados, demonstra que
Qorpo-Santo os escrevera entre janeiro e julho de 1866. Dos outros volumes
constam poemas, reflexões, notas autobiográficas, observações cotidianas,
culinária, projetos filosóficos, além de textos que teriam sido publicados no
jornal A justiça.
Em 1967, no Correio da manhã, Décio
Pignatari proclama que as peças do escritor são exemplos de metateatro,
elogiando “o comando da meta-linguagem (sic), de alusão e crítica à linguagem
romântica e ao teatro de costumes da época”. O artigo desse importante poeta e
crítico literário ainda ressalta o valor do comediógrafo que, segundo ele,
“emerge do passado para tonificar um pouco a
anêmica corrente sangüínea da nossa literatura dramática e poética”. Além disso, Pignatari tece
comentários sobre as três peças que havia lido na época, “Mateus e Mateusa”,
“Eu sou vida; eu não sou morte” e “As relações naturais”, bem como relaciona o
que chamou, em Qorpo-Santo, de meta-teatro, com os trabalhos de Ionesco e de
Artaud. É o começo de uma crescente valorização que o século XX conferiria à
obra de Qorpo-Santo.
No ano seguinte, a montagem de
Antônio Carlos de Sena é levada para o Rio de Janeiro e merece uma análise de
Yan Michalski, no Jornal do Brasil, onde o autor considera provável que o
sul-riograndense seja o precursor mundial do teatro do absurdo. Além disso,
elogia a imaginação, o humor e a constante ameaça de tragédia presentes em seu
teatro, o que, segundo ele, lembra Beckett e Pinter. O ano de 1968 seria o da
grande descoberta da obra de Qorpo-Santo. Três novas montagens teatrais são
realizadas de fevereiro a junho, no Rio de Janeiro, e há, inclusive, a
proibição de um espetáculo do Teatro Jovem, dirigido por Luiz Carlos Maciel,
sob a acusação de adulteração do sentido da peça “As relações naturais”. No
segundo semestre, a discussão acerca da descoberta de Qorpo-Santo causa furor
em Porto Alegre: vários artigos são publicados na imprensa tentando esclarecer
a real participação dos envolvidos na valorização do escritor, além de se
criarem partidos antagônicos a favor de Aníbal Damasceno Ferreira e de
Guilhermino Cesar, embora nenhum dos dois reivindicasse o título de
descobridor.
Desde então, os trabalhos de
pesquisa sobre Qorpo-Santo começam a se multiplicar. Entre eles, destacam-se: a
compilação das peças do autor, empreendida por Guilhermino Cesar; uma tese de
mestrado tratando de aspectos estéticos da obra de Qorpo-Santo, feita por
Flávio Aguiar; a pesquisa de Leda Maria Martins, que estabeleceu relações entre
o teatro de Qorpo-Santo e as inovações cênicas ocorridas na dramaturgia do
século XX; um livro de Eudinyr Fraga, em que Qorpo-Santo é visto como um
precursor do surrealismo; um romance de Luiz Antonio de Assis Brasil, tendo o
comediógrafo como personagem principal; e a compilação de poemas do escritor
realizada por Denise Espírito Santo.
O primeiro desses estudos, As
relações naturais e outras comédias, foi publicado em 1969 pela Faculdade de
Filosofia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Nesse livro,
encontram-se compiladas nove comédias de Qorpo-Santo, com anotações e prefácio de Guilhermino Cesar. São elas: “As relações
naturais”, “Mateus e Mateusa”, “Hoje sou um; e amanhã outro”, “Eu sou vida; eu
não sou morte”, “Um credor da Fazenda Nacional”, “Um assovio”, “Certa entidade
em busca de outra”, “Lanterna de fogo” e “Um parto”.
A obra apresenta trechos da
Ensiqlopèdia onde Qorpo-Santo traça sua autobiografia, bem como traz os autos
dos exames pelos quais o escritor passou devido aos distúrbios mentais e os
despachos do juiz responsável. Também reproduz documentos históricos que
oferecem dados sobre a morte do autor, os herdeiros e os bens, e traça a
cronologia de sua obra dramática. O livro ainda relaciona o conteúdo dos
volumes conhecidos da Ensiqlopèdia (que, na época, eram apenas três) e
apresenta um estudo crítico sobre a obra de Qorpo-Santo.
No Estudo Crítico, Cesar afirma
que, da Ensiqlopèdia, foram publicados, no mínimo, oito fascículos, dos quais
apenas três seriam conhecidos (dois pertencentes ao Professor Dario de Bittencourt
e um ao escritor Olyntho Sanmartin). O crítico explica a publicação da obra do
escritor sul-riograndense como uma espécie de revide aos jornais da Província,
que já não aceitavam seus textos:
Num desses momentos de paz que a
Justiça, implacável, lhe concedeu, fundou a Tipografia Qorpo-Santo, à Rua
General Câmara, esquina da Rua da Praia; e, como o fizera anteriormente em
Alegrete, publicou seus escritos, tornando-se o editor de si mesmo. Desforrou-se,
por essa forma, dos jornais gaúchos, que teimavam em recusar-lhe a colaboração.
E assim se explica o aparecimento da Enciclopédia ou Seis Meses de uma
Enfermidade, coletânea hoje absolutamente rara.
Ainda segundo Cesar, foi Olyntho
Sanmartin quem começou a estudar a sério a poesia de Qorpo-Santo, em 1955. Mas
assinala que, ao escrever a História da literatura do Rio Grande do Sul,
publicada no ano seguinte, ele mesmo não encontrara nada de autoria do poeta e
comediógrafo oitocentista nas bibliotecas e arquivos do país. E esclarece que
fora Aníbal Damasceno quem lhe indicara o professor Dario de Bittencourt como detentor de um
fascículo da Ensiqlopèdia.
Cesar também constata as
diferenças que existem entre as peças do autor e o que era produzido pelo
teatro da época:
Tais comédias não são
nada românticas, quer no
tema, quer na
linguagem e na
atmosfera, embora seu autor houvesse nascido em 1829. Apresentam situações conflituosas peculiares à sociedade
gaúcha do século XIX; e, do ponto de vista da expressão verbal, são verdadeiramente
surpreendentes: desprezam por completo a linguagem ornamental – comum no melhor
teatro da época.
Na linguagem, Qorpo-Santo é,
então, analisado como um autor singular, cuja frase seca, sem adjetivos e
inversões oracionais, com seu fluxo elocutivo despojado, não caíra no gosto do
público mais afeito à declamação, à loquacidade, do que à ação, o que faz dele
o mais atual dos autores de seu tempo.
---
Fonte:
Fonte:
Douglas Ceccagno: “Ovelhas merinas: malditas feras: O imaginário social no teatro de Qorpo-Santo”. ( “Dissertação apresentada como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre em Letras e Cultura Regional, com concentração na área de Literatura e Cultura Regional, pela Universidade de Caxias do Sul. Orientador: Prof. Dr. João Claudio Arendt). Caxias do Sul – RS, 2006.
Notas:
A imagem inserida no texto não se inclui na referida tese. As notas e referências bibliográficas de que faz menção o autor estão devidamente catalogadas na citada obra. O texto postado é apenas um dos muitos tópicos abordados no referido trabalho. Para uma compreensão mais ampla do tema, recomendamos a leitura da tese em sua totalidade. Disponível em: www.laab.com.br
Nenhum comentário:
Postar um comentário