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Poemas líricos
Já no subtítulo de sua tradução da Ode I de Horácio,
Caldas expressa o desejo de se tornar um poeta lírico. Nesse
conjunto foram reunidos vinte e três poemas que revelam a faceta sentimental e
íntima do Poeta. Abordam uns o tema da amizade, outros, o amor. Alguns são claramente
autobiográficos, recuperando certos momentos da vida do escritor. Tendo sido
uma constante na sua própria vida, a amizade é um dos temas favoritos de Caldas Barbosa. Dela trata o soneto Versos, qu’ Amor, e qu’ a
Razão ditara, que abre o Almanak das Musas, ressaltando a importância primordial que este sentimento
tem na concretização da Academia de Belas Letras, a mais importante agremiação
de poetas portugueses do final do século XVIII. O mesmo valor é atribuído ao
amor, tema lírico por excelência, como revelam os versos do soneto Com a terna
Amizade, Amor lutava que traz à lembrança a justiça de Salomão:
Com a terna Amizade, Amor lutava,
Fora a primeira vez, que vira a terra
Destes meigos Irmãos a usada guerra,
E assustada tremia, e vacilava:
Longa trança da Deusa ao ar ondeava
Entre o sendal, que desatado erra,
E o véu fatal, que ao Nume os olhos
cerra,
Em pedaços ao vento volteava:
Desce dos Céus fatídico Destino;
Ouve da boca de ambos a verdade;
Marfida os move a este desatino:
Decretou a infalível Divindade;
Parta-se o coração, de ambos é dino;
Dê-se uma parte a Amor, outra à
Amizade.
As Doentes, poema em redondilha, trata do mesmo
tema, desta vez discorrendo sobre o entendimento inédito do Amor e da Razão que, como
prevê o Poeta, não perduraria.
Amor logo se desespera em busca da
amada e cruel Alcina e, como em todo arrufo amoroso, o que salva é a razão, cabendo à amizade, tão prezada pelo
poeta, apaziguar a tormenta:
Inda estava assim bradando
Esta meiga Divindade,
Eis qu’ pressa caminhando
A solícita Amizade
Vem o caro Irmão buscando.
À esperta Razão saúda,
Depois a Amor brandamente
Diz que à sua Alcina acuda,
Porque Alcina está doente; (v. 56 a 64)
Mas as explicações oferecidas pela Amizade não convencem
Amor que tudo pode e, resoluto,
Já ia em tanta aflição
Armar-se de arco, e de aljava,
Sustem-lhe o braço a Razão,
E a Amizade suplicava
Precisa quietação. (v. 111 a 115)
Por entre a vereda estreita
Voa Amor ferindo as gentes,
A Razão seu vôo espreita,
E vê que às suas doentes
Vai preparar a receita. (v. 121 a 125)
Neste poema, Caldas Barbosa parece querer deixar uma lição
ao mostrar que não se deve fiar no Amor, sempre impetuoso, ao passo que a esperta
Razão talvez seja excessivamente fria. Sugere, pois, que nada se compara à
temperança da Amizade. Ainda dentro do tema do amor e da amizade, a saudade, palavra tão cara aos portugueses,
constitui assunto duma série de redondilhas reunidas sob o título A Ilustre
O Neill pergunta que cousa sejam saudades.
Caldas Barbosa define esse sentimento,
tido como português, mas que a todos pertence, faltando-lhes apenas palavras apropriadas para defini-lo.
Pois saber o que é saudade
Gentil O Neill careces,
Vou talvez dizer-te um mal,
Que sofres, e não conheces.
Dirão uns qu’ sentimento.
Que só Portugueses têm;
E qu’ importa falte aos outros,
Vozes qu’ o expliquem bem: (v. 35 a 42)
Nessa homenagem Sra. O Neill, inglesa de nobre clã irland s
e radicada em Lisboa, Caldas mostra conhecer grandes nomes da cultura
britânica, tais como Pope, Robinson, Swift e Newton (v. 12 a 19).
Aos críticos do autor da Viola de Lereno
agrada de citar, em tom de velado desprestígio, uma quadra em que ele faz
um paralelo entre a Sra. O Neill, um Cisne do Tamisa, e ele
próprio, o Brasileiro Papagaio. A tendência desses críticos é subestimar essa
ave tão valorizada fora do Brasil pela beleza de suas penas coloridas
e por sua capacidade única de imitar a voz humana. Assim, o
Poeta observa que não se ouve a voz do Cisne britânico mas a do garboso
Papagaio do Brasil, que não é um pardaleco mas um pássaro altaneiro, sugerindo com
isso o valor que ele próprio se atribuía.
Não é do Tamisa um Cisne,
Que vai soltar doce canto,
Brasileiro Papagaio
De arremedo a voz levanta (v. 23 a 26)
Caldas arrola várias definições poéticas de saudade, filha
de cruel ausência que se nutre de ternas lembranças, desejos e
esperanças, mencionando também a saudade que sentem os que estão
ligados pelo amor ou pela amizade. Conclui com manifestações de encanto e sedução tão característicos dos poemas da Viola, ao afirmar que, sem o saber, por ser tão amada e
admirada, a O Neill ter ela própria causado muita saudade:
Basta, Senhora: já sabes,
Qu enfim saudade só
O sentimento que um sofre,
Quando o que estima não vê:
Tu qu onde quer qu apareces,
Causas Amor, e Amizade,
Terás dado (eu não duvido)
Motivo a muita saudade. (v. 99 a 106).
São dez os poemas cujo tema é amor propriamente dito dos
quais, apenas três não citam os nomes das suas musas inspiradoras.
A Arminda, até hoje não identificada, são dedicados três
poemas. No soneto Todos querem saber quem seja Arminda”,
Caldas Barbosa mostra a sua intenção de esconder ciosamente a identidade da sua
musa, afirmando:
Talvez piedade o meu segredo seja;
Eu não lhe mostro Arminda, que não
quero,
Qu eles morram de Amor, elas de inveja.
(v. 12-14)
No soneto “De uma gruta no seio cavernoso”. Caldas insiste
na afirmação do seu grande afeto por essa musa, como se pode
depreender do abandono de tudo para estar na sua companhia:
Acorda alegre o pescador; já vedes,
Que por sonhados bens da formosura,
Deixa o certo descanso, o barco, as
redes. (v. 12-14)
E, finalmente,
em Se eu vejo o forte, o impávido Tebano” confessa estar irremediavelmente preso a Arminda pois:
Não há que resistir, pobres amantes,
Porque contra o poder do Deus vendado,
Nem d Hércules as for as são bastantes.
(v. 12-14)
O fato de Caldas Barbosa ter dirigido suas duas artes
poéticas a Arminda131permite concluir que ela terá sido uma
das musas mais queridas e supor que fosse alguma das senhoras de seu círculo de
convivência, provavelmente uma bela poetisa. Nesse caso, estariam D. Joana
Isabel de Lencastre Forjaz (c. 1745 -?), ou a Marquesa de Alorna (1750-1839)
ou, ainda, D. Maria José de Meneses, Condessa de Soure, a quem
chamavam de Márcia Bela.
Seguem-se outros três sonetos com tema amoroso
e uma Carta em versos em que Caldas Barbosa cita os nomes de outras de suas
musas inspiradoras: Tirce, Diana, Bela Márcia e Anfriza.
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Fonte:
Luiza Sawaya: “Domingos Caldas Barbosa: para além da Viola
de Lereno”. Dissertação de Mestrado orientada pela Professora Doutora Vanda
Anastácio. Universidade de Lisboa - Faculdade de Letras. Lisboa, 2011. Disponível
em: repositorio.ul.pt.
Notas:
A imagem inserida no texto não se inclui na referida tese. As notas e referências bibliográficas de que faz menção o autor estão devidamente catalogadas na citada obra. Para uma compreensão mais ampla do tema, recomendamos a leitura da tese em sua totalidade.
A imagem inserida no texto não se inclui na referida tese. As notas e referências bibliográficas de que faz menção o autor estão devidamente catalogadas na citada obra. Para uma compreensão mais ampla do tema, recomendamos a leitura da tese em sua totalidade.
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