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Varela e o fantástico
Originalmente publicadas em
folhetim, As Ruínas da Glória, A Guarida de Pedra e As Bruxas, assim como os contos
de horror que em certo momento povoaram a literatura do outro lado do
Atlântico, trazem consigo toda a atmosfera sombria e, em boa medida, enigmática
que é própria do espírito romântico da chamada segunda fase.
Dessas três obras, pouquíssimo
conhecidas hoje em dia, a que, a nosso ver, possui melhor realização no que diz
respeito aos mecanismos de manutenção da narrativa fantástica é a primeira.
Nesse conto, podemos perceber
alguns elementos que o ligam à tradição das narrativas fantásticas, além de ser
também possível encontrar ali outros elementos que permitem reconhecê-lo como
uma obra romântica. Afora o estilo próprio dos românticos, com longos períodos,
sonoros adjetivos que pululam a todo o momento e com uma linguagem carregada de
sentimentalismo característico da escola, esse conto de Fagundes Varela
representa, ao lado de outras obras também pouco conhecidas, os primeiros
passos, ainda vacilantes, da narrativa fantástica em solo brasileiro. É claro que
o próprio fantástico sofreu alterações ao longo do tempo, resultando, no final
do século XIX e início do XX, em obras distintas daquelas realizadas nos
primórdios do Romantismo europeu, pois, da mesma forma, as expectativas do
público leitor sofrem alterações ao longo dos anos, o que se dá, é certo,
também por conta das obras que renovam o paradigma, ao mesmo tempo em que
seguem uma tradição:
[...] não convém separar a
repercussão da obra da sua feitura, pois, sociologicamente ao menos, ela só
está acabada no momento em que repercute e atua, porque, sociologicamente, a
arte é um sistema simbólico de comunicação inter-humana [...].
Ora, todo processo de comunicação
pressupõe um comunicante, no caso o artista; um comunicado, ou seja, a obra; um
comunicando, que é o público a que se dirige: graças a isso define-se o quarto
elemento, isto é, o seu efeito. (CANDIDO, 2000, p. 21)
Assim, seria necessário refletir
a respeito das condições em meio às quais se via
Fagundes Varela para podermos
chegar não a um juízo definitivo – noção utópica, senão nociva – de qualquer
uma de suas obras, mas nos aproximarmos de uma leitura válida, na medida em que
se legitime mediante critérios que levem em consideração os elementos que, em
conjunto, elucidam alguns de seus aspectos intrínsecos, da mesma forma que
influem em outras obras do gênero ou em outras do mesmo autor.
Caracterizando-se pela
divergência, o fantástico porventura teria uma recepção diferente, se comparado aos
outros gêneros.
Uma constatação pertinente a ser
feita nesse sentido é que, apesar de serem o conto ou a novela formas
narrativas nas quais o teor fantástico encontraria terreno mais propício à sua
construção – tanto pela questão da manutenção da atmosfera quanto pela intensidade
do efeito pretendido –, o elemento fantástico não aparece com tanta frequência
nas formas breves como vemos acontecer com outros temas, como o amor ou o
heroísmo, os quais também encontramos tanto nos romances como nos poemas do
período. Assim, ao contrário do que se poderia imaginar a princípio, o fato de
ser a narrativa curta de mais fácil apreensão por parte dos leitores/ouvintes –
por não possuir muitos personagens e se concentrar, via de regra, em uma única
trama narrativa – não propiciou ao fantástico maior
público do que os contos de outra natureza.
Está claro que, por nos
concentrarmos no conto, não nos ocuparemos de narrativas de horror que integrem
formas maiores, constituindo, pois, episódios que pertenceriam a uma trama
complexa à qual estariam subordinadas. Por isso, quando tratarmos dos contos
que aqui nos interessam, procuraremos não remeter a obras que se enquadrem numa
perspectiva mais abrangente.
Restringindo dessa forma nosso
paradigma, é evidente que, principalmente no caso do Brasil, poucas obras
poderiam ser compreendidas como representantes do fantástico puro ou em suas
variações. Do Romantismo brasileiro, interessam-nos de perto as obras de
Álvares de Azevedo e as de Fagundes Varela. As deste, obviamente, por
constituírem o objeto de nosso trabalho, e as daquele por terem exercido
influência sobre a obra do escritor fluminense. Frisemos, no entanto, que, no
tratamento dado à temática, Álvares de Azevedo estava mais ligado a motivos
góticos do que Fagundes Varela. Este, certamente, procura situar sua obra ao
lado de outras de mesmo teor, isso é o que se pode depreender da leitura de um
de seus contos em especial, o já referido As Ruínas da Glória, pois são
frequentes as referências ao universo gótico característico de algumas obras do
Romantismo alemão.
Um fator que se deve sublinhar
nesse contexto é que a narrativa fantástica não gozava do mesmo prestígio entre
o público leitor do Brasil do século XIX que lá fora tinham os contos de E. T.
A. Hoffmann ou E. A. Poe. Aqui, preferia-se algo mais suave; o aspecto muitas
vezes grotesco das narrativas de algumas histórias ia de encontro àquilo que se
acostumou a ler durante o período romântico. Outra pequena observação a ser
feita é que tais aspectos levariam o leitor a um estranhamento, colocando-o em face
de um “mundo alheado”, transformado em algo que escapa à compreensão (KAYSER,
2003, p. 159). A pertinência dessa observação se dá pela íntima relação entre o
fantástico e o grotesco, apesar de este não se configurar como elemento essencial.
O grotesco, tal qual a essência do fantástico na definição todoroviana, depende
de certa atitude por parte do leitor; é preciso que se assine uma espécie de contrato,
em que o leitor assume uma postura específica: o grotesco reside na periferia dos
dois mundos, no “contraste indissolúvel, sinistro, o que-não-devia-existir”
(KAYSER, 2003, p. 61).
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Fonte:
Frederico Santiago da Silva: “A narrativa fantástica de Fagundes Varela”. (Dissertação apresentada à Faculdade de Ciências e Letras de Assis – UNESP – Universidade Estadual Paulista, para a obtenção do título de Mestre em Letras. Orientador: Dr. Luiz Roberto Velloso Cairo). Assis, 2013.
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