27/04/2014

Mana Maria, de Alcântara Machado

 Mana Maria, de Alcântara Machado
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Alcântara Machado e a linguagem ítalo-paulista

O escritor e jornalista Antônio Castilho de Alcântara Machado d’Oliveira (1901-1935) não se enquadrou dentro da filosofia do período modernista por acaso. Podemos observar em seus contos o mais puro retrato de uma época. Testemunhos são dados por vários escritores, como Alceu Amoroso Lima11, por exemplo: “(...) O sr. Alcântara Machado nunca se perde. O que tem a dizer diz logo. E vai direto ao que conta. (...) Os contos do sr. Alcântara Machado são imagens do São Paulo de hoje, da italianização da
raça sobretudo.”

Alcântara, em um de seus artigos no                     Diário da Noite, qualificou de “famigerado” o artigo 26 da Constituição de 1934, que revogou o acordo ortográfico oficializado pelo governo da época.12 Essa atitude corrobora o seu caráter decidido. Com esse perfil, só podia mesmo seguir a filosofia do Modernismo, ou seja “destruir o convencionalismo literário, desmoralizar a inteligência empalhada e acabar com os medalhões da cultura”.

Aliás, uma de suas viagens à Europa possibilitou-lhe um contato direto com os modernistas europeus.

Desde criança, Alcântara já tinha o gosto pela leitura, despertada pelas histórias em quadrinhos do Tico-Tico, uma das criações do desenhista, caricaturista e escritor ítalo-brasileiro Angelo Agostini. Ao longo de sua carreira como escritor e jornalista, manteve uma estreita ligação estilística com os quadrinhos e com a linguagem visual, dialogando com artistas como Angelo Agostini, Voltolino e, principalmente, Paim, co-autor de Pathé-Baby (obra que se caracteriza pela reunião de impressões de viagem e de crônicas), com prefácio de Oswald de Andrade e ilustrações de Antonio Paim, publicada em 1926 pela Editorial Hélios Limitada, de São Paulo. De duas maneiras, Voltolino influenciou Alcântara: pela maneira como desenhava e através de sua criação, o personagem JuóBananére, que parodiava a colônia italiana de São Paulo.

As origens aristocráticas desse escritor cujo centenário de nascimento foi em 2001 contribuíram para o que produziu, ou seja, o retrato da vida do imigrante eternizado nos contos de Brás, Bexiga e Barra Funda.

As comemorações dos seus 100 anos de nascimento foram marcadas pela reedição de seus livros. A editora Studio Nobel, em co-edição com o IEB (Instituto de Estudos Brasileiros) da USP, e a Imesp lançaram os três primeiros volumes, de um total de sete, das obras completas de Alcântara Machado, com organização de Cecília de Lara e Djalma Cavalcante.

A posição de espectador de Alcântara foi fundamental para o registro de um momento histórico e único, um universo que não mais existe. O Brás do barbeiro Tranquillo Zampinetti, do conto “Nacionalidade”, já não é mais um bairro maciçamente italiano. A inevitável mobilidade social de São Paulo fez desaparecer traços de uma pequena Itália retratada de forma tão original. O barbeiro e tantos outros que não foram personagens de Alcântara mudaram-se para bairros de classe média.  Restou-nos, além da obra-prima de Alcântara, o livro de memórias de Zélia Gattai, Anarquistas Graças a Deus, e os depoimentos de Memórias e sociedade, dedicados a Ecléa Bosi.

Alcântara não participou da famosa Semana de 22, surgindo apenas em 1925. Era já um escritor completo, cuja filosofia misturava-se com a do Modernismo, um movimento que desenvolvia o espírito revolucionário. Esse caráter inovador em Alcântara Machado, com seu ítalo-paulistanismo, é o mesmo ideal inovador do chamado movimento Decadentista, que surgiu com a consolidação de novas estratégias narrativas. Alcântara defendia, tal como os “rapazes” paulistanos que participaram da Semana de 22, a liberdade de criação artística, o direito de crítica, a livre expressão do pensamento, a literatura militante. E era integrado com a alma popular. O fato de ser um escritor paulista e paulistano o ajudou a descrever de forma clara, simples e objetiva a vida do imigrado italiano que foi para São Paulo.

No que se refere à língua, as questões que mais chamam a nossa atenção estão relacionadas com o uso dos vários códigos, ou seja, a língua de origem, o dialeto de origem, a criação de um linguajar que se adequasse à língua local, e a língua portuguesa propriamente dita. É interessante como Alcântara soube colocar isso em seu livro, retratando a chamada linguagem ítalo-paulista de forma a valorizar o imigrante. Ele soube combinar raça e língua sem fazer ironias ou desvalorizá-lo.

Alcântara, em seu livro de contos intitulado Brás, Bexiga e Barra Funda: notícias de São Paulo, traça histórias da vida cotidiana de pessoas comuns, moradoras de bairros humildes. No livro, o imigrante italiano constitui a própria trama, o núcleo central da obra literária, não é apenas um personagem episódico, como em Mário de Andrade, ou um pretexto de sátira, como em Juó Bananére. A imagem do italiano é, em geral, positiva em Alcântara.

Existia, como já se viu anteriormente, uma idéia reinante entre os imigrantes e seus descendentes (filhos, netos e bisnetos): a conquista da terra, a integração e absorção do imigrante pobre, que estava contagiado com o ritmo acelerado do progresso. O sentimento reinante era de progresso, novidade, velocidade e muito trabalho para todos. A metrópole crescia e transformava-se em morada de vários povos, especialmente de italianos. Era um sonho que se renovava através de exemplos dos barões da indústria, como os Matarazzo, Martinelli e Crespi. Imigrantes que deram certo em suas conquistas e aventuras em uma terra distante da de origem e que eram atentamente observados pelos olhos daquele que é considerado por muitos críticos o precursor do modernismo brasileiro: Juó Bananére.


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Fonte:

Adriana Zanela Nunes (UFR): Alcântara Machado: um escritor apaixonado pelos ítalo-brasileiros. Revista Eletrônica do Instituto De Humanidades. Volume V - Número XIX - Out - Dez 2006. Disponível em: publicacoes.unigranrio.com.br

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