11/04/2014

Álbum da rapaziada, de Francisco Moniz Barreto (Poemas obscenos)

 Álbum da rapaziada, de Francisco Moniz Barreto
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Um “álbum” só para rapazes...

Como tantos outros usos e tendências importados da Europa, os álbuns de autógrafos firmaram-se como moda entre os jovens do Brasil oitocentista. Conforme registra Ubiratan Machado, estardalhaço. Havia modelos para todos os gostos e posses. Cartonados para os menos endinheirados ou com ricas capas de veludo, marroquim ou xarão. As encadernações podiam ser em madeira forrada de seda ou em couro, com ilustrações em alto e baixo relevo. Ou, mais requintados ainda, com capa de madrepérola ou marfim. Não havia iaiá que resistisse. (2001, p. 112)

Em tais álbuns, via de regra, eram deixados, por poetas e aspirantes a poetas, poemas líricos, havendo neles todo um ritual e hierarquia sociais e de valores:

A regra, entre as pessoas de sociedade, consistia em selecionar os colaboradores pelo talento e pela fama. A composição devia ser original, de preferência com alguma alusão à homenageada Para obter o autógrafo, podia-se abordar o poeta num sarau, numa reunião em família ou enviar o álbum por um intermediário. As iaiás solteiras não perdiam ocasião de enriquecer sua coleção. Mas também as senhoras casadas, de reputação social, degustavam esse hábito como um bombom suíço. Entre as classes mais modestas, o álbum era preenchido pelo poeta do bairro, aquele sempre disposto a brilhar nos saraus domésticos, pelos primos e amigas. Nem sempre os poemas eram originais. (MACHADO, 2001, p. 113)

Destes hábitos descritos por Ubiratan Machado, pode-se perceber claramente que os álbuns eram compostos basicamente por poemas circunstanciais e “encomendados”. Portanto, mesmo que em alguns deles tenha havido a participação de personalidades renomadas como Machado de Assis e Fagundes Varela, por exemplo, estas coletâneas, em geral, não tinham grande valor que não o sentimental para quem as possuía. O próprio Francisco Moniz Barreto, que tanto se notabilizou por seus versos de circunstância e tão solicitado foi para improvisos, não deixou de registrar sua passagem nos álbuns. A terceira parte do primeiro volume dos Clássicos e Românticos é toda ela uma reunião de sua produção em tal gênero. A qualidade geral dos versos “para álbuns” pode ser confirmada, por exemplo, no poema feito para o álbum de D. Brasília Junqueira Nabuco, que começa com um acróstico:

Baixar à Terra o Cupido
Resolveu com setas mil:
Armas pra quê? (diz-lhe Vênus)
Se tu la tens o Brasil?!
Inútil (responde o Nume)
Levá-las, julgara eu,
Igualando as ninfas todas
A que Nabuco rendeu. (1855, p. 140)

Outra característica peculiar do hábito dos álbuns revela-se seu público cultivador, que, conforme citação acima, era basicamente feminino, composto pelas iaiás e ilustres senhoras. No entanto, conforme registra Ubiratan Machado, “alguns marmanjos também tinham seus álbuns” (2001, p. 112), e estes seguiam o mesmo padrão dos fólios femininos, compostos, basicamente de poemas líricos. Algumas vezes, porém, os poetas serviam-se de tais “encomendas” líricas para, no melhor espírito romântico, exacerbarem seu sentimentalismo, suas mágoas, suas frustrações e revoltas. Daí nasceram declarações de amor e ódio, ressentimentos, verdadeiras vinganças poéticas, e, aqui e ali, alguns álbuns tornaram-se registros da exacerbação passional dos românticos. Neste mesmo espírito, não deixariam de vir à tona tiradas chistosas e pilhérias, em versos brincalhões e satíricos nos álbuns, sobretudo nos dos rapazes que os colecionavam. Assim agia, por exemplo, Luiz Gama, que parecia não gostar muito do hábito, e costumava responder os pedidos para álbuns com burlas desse tipo:

Ora que, porque quer, o meu amigo,
O perluxo e dengoso Zé Maria,
Que eu mil versos troveje, retumbante,
Num álbum que possui, só de mania!
Não vê nem pensa
O caro amigo
Que a musa esquiva
Não toma abrigo,
No teso crânio
De um mau tarelo,
Que por miolos
Só tem farelo! (2000, p. 147)

Um quadro sucinto do que foram os álbuns pode assim ser resumido. Mas como seria um “álbum” que fugisse às convenções e aos padrões de então? Um “álbum” essencialmente satírico, cujo humor se concentra na licenciosidade e na escatologia; um “álbum” feito sob encomenda de um mesmo “requerente”, seu próprio autor; um “álbum” preparado, então, para um público exclusivamente masculino, “proibido” para iaiás e senhoras; um “álbum” não exclusivo e manuscrito, mas editado para ser posto à venda; um “álbum” que, enfim, merece as aspas que lhe estão sendo dadas. Foi este o Álbum da Rapaziada, publicado em 1864 por Francisco Moniz Barreto!



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Fonte:
Leonidas Pellegrini: "Album da Rapaziada : o humor obsceno de Francisco Moniz Barreto" (Dissertação de Mestrado apresentada ao Instituto de Estudos da Linguagem, da Universidade Estadual de Campinas, para obtenção do Título de Mestre em Teoria e História Literária Orientador: Dr. Luiz Carlos da Silva Dantas). Campinas, 2008.

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