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A Morte do Palhaço, de Raul Brandão
Na
contramão do cânone, História dum Palhaço rompe com a narração
tradicionalmente estruturada para, a partir de então, mostrar-se como texto que
é, ele próprio, edificado sobre escombros e destroços, para se revelar uma obra
literária em que o palhaço emerge como arauto que anuncia uma história – numa
visão finissecular – incessantemente em ruínas. Por fim, em “Quando os vencidos
saem às ruas”, o foco da análise repousa sobre os três volumes das Memórias,
texto em que “confessamente o Autor se desdobra” (COELHO, 1996, p. 296),
iluminando a si e aos outros como personagens de uma história cujo objetivo
constituiu-se em evidenciar o papel dos homens e das mulheres de um Portugal,
sobretudo nas cidades do Porto e de Lisboa, que se levantam, frenéticos e
atônitos, contra o stato quo da monarquia, da corrupção, da dominação
das classes abastadas. É o ser esfarrapado que se torna o agente de uma outra
história e que assume a posição de legítimo protagonista, tanto nas Memórias
quanto nas demais narrativas em análise nesta investigação. É, portanto,
pelos meandros da literatura que o escritor faz falar os que foram emudecidos
no processo de dominação.
[...]
Ao
dizer que a escritura de Raul Brandão possui a capacidade de perscrutar, de
investigar as almas, o missivista aponta para a perspectiva psicológica da
narrativa brandoniana, em que constrói personagens plenos de conflitos,
emparedados entre a dor (o real) e o sonho (o desejo). Não é justamente esta a
tônica da História dum Palhaço de 1896? Não reside neste texto
caracteristicamente finissecular uma espécie de testamento ou legado literário
da geração de 1890, da qual o escritor da Foz do Douro fez parte e na
qual
se formou? Há no arquivo de Brandão missiva datada de 10 de novembro de 1926,
portanto alguns meses após a carta apresentada anteriormente. O documento foi
redigido por Justino de Montalvão na esteira da edição refundida da História
dum Palhaço e, da mesma forma, apoiada ainda nas edições que eclodiram
nesse ano particularmente profícuo para o escritor.
Justamente
ando a acabar de escrevinhar uma imensa papelada que te diz respeito. Imagina
tu que comecei (como sabes) por fazer o prefácio para a Morte do Palhaço que
te tinha anunciado. Mas de tal modo foi inchando, inchando que em vez dum
prefácio dá um livro. Nesse livro, que tenho quase pronto – em vez de tratar só
da tua obra , comecei a meter tudo o que me vinha à mente [,] tudo o que me
vinha vindo à cabeça sobre a nossa mocidade. E de tal maneira a imaginação foi
tecendo, tecendo... [...] Vou pois publicar um livro (um volume de cerca talvez
de 150 páginas) junto ao que tinha primeiro escrito com a intenção do prefácio
– toda a história pitoresca da nossa geração, com este título genérico “Os
Insubmissos”. Será uma série da qual o primeiro é o volume em que falo de ti. O
segundo será referente ao Nobre, etc.
A
carta é bastante longa para ser transcrita na íntegra. O que se continua a
observar nas páginas que seguem é como a narrativa de História dum Palhaço continua
a ecoar nas produções seguintes de Raul Brandão e como o texto em destaque é
peça-chave para a leitura da poética brandoniana. Guilherme de Castilho (2006)
considera-a uma obra de transição, vista ainda desta forma pela crítica de
reabilitação. Vitor Viçoso debruça-se sobre ela, na perspectiva de uma
narrativa decadentista, em cujo interior desnuda-se “certa falta de coerência
ou de lógica organizativa, parecendo, por vezes, mais uma desconexa acumulação
de textos – uma coleção de ‘papéis’ escritos ao sabor de inspirações
momentâneas” (1999, p. 157).
Vista
sob esse prisma, a refundição de 1926 efetua outra estruturação interna (que,
afinal, não é tão diferente assim nas duas edições da obra), mas não se
encarrega de lhe conferir outra roupagem que não a de papéis colados, numa
espécie de narrativa anárquica, que tem em seu bojo a proposta do trapo, do
fragmento, do desequilíbrio, do desajuste, da própria ruína materializada
textualmente. No entanto, para que se possa ler História dum Palhaço por
esse viés é preciso revestir-se de um intuito que se afaste da preocupação
estrutural e buscar cada vez mais outros olhares a partir da escritura
brandoniana. Volto, portanto, à pergunta lançada anteriormente: qual o papel
conferido ao arquivo de Raul Brandão no interior desta pesquisa? O texto que se
construiu até este passo parece ser a própria resposta: ser suporte, ser ponte,
fonte que fecunda e enriquece o estudo do texto.
---
Fonte:
Fonte:
Otávio
Rios Portela: “De trapeiros e vencidos: efabulação e história em Raul Brandão”.
(Tese de Doutorado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Letras
Vernáculas da Universidade Federal do Rio de Janeiro como quesito para a
obtenção do Título de Doutor em Letras Vernáculas - Literaturas Portuguesa e
Africanas. Orientador: Profa. Doutora Luci Ruas Pereira). Rio de Janeiro, 2012.
Disponível em: http://www.letras.ufrj.br/
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