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Entre dois modus vivendi: arcaísmo e modernidade em Turbilhão
Interessante notar que o enredo
de Turbilhão frustra, em certo sentido, as expectativas do leitor que espera
ver, no romance, a transposição do que, na maioria dos casos, ocorre com as
moças que, àquele tempo, resolviam traçar os rumos do seu destino fora da
rotina do casamento ou da vida religiosa. Nesse sentido, até certo ponto,
Violante, na medida em que é caracterizada como uma moça bela e tola,
sonhadora, que passava os dias sorridente, debruçada à janela, configura-se,
aparentemente, como uma moça que se dará mal após ter fugido com um homem, pois
seria desvirginada e perderia, assim, a honra e o respeito. Engano: ela não
fugira por amor, mas por um desejo de ascensão socioeconômica e por uma sede de
liberdade, de ser dona de seu destino, mesmo que a contrapartida disso fosse a
perda de sua suposta honra.
Outro ponto interessante é que
Paulo, ao ver a irmã envolta em luxo e riqueza, prontamente deixa de julgar a
atitude dela como inerente a de moças sem juízo: ela passa a representar o
modelo de audácia e coragem de que ele mesmo se julgava incapaz. Além do que,
algum dos figurões com quem ela mantinha contato poderia, mesmo, “arranjar-lhe
alguma colocação...” (p. 102).
Talvez, se tivesse sido publicado
cem anos antes, o enredo do romance poderia ser taxado de inverossímil. Mas, no
Rio de Janeiro de meados do século XX, uma cidade que vivia a Belle Époque e que começava a se
modernizar em ritmo acelerado, já é perfeitamente cabível que uma moça, mesmo
às custas da “honra” de seu nome, possa traçar, por si mesma, os rumos de sua
vida.
A respeito das transformações que
a capital fluminense – e, à época, capital
do país – passava, José G. V. de Moraes, em seu Cidade e cultura urbana na primeira
república (1994), registra aspectos responsáveis pelas mudanças inerentes ao
modo de vida dos habitantes das cidades, quais sejam as transformações modernizadoras
pelas quais os aglomerados urbanos passavam. O autor afirma que não só o espaço
físico se transformava, mas também a mentalidade, os modos de agir e as
concepções morais.
Desse modo, as personagens de
Turbilhão plasmam, se não uma reabilitação, ao menos um novo olhar sobre o que
é considerado como mundanismo e amoralismo numa sociedade que, embora cada vez
mais afeita aos contornos de um modus
vivendi cosmopolita, afinado com a modernidade, ainda se deixa marcar por
estruturas arcaicas, típicas de uma civilização de molde e extração patriarcais
e conservadores, controlada por uma oligarquia baseada na economia rural. Nesse
sentido, as personagens do romance são modernas e individualistas, mas convivem
numa sociedade que, mesmo em transformação, ainda é controlada por códigos de
honra e de boa conduta – principalmente para as mulheres –, uma vez que toda
sociedade de cunho patriarcal sempre cobra mais das mulheres do que dos homens.
De um ou de outro modo, as
personagens de Turbilhão, vivendo um verdadeiro turbilhão de transformações,
são egocêntricas e fortes: ousam romper códigos, ousam ser o que realmente
querem ser. E nisso também reside a grandiosidade desse romance.
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Fonte:
Fonte:
Rafael Ferreira Campos Mendes
(Bolsista PIBIC/UEG) / Ewerton de Freitas Ignácio (pesquisador-líder): “Entre
dois modus vivendi: arcaísmo e modernidade em Turbilhão, de Coelho Netto”. Anais
do VIII Seminário de Iniciação Científica e V Jornada de Pesquisa e
Pós-Graduação - Universidade Estadual de Goiás. Disponível em: http://www.prp.ueg.br/
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