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Tropas e Boiadas, de Hugo de Carvalho
Hugo de Carvalho Ramos nasceu em 21
de maio de 1895, em Vila Boa, então Capital do Estado de Goiás. Iniciou seus estudos
na cidade natal e depois foi para o Rio de Janeiro, onde, em 1916, matriculou-se
na Faculdade de Ciências Jurídicas e Sociais. Em 1917, publicou Tropas e Boiadas,
que representa hoje a face da literatura goiana com maior destaque. Em 1920, estando
prestes a concluir seu curso jurídico e, em crise de depressão, viaja ao interior
de Minas Gerais e São Paulo. Em 31 de março de 1921, quando retorna ao Rio de Janeiro,
suicidou-se, enforcando-se com uma corda de rede.
Assim, a identidade que Hugo nos apresenta
do goiano é aquela com a qual ele conviveu. Sendo goiano de nascimento, pode perceber
de perto as características do sertanejo e apresentá-las através de sua literatura,
solidificando um regionalismo. Ainda nos primórdios do século XX, Hugo de Carvalho
Ramos já adiantava traços da literatura regionalista que apareceria na década de
30. Assim, em seu projeto ideológico, ele apresenta-nos um sertanejo com sua face
produtiva e, ao mesmo tempo, denunciando sua condição de vida, como bem salienta
as palavras de Vicentini (1997, p.45-46)
(...) quando elabora a dualidade da
autenticidade de um tipo de homem do sertão e a inautenticidade de outro, ideologicamente
ele escolhe, seleciona. E, ao selecionar, aponta para o tipo de imagem que ele quis
construir do sertão: imagem de um sertão economicamente viável, construída sobre
a do sertanejo produtivo, o tropeiro, o boiadeiro e não sobre o roceiro.
É neste sentido que a identidade criada
por Hugo é a identidade de um sertanejo produtivo e diferenciado por seu trabalho.
As atividades exercidas por este sertanejo são importantes, sobretudo, para o desenvolvimento
econômico do centro-oeste goiano. Por isso, em nosso recorte de estudo lexical preferimos
destacar e enfatizar palavras relativas às atividades profissionais, já que esta
atividade se destacou na identificação deste homem do sertão na literatura goiana.
É também através desta identificação
lexical que poderemos identificar práticas culturais específicas do sertanejo. Observando
com cuidado os elementos apresentados nas narrativas podemos perceber que o autor
procura difundir e registrar um modo de ser, marcado no meio cultural do interior
goiano. Assim, acreditamos que explorar tal vocabulário sistematicamente seria uma
forma de conhecer melhor as palavras e expressões referentes ao trabalho profissional
no meio rural, uma vez que língua é o reflexo desta complexidade social, como bem
observa Coelho (2005, p.22),
(...) refletindo a complexidade mesma
de que são constituídas as pessoas e o universo em que elas existencializam as suas
experiências, uma língua não poderia ser um sistema semiológico simples, fechado
em si mesmo e de limites estreitos.
A identidade apresenta-se, portanto,
como um paradoxo, pois ela é, simultaneamente, o que é semelhante e o que é diferente.
Ela oscila entre o semelhante e o diferente, o que faz do indivíduo um ser singular
e ao mesmo tempo semelhante a outros. Assim, a construção da identidade é um processo
dinâmico, influenciado por múltiplos fatores sociais. A identidade social caracteriza-se
pela pertença do indivíduo a um grupo sexual ou gênero, grupo etário, classe social,
etnia, nação, grupo religioso etc. É ela que permite ao indivíduo pertencer-se a
um grupo social e ser referenciado pelos outros como membro daquele determinado
grupo, através da depreensão dos valores, hábitos, formas de trabalho deste grupo.
Assim, adquirir os costumes de um grupo é uma forma de se firmar como membro daquele
grupo. Participar das conversas ao final da tarde, no paiol de milho, por exemplo,
é uma forma do indivíduo se legitimar como um sertanejo autêntico, já que estas
prosas eram um costume diário do sertanejo, como observamos nesta passagem:
Não era preciso tanto cuidado, agradeceu
meio confundido. Tomou-lhe a bênção rápido, cumprimentou a moça e foi despedir-se
do pessoal da casa, àquela hora, como de costume, reunida no paiol de milho, em
comentários ao acaso do dia. (RAMOS, 1986, p. 122).
Destaca-se também o fato de pedir a bênção ser
uma atitude comum entre os sertanejos, demonstrando uma ligação forte com a religiosidade.
Além disso, as rezas de terços, seguidos de procissões em
volta do curral era uma forma de manifestar a cultura deste povo e, consequentemente,
realçar mais um traço de sua identidade de povo simples, ligado a tradições religiosas
do local.
A cultura é o conjunto de atividades
e modos de agir, costumes e instruções de um povo. É o meio pelo qual o homem se
adapta às condições de existência transformando a realidade. É um processo em permanente
evolução, diverso e rico. É o desenvolvimento de um grupo social, uma nação, uma
comunidade, fruto do esforço coletivo pelo aprimoramento de valores deste grupo.
É o conjunto de fenômenos materiais e ideológicos que caracterizam um grupo étnico
ou uma nação (língua, costumes, trabalhos, rituais, culinária, vestuário, religião,
etc ), estando em permanente processo de mudança.
Falar de cultura é compreendera humanidade
em toda a sua riqueza e toda a sua forma de existência. A cultura expressa o que
une e o que diferencia os agrupamentos humanos. A manifestação cultural se faz muito
importante para aqueles que a vivem, pois é através dela que um grupo social expressa
sua existência. Assim, é necessário conhecer a realidade de um povo para compreender
as práticas culturais e para que estas práticas façam sentido.
Há variações nas maneiras de praticar
o trabalho e cada grupo humano o pratica de acordo com suas necessidades. Isto é
uma manifestação cultural, uma vez que caracteriza um povo, diferenciando-o de outros
grupos humano. É neste sentido que, como já salientamos, a identidade se constrói
na oposição e na relação de práticas culturais diferenciadas.
O estudo da cultura de um povo contribui
para combater o preconceito e para conhecer e dar sentido às diferentes relações
humanas. Somente a partir do conhecimento dos costumes e valores criados por determinado
grupo será possível compreender o sentido e valorizar tais manifestações naquele
contexto específico. Os contos de Tropas e Boiadas retratam de forma intrínseca
a vida social goiana e a natureza, recriando uma realidade verossímil, perfeita,
reconhecível, possibilitando ao leitor o conhecimento dos valores de um povo. Há
um trabalho com as palavras que contribui ainda mais para que o leitor possa depreender
a cultura do sertanejo. Assim é que, por exemplo, ao se referir a uma mala de couro
cru, para levar em viagem a cavalo, o narrador utiliza o termo “bruaca”, apresentando-nos
aquela realidade, como podemos observar no trecho:
O cabra, atentando na lombeira da
burrada, tirou dum sorrãozito de ferramentas, metido nas bruacas da cozinha, o chifre
de tutano de boi, e armando duma dedada correu todo o lote, criando aqui uma pisadura
antiga... (RAMOS, 1986, p.31)
Assim, a cultura nos fazer enxergar
a nós mesmos como seres sociais, na relação com as diferenças e semelhanças. As
discussões sobre cultura podem nos fazer pensar sobre nossa própria realidade social.
Cada grupo social organiza e transforma a vida em sociedade para superar os conflitos
e obstáculos diários. Cada cultura é resultado de uma história particular, de necessidades
particulares e nisto podemos incluir o contato com outras culturas.
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Fonte:
Cristiano Curtis Eliassim e Braz José Coelho: “identidade, cultura e linguagem – léxico relativo às atividades profissionais em Tropas e Boiadas, de Hugo de Carvalho Ramos”. Universidade Federal de Goiás – Campus Catalão. Anais do SILEL. Volume 3, Número 1. Uberlândia: EDUFU, 2013, disponível em: http://www.ileel2.ufu.br/
Fonte:
Cristiano Curtis Eliassim e Braz José Coelho: “identidade, cultura e linguagem – léxico relativo às atividades profissionais em Tropas e Boiadas, de Hugo de Carvalho Ramos”. Universidade Federal de Goiás – Campus Catalão. Anais do SILEL. Volume 3, Número 1. Uberlândia: EDUFU, 2013, disponível em: http://www.ileel2.ufu.br/
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