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O
Matuto e Lourenço: irmãos
de O Cabeleira
Prometido
no final da carta-posfácio a O Cabeleira, o romance O Matuto é
publicado dois anos depois do primeiro, continuando a série Literatura do
Norte. Na carta-prefácio, o autor explica que a obra é fundamentada no
argumento histórico da Guerra dos Mascates e que já teria a sua continuação
concluída, a qual viria a público com alterações e acréscimos, somente em 1881,
com o título de Lourenço. Junto com a produção de O Matuto,
Távora teria escrito, ainda, uma carta na qual examina as objeções “de amigos e
inimigos” à sua
campanha literária. Esta fica reservada para mais tarde, juntamente com a
publicação de Lourenço:
Nessa carta, além de
examinar as objecções, estudo á luz do criterio historico, que me pareceu mais
natural e justo, a rebellião da nobreza e posteriormente a dos mercadores em
Pernambuco a qual trouxe a guerra que passou á história com o nome de – Guerra
dos Mascates.
Para encurtar tempo e
diminuir paginas deixo a carta na gaveta com a continuação, já prompta, da
presente historia.
Si me resolver, sahirão a
lume os dois escriptos na mesma occasião que, segundo suspeito, não tardará
muito.
O terceiro romance da Literatura
do Norte sai três anos depois do segundo, na Revista Brasileira, mas
não se tem notícia da referida carta crítica.
O Matuto deixa mais um sinal de que as idéias literárias de Franklin Távora
permaneciam no encalço das empreitadas romanescas de José de Alencar. À época
da primeira publicação das Cartas a Cincinato, o autor de Iracema teria
se empenhado na produção de mais um “romance histórico”, que novamente se vale da
pesquisa nas “fontes do passado”, embora elas nunca fossem suficientemente
reconhecidas pelo rival. Certamente sem acaso ou coincidência, este romance,
levado aos prelos em 1871 e saído em 1873, recebe o título de Guerra dos
mascates. Na nota que encerra o primeiro volume da obra, Alencar frisa
exatamente o aspecto que a diferencia dos seus outros romances, cujo conteúdo
teria sido “fornecido pela imaginação”:
É o Til desses livros
que se compõem com material próprio, fornecido pela imaginação e pela reminiscência;
e que portanto se podem escrever em viagem, sobre a perna, ou num canto da mesa
de jantar.
Não sucede o mesmo com um
romance histórico, e ainda mais em nosso país onde as fontes do passado nos
ficaram tão escassas, senão muitas vezes exaustas.
Para
descrever a nossa sociedade colonial é necessário reconstruí-la pelo mesmo
processo de que usam os naturalistas com os animais antediluvianos. De um osso,
eles recompõem a carcaça, guiados pela analogia e pela ciência.
Diferentemente de Til,
tipo de ficção imaginativa que se poderia escrever “sobre a perna”, a Guerra
dos mascates exigia lupa investigadora do autor, digna de um “naturalista”
amparado pela precisão da ciência. Como uma sutil resposta de Alencar aos
ataques das Cartas, a nota desculpa o livro como “inocente” em suas
imperfeições e encerra um comentário sugestivo a respeito da imprensa,
qualificada como um “gênio do bem e do mal”.
O mesmo episódio histórico
tratado por Alencar serve de tema para o segundo romance da Literatura do
Norte. Nesta obra, a “crônica pernambucana”, melhor vinculada à trama
ficcional, conjuga-se ao enredo de forma a se misturarem personagens inventados
e vultos históricos com maior coesão e conveniência, sem danos ao fio conectivo
antes descuidado na história do bandido José Gomes e percebido pela primeira
recepção crítica.
Lourenço,
um dos protagonistas de O Matuto, que depois dará título à sua
continuação, é, como o Cabeleira, uma espécie de “herói abortado”, no entanto,
inteiramente fictício. Além disso, possui uma diferença fundamental em relação
àquele: trata-se do exemplo de um indivíduo de maldade natural que é salvo pela
educação, ao contrário do cangaceiro de índole boa, mas mal encaminhado. Este
personagem, também envolvido pela atmosfera mística dos valentes e fortes, qual
feras selvagens, é convincentemente infiltrado no conflito histórico entre a
“nobreza” dos engenhos olindenses e os negociantes portugueses de Recife,
chamados “mascates”. Trata-se do período histórico em que começam a se
desenvolver as atividades urbano-comerciais por meio do promissor porto
recifense e a decair a agricultura açucareira em virtude da concorrência
internacional. Neste processo de transformações econômicas, os mercadores
portugueses tornam-se cada vez mais numerosos em Recife, o que vai
caracterizando o povoado progressivamente como centro comercial a ponto de
elevá-lo à categoria de vila, desligada da subordinação à Olinda. Todos esses
fatores geram disputas de natureza política e econômica entre senhores de
engenho e comerciantes, que resultam na insurreição que ficou conhecida como a Guerra dos Mascates (1709-1711). A
interpretação de Távora transforma o argumento histórico, no romance, em um dos
primeiros e grandes enfrentamentos antilusitanos no Brasil, que confere aos
senhores de engenho pernambucanos o papel de pioneiros insurgentes pela
independência. A patente simpatia por esta aristocracia rural e pelas relações
pessoais e de trabalho da sociedade patriarcal açucareira estão em acordo com a
tese de um Nordeste positivamente “tradicional”, da região que conserva um
passado definidor do caráter brasileiro. Esta tese será depois desenvolvida na
obra sociológica de Gilberto Freyre, o qual, distanciado das teorias racistas
que nortearam Sílvio Romero, também atribuirá importância fundamental à
contribuição africana na cultura brasileira.
[...]
Como antes comentamos, esta
continuação se realiza com o folhetim Lourenço, na Revista Brasileira,
em 1881. Com O Cabeleira e O Matuto, o romance compõe uma
trilogia de narrativas com cenários, informações históricas e personagens muito
semelhantes. A temática apresentada nos dois primeiros livros, edições que são
custeadas pelo autor e não ultrapassam os 500 exemplares, é aparentemente mal
recebida pelo público. Talvez por isso, o autor revisa o manuscrito de Lourenço
tentando agradar o gosto dos leitores:
Esta crônica, pronta há mais
de dois anos para seguir em volume o Matuto, cujo é conclusão lógica e
natural, acaba de sair a lume na Revista Brasileira, a que dedico afetos
de natureza paternal.
Mudando-se
o plano da publicação, tive por necessário adaptar o trabalho aos leitores da Revista,
que eu não podia presumir fossem absolutamente os mesmos do Matuto. Fiz
por isso muitas alterações neste manuscrito. Aumentei informações e minúcias,
reproduzi idéias inúteis no primeiro caso, indispensáveis no segundo. Quem ler
agora o Matuto e o Lourenço notará algumas repetições. É certo, porém, que, na
leitura, pode ser este desacompanhado daquele. Pelo que respeita às repetições,
passará as vistas por cima delas o leitor benévolo, sem enxergar matéria para corpo
de delito contra o autor, atentos os motivos explicados.
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Fonte:
Fonte:
Cristina Betioli Ribeiro: “um norte para o romance brasileiro: Franklin Távora entre os primeiros folcloristas”. (Tese apresentada ao programa de Teoria e HistóriaLiterária do
Instituto de Estudos da Linguagem (IEL)da Universidade Estadual de Campinas
(UNICAMP),como requisito para obtenção do título de Doutor emTeoria e História
Literária, na área de LiteraturaBrasileira. Orientadora: Prof.ª Dr.ª Márcia Azevedo
de Abreu). Instituto de Estudos da
Linguagem. Unicamp – FAPESP - Campinas / 2008
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