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O Matuto e Lourenço: irmãos de O Cabeleira
Em
outros tipos de circunstância, quando fora do contexto político e na condição
de “cavaleiro errante” do sertão, Lourenço também entoa com freqüência versos
da memória popular pernambucana, semelhantes às quadras registradas n’ O
Matuto. A tradição oral, portanto, além de representar uma das vozes da
história do Brasil, como se viu n’ O Cabeleira, desempenha o papel de
arte poética genuinamente nacional, capaz de aflorar da alma de um povo
completamente integrado à natureza e à vida “primitiva”. Os momentos de
evocação desta “musa popular”, intrínseca ao cotidiano dos matutos, podem ser
quaisquer que demandem a expressão dos seus sentimentos mais íntimos e
impetuosos: situações de guerra, de solidão, de amor, de vingança, de festa.
Assim, a poesia popular acompanha o cotidiano do povo, aqui representado pelos
sertanejos almocreves, de modo a constituir um dos elementos etnográficos
explorados no projeto de ficção nacionalista de Távora. As relações entre
natureza, cultura popular e homem do campo, neste caso, expressam novamente o
“naturalismo sertanejo” desenvolvido pelo autor, isto é, as ações específicas
do meio semi-selvagem sobre o mestiço rústico, a essência “arqueológica” da
poesia brasileira e os aspectos fisiológicos do sertanejo.
O
desfecho do conflito entre “nobres” e mascates, que sempre se mantém no segundo
plano da narrativa, dá-se antes mesmo que ecloda novo levante da população e
das forças armadas. Em tempo de evitá-lo, a Coroa concede perdão aos “nobres”
que são liberados das prisões e condenações.
Afetado
até o fim pela sua essência brutal, Lourenço ainda dá mostras de sua má índole.
Marianinha, que se manteve apaixonada pelo matuto desde a primeira vista,
quando insiste em se colocar como obstáculo entre ele e Damiana, é ferida pelo
rapaz com uma facada, em um acesso de raiva. Diante deste acontecimento, a
menina ferida e sua mãe Joaquina se afastam da família de Marcelina. Depois de
comemorado o positivo desfecho dos conflitos políticos para os “nobres”,
Lourenço tenta uma reaproximação com Marianinha. As famílias, que festejam o
retorno de Francisco, harmonizam-se, mas a rapariga recusa o pedido de
casamento do jovem sertanejo. Em sinal de remorso e nobreza de intenções, ele
oferece as terras que lhe foram doadas pelo padre Antonio à Marianinha,
considerando o ato um meio de desfazer a má impressão que a ex-pretendente
guarda dele. Semelhante ao personagem Arnaldo, de José de Alencar, o sertanejo
abandona a possibilidade de procurar por Damiana e prefere a liberdade de herói
desajustado, do que concretizar quaisquer laços amorosos. A narrativa se
encerra com a partida de Lourenço, seguida de elogios à virtude dos pobres do
campo:
Três
dias depois, quando os galos começaram a amiudar, Lourenço montou a cavalo à
porta do sítio do Cajueiro, Francisco e Marcelina, de pé, do lado de fora,
viram-no partir, viram-no desaparecer, ouviram ambos, com as faces inundadas em
lágrimas, os últimos ruídos dos passos dos cavalos, que conduziam para bem
longe o melhor das esperanças, o melhor dos afetos daquelas existências tão
boas, tão dignas, tão irmãs, – daquelas existências tão ricas na sua pobreza,
tão grandes no seu pequenino mundo, tão nobres na sua humilde condição – dois
tomos de uma obra que se poderia intitular – Trabalho, bom senso e virtude.1
Desapegado
dos bens, dos amores, dos ressentimentos mal resolvidos e ainda da tutela
afetiva dos pais adotivos, o sertanejo deixa para trás a impressão memorável de
um homem forte, destemido e capaz de remediar a sua maldade com os ensinamentos
virtuosos de Francisco e Marcelina. Por esse motivo, ao contrário do que
acontece n’ O Cabeleira, é concedido ao herói o mérito de continuar
sendo um “filho da liberdade”107. O desfecho de Lourenço, com todos os horrores
que a guerra e as índoles perversas apresentam no romance, encarrega-se de
corrigir todos os personagens desvirtuados ou desonrados e assinala os
objetivos da obra, tão importantes quanto reafirmar a identidade nacional:
instruir e moralizar. Para garantir a repercussão da narrativa entre o público
amplo e os leitores especializados, depois de publicá-la em folhetim na Revista
Brasileira, o autor financia uma edição de 200 exemplares na Tipografia
Nacional, no mesmo ano de 1881.
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Fonte:
Cristina
Betioli Ribeiro: “um norte para o romance brasileiro: Franklin Távora entre os
primeiros folcloristas”. (Tese apresentada ao programa de Teoria e
HistóriaLiterária do Instituto de Estudos da Linguagem (IEL)da Universidade
Estadual de Campinas (UNICAMP),como requisito para obtenção do título de Doutor
emTeoria e História Literária, na área de LiteraturaBrasileira. Orientadora:
Prof.ª Dr.ª Márcia Azevedo de Abreu). Instituto de Estudos da Linguagem.
Unicamp – FAPESP - Campinas / 2008
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