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Os contos
Maria Amália, em sua ficção, pensa o papel feminino
relacionado à família. Os conflitos, dramas, alegrias e tristezas passam-se neste
ambiente. Em seus contos, não há mulheres na política ou nas universidades.
Suas narrativas analisam o cotidiano, são contos que retratam a sociedade por
um ponto de vista de mulher.
Sua escrita, por vezes, adquire tom de conversa ou de confissão,
o que aproxima o leitor, tornando fácil a identificação com a trama.
A obra ficcional de Maria Amália Vaz de Carvalho, no Jornal do Commercio do Rio de Janeiro, se
concentra entre os anos de 1870 e 1880. Retrata a família em todas as suas complexidades.
Os contos desta autora seguem a vida das mulheres do século XIX, no seu dia a dia, mostrando sutilmente como
encontravam saídas para sobreviverem em uma sociedade baseada no
patriarcalismo. Aponta as contradições e os conflitos sociais presentes.
Apresenta a sua versão para os dramas maiores que afetavam o viver das
mulheres.
Maria Amália hoje é uma autora estigmatizada. Suas
convicções, ao apoiar o papel da mulher na família como importante para o
equilíbrio social, são vistas como submissão às vontades dos homens. Entretanto,
se lermos com atenção a sua obra ficcional, devidamente contextualizada,
veremos as frestas existentes em favor das mulheres. O lugar que a sociedade
lhes destinava à época era dentro dos lares, ao lado dos seus maridos e filhos.
Tudo que fosse diferente disto era motivo de indignação. Portanto, era dentro
deste ambiente e consideradas tais circunstâncias que deveriam partir as
reivindicações por seus direitos.
Ela apoiava sim o lugar das mulheres em seus lares, não
queria a dissolução das famílias, pois, como católica e mãe – assim o supunha –
não poderia defender algo diferente. Entretanto, seus artigos e ficções apontam
seu desejo de mobilidade social e funcional das mulheres de seu tempo. Neles
lemos o sentimento conjugal tomando forma, mas com visíveis alterações nos
contratos entre pais e filhos; as mulheres buscando instrução e debatendo
igualmente com os homens questões filosóficas e literárias; e o combate à vida
fútil das moças.
Maria Amália tentava mostrar, através de sua ficção, o
retrato do que ela esperava ser uma família ideal, harmoniosa e colaborativa
entre seus membros. A mulher ocupando-se de tarefas domésticas e tendo a
clareza reflexiva para tomar decisões em conjunto com seu marido, criando seus
filhos de modo a que viessem frutificar em suas vidas e obtivessem sucesso.
Apoiando o papel familiar da mulher, a autora poderia transitar pelos assuntos
sobre os quais gostaria que a sociedade refletisse. E isto não dentro de
jornais ou revistas feministas estigmatizadas pelo preconceito, mas no interior
de periódicos respeitados no mundo masculino.
A sociedade liberal portuguesa da segunda metade do
século XIX se modificava intensamente e não era diferente com o universo
feminino. Convivendo com o novo e o tradicional, Maria Amália retratava estas
mudanças. Seguindo um fio condutor, que é a visão feminina, estudou as
modificações através de comportamentos e anseios e, através das narrativas
conseguiu retratá-las. Assim, a ficção lhe dava maior liberdade para transitar
por assuntos que, talvez, ela considerasse complicados de serem publicados em
artigos, como por exemplo, o adultério, a bastardia e
profissões das mulheres, que sustentavam a educação masculina.
As narrativas lhe conferiam um poder de introduzir assuntos espinhosos que
possivelmente estavam sendo ou podiam ser debatidos dentro dos lares.
Peter Gay afirma que a ficção é uma fantasia, uma
ilusão, na qual os indivíduos se veem, se imaginam e repensam suas vidas.
Conforme um romance, novela ou conto atinge um determinado número de circulação
satisfatória, ele passa a ser debatido de forma mais intensa e o assunto entra
na sociedade mais facilmente:
O que quer que sejam e o que quer
que façam, sejam elas conscientes ou inconscientes, as fantasias se situam no
limiar entre a imaginação pessoal e a coletiva, e servem como ponte entre elas.
Isso se aplica com mais verdade à ficção, que consiste em fantasias
disciplinadas, ordenadas e embelezadas. […] Os impulsos e as ansiedades do
indivíduo fornecem a energia, mas é a cultura que fornece as matérias-primas
para as fantasias, arquitetadas de acordo com requisitos estéticos. O que faz
das fantasias um material histórico tão rico é, em grande parte, o fato de não
serem simplesmente fantásticas.
Os romancistas e os críticos
literários do século XIX tinham noção de tudo isso. (GAY, 2000, p. 124)
Seja como for, a ficção pode ser um retrato da
sociedade, mas pode ser também uma preparação para algo que ainda está por vir.
Os contos de Maria Amália não eram fantasiosos em nenhum
aspecto. Apenas tratavam do universo a que a mulher estava condicionada naquela
época. O que os diferencia é o foco nos percalços a que as mulheres, via de
regra, estavam sujeitas, seja através de amores impossíveis, impedimentos
legais ou complicações financeiras; como se portavam e como saíam ou não de
certas situações embaraçosas.
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Fonte:
Fonte:
Bianca Santos Coutinho dos Reis: “Cérebros
e Corações”: a ficção de Maria Amália Vaz de Carvalho no Jornal do Commercio,
do Rio de Janeiro”. (Dissertação apresentada como requisito parcial para a
obtenção do título de Mestre, ao programa de Pós-Graduação em Letras, da
Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Área de concentração: Literatura
Portuguesa. Orientador: Prof. Dr. Sérgio Nazar David). Rio de Janeiro, 2012.
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