10/11/2013

Machado de Assis por seus Contemporâneos

 Machado de Assis por seus Contemporaneos - Iba Mendes
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Três críticos, duas histórias


Três foram os principais críticos literários desse período de emergência do  ofício e, concomitantemente, da produção do sumo da obra machadiana, do final do  século XIX ao início do século XX: Araripe Júnior, Sílvio Romero e José Veríssimo.

Os  três  autores  enfrentaram  a  obra  de  Machado  de  Assis  com  coragem  intelectual  e  instrumentos  críticos  pouco sofisticados  (FERNANDES,  2001),  em  trabalhos circunstanciais ou sistemáticos. Araripe Jr. teceu suas considerações em  trabalhos  pontuais,  analisando este  ou  aquele  livro de  Machado,  quando  da  publicação; inicialmente,  procurou  nas  criações  do  escritor as evocações do        ethos nacional (VENTURA, 1991: 101), mas terminou por enveredar pelo impressionismo  crítico  e  render-se  aos  desafios  das  -  ainda  que  tênues,  segundo ele  -  relações  entre os personagens, situações e o característico da vida brasileira (GUIMARÃES,  2004: 275-8). Todavia, foi com Sílvio Romero e José Veríssimo que a análise crítica  da  obra  de  Machado  de  Assis  teve  um  tratamento amplo e  sistemático; também  produziram  críticas  pontuais,  de  circunstância,  mas  deram  –  ademais  -  um  tratamento intensivo ao autor  e  à  obra,  mormente  em  seus  trabalhos  críticos  de  maior  fôlego: suas  histórias  da  produção literária  brasileira,  ambas  nomeadas  História  da  literatura  brasileira,  publicadas  em  1888  (Sílvio  Romero) e  em  1916  (José Veríssimo).

As  histórias da  literatura  brasileira de  Sílvio  Romero  e  de José  Veríssimo  podem  ser  consideradas  as  mais  importantes  criações  do  gênero até  o início do  século  XX.  Até  então,  vários  autores  já  haviam  esboçado relatos  da  produção literária  brasileira,  dentre  os  principais,  alguns  autores  (estrangeiros) tomaram  a  literatura  brasileira  como  um  ramo da  literatura  portuguesa: M.  M.  Bouterwek  (alemão,  em  História  da  literatura  portuguesa,  de  1804),  Sismonde  de  Sismondi  (genebrino, Literaturas do meio-dia da Europa, 1819). Outros já identificavam certa  autonomia  da  produção  brasileira  e  mesmo  alguma  linha  de  criação,  como  Ferdinand  Denis  (francês,  Resumo da  história  da  literatura  de  Portugal,  1825) e  Ferdinand  Wolf  (austríaco,  O  Brasil  literário,  1863).  Os  brasileiros  também  se  empenharam  na  tarefa,  alguns  analisaram  somente  a  produção poética,  como  Norberto Silva  (“Bosquejo  da  história  da  poesia  brasileira”,  em             Modulações  poéticas, 1841), Gonçalves de Magalhães (“Ensaio sobre a história da literatura no  Brasil”,  na  revista Niterói,  1836); outros  abordaram  a produção literária  de modo  localizado, como Antonio Joaquim  de  Melo (Biografias de alguns poetas e homens  ilustres  da  Província  de  Pernambuco,  1858),  Antonio Henriques  Leal  (Panteon  maranhense,  1873) etc.  Outros  tantos  ainda  se  limitaram  a  juntar  biografias,  nomear um punhado de autores e, principalmente, enfileirar autores sem uma linha  de  análise  que  desse  coesão à  produção em  termos  de períodos,  escolas, estilos,  influências e relações com o país e suas condições histórico-culturais. Uma possível  exceção, apontada por José Veríssimo (1977: 130), seria Varnhagen - “o instituidor  da nossa história literária” - em sua monumental História geral do Brasil, de 1854,  e em Florilégio da poesia brasileira, ou coleção das mais notáveis composições dos  poetas brasileiros falecidos, contendo as biografias de muitos deles, tudo precedido  de  um  ensaio histórico  sobre  as  letras  no Brasil,  de  1850  (ROMERO,  1953;  VERÍSSIMO, 1977; CANDIDO, 1969; NUNES, 1998)

Sílvio  Romero  produziu  “a  primeira  visão  orgânica  das  nossas  letras”  (BOSI,  1997: 281; NUNES,  1998: 230),  sendo seguido por  Veríssimo  que,  aproveitando-se da experiência daquele, promoveu uma mais cuidadosa seleção e  organização dos autores conforme períodos e estilos. Escritas por críticos de ofício e  instrumental, as histórias de Romero e de Veríssimo distinguiam-se por abordar a  história  literária  brasileira  com  vistas  à  análise  e  síntese,  compor  uma  totalidade  orgânica a partir da imbricação de todos os seguintes componentes:

I  -  separação  da  literatura  brasileira  da  portuguesa,  concedendo  autonomia  -  ainda  que  restrita  ou  problemática  em  dado período ou  autor  -  à  criação cultural nacional;

II - menção a razoável número de escritores da literatura brasileira;

III  -  menção  a  autores  não  necessariamente  prosadores,  poetas  e  teatrólogos, mas cronistas, oradores, críticos etc.

IV - seleção e organização representativa dos autores;

V  -  organização  cronológica,  evolutiva  e  hierarquizada  em  termos  de  méritos literários e importância cultural;

VI - visão das obras e de seus autores alicerçada em instrumental teórico-crítico e canônico;

VII  -  disposição,  classificação e  agrupamento  dos  autores  de  modo a  organizá-los em períodos literários, escolas, estilos e fases (dos autores);  

VIII -  relação da produção literária com a vida social;

IX - visão totalizadora – orgânica - de modo a esboçar, ainda que de modo  incipiente,  uma  explicação do  processo de  formação  (criação,  evolução  e  autonomização) da literatura brasileira como complexo cultural particular.

No que se refere à obra de Machado de Assis, a importância das histórias  de Romero e Veríssimo na análise da produção do escritor fluminense reside no fato de  abordá-la,  de  modo  amplo  e  sistemático,  a  partir  de  um  instrumental  teórico-crítico  conforme  os  cânones  da  época  (obviamente  adaptados  à  realidade brasileira), gestados como coroamento do exercício crítico (‘amadurecido’) daqueles autores  e  imbricados  com  as  leituras  que  fizeram  da  evolução da  literatura brasileira  -  de  modo  a  inserir  a  obra  machadiana  no  que  consideravam  ser  seu lugar nessa evolução.

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Fonte:
Edison Bariani (Doutor em Sociologia pela UNESP, Araraquara-SP): "Machado de Assis e as críticas de José Veríssimo e Sílvio Romero"
http://www.achegas.net

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