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Candide
A razão suficiente, no
sistema filosófico alemão, é o princípio segundo o qual nada acontece sem que
haja uma causa ou ao menos uma razão determinante. Assim, para cada
acontecimento, situação ou condição, há uma razão que os justifica como o que
de melhor poderia haver, simplesmente porque Deus o quis, portanto, não poderia
haver nada melhor. Tal assertiva equivale a afirmar que, malgrado o predomínio
da miséria humana reinante no mundo, a qual condena o homem a situações
degradantes, este, ainda assim, continua a ser o melhor dos mundos possíveis,
enfim, um otimismo exacerbado ridicularizado por Voltaire. No conto filosófico Candide,
o princípio preconizado por Pangloss, e uma das principais personagens, é o da razão
suficiente, preceito vulgarizado por Voltaire através do aforismo le
meilleur des mondes, na esteira da filosofia de Leibniz.
Tal otimismo conferiu a Candide
o status de texto moderno e atual, uma vez que o otimismo e as teses
providencialistas estavam então no centro das discussões. Por outro lado, os
anos que precederam a redação do conto foram marcados por uma grande admiração
pela ciência em geral e particularmente pelas teorias de Newton, as quais
tiveram, na França, Voltaire como grande divulgador. Este, contrário à
filosofia de Leibniz, cujas pesquisas lhe foram transmitidas por Frederico da
Prússia, em 1736, sustenta que ideias, conceitos e a filosofia sejam ancorados
no cotidiano e no material, ou seja, isentas de certo metafisicismo, a exemplo
da filosofia leibniziana, que propõe o estudo do ser e da realidade vinculados
às causas primeiras e aos primeiros princípios. Prova disso vem do próprio
Voltaire que, em 1753, ao se instalar em Ferney, escreve para Mme Denis: “Il
est bien doux d’être dans sa Maison, de la construire, de l’arranger.”
Os acontecimentos
de novembro de 1755 fazem com que Voltaire se insurja contra a indiferença e a
insensibilidade da filosofia aos fenômenos naturais que, de forma trágica,
transtornam o espírito e a vida dos homens. O horror da Guerra dos Sete Anos,
que eclode em 1756, também lhe perturba o espírito. Em correspondência à
condessa de Saxe-Gotha (22.1.1757), não se contém e alfineta: “Que d’horreurs,
madame, et que le meilleur des mondes possibles est affreux.”
Nota-se, após os
acontecimentos, Voltaire aterrorizado e pronto a reconsiderar toda a visão de
mundo que recebera até então, razão pela qual se aflige, se indigna, questiona
e se revolta. Não lhe concebe a ideia de que tragédias e crimes sejam
necessários à busca da perfeição e à moral, porque delas resultariam um bem
maior. Candide é fruto de um momento de rupturas e de desilusões. O
ceticismo do gênio de Ferney, diante de um mundo pleno de ideias imobilistas,
tal qual as de Leibniz, é direcionado para a literatura, donde Candide,
um compêndio - ainda que paródico, contra todas as formas de opressão,
obscurantismo, intolerância, barbárie e fanatismo.
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Fonte:
Dirceu Magri: “Aspectos da presença de Voltaire nas crônicas machadianas”. (Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Língua e Literatura Francesas do Departamento de Letras Modernas da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, para obtenção de título de Mestre em Letras. Orientador: Prof. Dr. Gilberto Pinheiro Passos Este trabalho contou, ao longo de dois anos, com bolsa concedida pela CAPES). São Paulo, 2009.
Fonte:
Dirceu Magri: “Aspectos da presença de Voltaire nas crônicas machadianas”. (Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Língua e Literatura Francesas do Departamento de Letras Modernas da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, para obtenção de título de Mestre em Letras. Orientador: Prof. Dr. Gilberto Pinheiro Passos Este trabalho contou, ao longo de dois anos, com bolsa concedida pela CAPES). São Paulo, 2009.
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