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Terra portucalense
A terra chamada portucalense era conhecida com este nome desde o meado do século XI. Tinha por limites ao norte o rio Minho, e ao sul o Mondego, conquanto as armas cristãs já tivessem por mais do que uma vez chegado ao Tejo, e mesmo tomado Lisboa, como fica dito. Lamego, Viseu e Ceia eram as terras mais consideráveis da fronteira oriental. Ao sueste acabava o território na serra da Estrela, e ao oeste no oceano.
O
distrito de Coimbra ou condado colimbriense, começava no Douro, e acabava no
Mondego. Um moçárabe da Beira, chamado Sesnando, deixara o serviço do emir de
Sevilha Ibn-Abed, e fora propor ao rei Fernando Magno a conquista deste
território. A tentativa foi coroada de êxito feliz, e Sesnando recebeu do
soberano leonês o governo desta nova província, acrescentada com a terra
portucalense ao sul do Douro.
Esta
região desde o Douro até ao Mondego, não era a Lusitânia de Strabão, a qual
chegava até ao mar no norte e no ocidente, e ao Tejo pelo lado do sul; nem tão
pouco se pode confundir com a Lusitânia do imperador Augusto, divisão
geográfica limitada ao norte pelo Douro, e ao sul pelo Guadiana. Era uma região
conquistada, reunida e disposta pelos incansáveis pelejadores cristãos.
Estávamos
tão acostumados a dar a Portugal o nome de Lusitânia, e a tomarmos a
denominação latina de lusitanos, que chegamos a julgar-nos decaídos do
esplendor genealógico da nossa raça, quando o sr. Alexandre Herculano escreveu
que só no século XV tínhamos começado a usurpar essas qualificações. Parece que
foi em 1481, diante da santidade de Sixto IV, que o bispo de Évora D. Garcia de
Menezes deu pela primeira vez o nome de lusitanos aos habitantes de Portugal.
Até então fôramos sempre portucalenses desde tempos remotíssimos.
A
origem deste nome está hoje bem averiguada. Na margem esquerda do Douro, onde
hoje se chama Gaia, havia uma povoação com o nome de Cale. Pequena
ou grande, era a única povoação da entrada do rio, e por isso o porto se
chamou Portus Cale, porto de Cale. Querem alguns que a terra
tivesse sido povoada por gauleses que deram ao porto o nome de Portus
Galorum, ou Portus Galiæ. Eu não creio que esse intrincado
ponto mereça a pena de ser resolvido.
A
verdade é que o nome de Cale figura no itinerário de Antonino,
que a designação Portucale data do século V, e que a aldeia de
Gaia ainda em 912 se chamava assim. O território vizinho e dependente de Portucale foi-lhe
a pouco e pouco tomando o nome, deixando ao burgo primitivo a denominação de
Cale, que também insensivelmente se converteu na de Gaia.
Os
cristãos aproveitaram a inexpugnável posição fronteira, e fortificaram-na.
Desde então houve na margem direita o Portucale Castrum novum, e na
outra o Portucale Castrum antiquum, ou por outra fortaleza velha, e
fortaleza nova, ambas com o nome de Portucale. De nome de cidadela
passou a designação de distrito, daí a condado, e mais tarde a reino, segundo a
conquista cristã se alargou mais, e à medida que a administração e governo
deram a esse trato de território alguma homogeneidade.
Deixemos
pois o nome latino de lusitanos, mesmo com o risco de desagradarmos a três ou
quatro idolatras das tradições romanas, e fiquemos portucalenses, já que daí
nos transformamos em portugueses. É melhor guardar o nome que é feitura nossa,
do que andarmos a torcer a geografia e a história para amontoar fábula sobre fábula.
[Trecho do livro]
[Trecho do livro]
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