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O Romance histórico Os Tripeiros
A ação de Os Tripeiros centra-se na vivência portuense dos acontecimentos de
1384 (de meados de Maio até depois da festa de S. João), mormente no que ao
aparelhamento da frota para socorrer Lisboa, sitiada pelo rei castelhano, diz
respeito.
O autor situa o seu romance num
momento político crucial para o reino (o que a gente da ordem chama revolução e
revolução política não estalara em tempo algum como agora) e particularmente
melindroso para o burgo, dada a iminente ameaça de invasão das tropas galegas.
A trama romântica fixa-se nos
amores de dois jovens casais - um amor impossível (entre João Bispo, cristão, e
Garifa, moura) e um amor que contraria as normas de prestigio social, entre
Fernando Vasques, o sobrinho de um, ao tempo, cidadão, comerciante de carnes e
pelames mas que começara como fressureiro (vendedor de tripas), e Irene, filha
do conhecido e reputado piloto e mercador João Ramalho.
Compõem a novela dez capítulos. O
1 A
Mensagem do Mestre, é apenas de contextualização, enquanto que os 2º, 4º, 5º e
9º desenvolvem, em exclusivo, o enredo romântico. Dois dos restantes apresentam
títulos que remetem diretamente para fatos coevos: O Recontro de Leça (7º) e O
Torneio (8º), ainda que os referentes históricos não permaneçam aí acantonados
mas se entrelacem com a ficção em todos estes capítulos (os 6º, 7º, 8º e 10º).
Os jovens rapazes enamorados desempenham um papel basilar no desenrolar dos
acontecimentos políticos. João Bispo desmascara Gonçalo Rodrigues de Sousa,
alcaide de Monsaraz, provando que ele era traidor à causa do Mestre (Tripeiros,
p. 91) e Fernando, transformado em herói no Recontro de Leça (ibid, pp.
106-112) convoca a sua veia de orador para convencer uma multidão renitente em
deixar que a carne siga para Lisboa, com uma argumentação fundacional do
epíteto dos portuenses (ibid., pp. 161-162).
Coelho Lousada economiza nas
fontes que sustentam a sua novela, limitando-se à Crônica de D. João l; aliás,
o seu discurso como que dialoga com a obra de Pernão Lopes, a ponto de aludir a
determinados episódios só perceptíveis por quem a leu.
As personagens referênciais que
convoca coincidem integralmente, sem contudo as esgotarem, com as mencionadas
pelo cronista nas passagens relacionadas com o burgo.
No entanto, Coelho Lousada
elabora uma versão livre dos circunstanciados relatos da Crônica. Não respeita
a ordem cronológica dos acontecimentos, inventando relações de causalidade que
contrariam o narrado por Fernão Lopes. Deturpa fatos. Hiperboliza situações.
Faz atuar personagens que, ao tempo, já tinham morridor. Reinventa a história pessoal
do mercador João Ramalho.
As referências ao espaço do burgo
são lacônicas, confusas, algumas incompreensíveis, outras improváveis ou
fantasiosas. Assim vejamos. É ambíguo ao mencionar a muralha, não distinguindo
a cerca velha e o muro dito fernandino. É inconclusivo quanto à localização do
bairro dos judeus. Transforma o pequeno povoado de Miragaia numa zona
cosmopolita (Tripeiros, pp. 9-10). Situa a casa de morada do antigo fressureiro
na rua dos Pelames, quando é pouco crível que um homem enriquecido não
materializasse no espaço o seu novo estatuto, fixando-se numa zona mais nobre (bid.,
p. 48). Identifica um pequeno bairro mouro (ibid., p. 34).
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Fonte:
Fonte:
Adelaide Pereira Milán da Costa:
O Romance histórico do séc. XIX nquanto factor de construção da memória da
cidade do Porto: Os Tripeiros de Coelho Lousada. Actas do Colóquio
Internacional Literatura e História. Porto, 2004, Vol I. Disponível em: ler.letras.up.pt
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