06/03/2014

Teatro Completo de Franca Junior

 Teatro Completo de Franca Junior - Iba Mendes
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As Doutoras, de França Júnior

 As Doutoras, última peça de sucesso de França Júnior, foi escrita em 1889 e encenada em 1890. Contendo quatro atos, a trama gira em torno de certas mudanças que estavam acontecendo nos lares brasileiros do século XIX, como por exemplo o ingresso das mulheres nas universidades.

O impacto dessas transformações sobre a família é abordado pelo viés cômico e uma criteriosa escolha de elementos sígnicos.

Vinda de uma família burguesa do Rio de Janeiro, filha de Maria e Manuel Praxedes, Luísa, em consonância com os pensamentos revolucionários, forma-se em Medicina e alcança o bacharelado tão sonhado pelo também revolucionário pai, Manuel.

MANUEL- A Doutora Luísa Praxedes. A doutora, sim, senhora! A mim parece-me também um sonho; mas é o título a que ela tem direito, que foi ganho à custa do seu trabalho e que é honra para a família e para a sociedade. (Ato I, Cena II, pp. 213-214).

Contudo, não é só a formação acadêmica de Luísa que deixa Manuel Praxedes eufórico – a união entre ela e o colega Pereira (recém-formado) também é motivo de orgulho para o pai. Com seu ímpeto “revolucionário”, Praxedes trata a união conjugal de ambos como exemplo edificante da Ideia Nova de casamento de conveniência que, aliás, incomoda muito a mãe da moça:

MANUEL- O casamento de conveniência, sob o ponto de vista da evolução atual, não é o casamento de dinheiro. O homem sem ofício nem benefício, que se liga a uma mulher de fortuna para viver à custa do que ela tem, deveria ser expulso da comunhão civilizada. O verdadeiro casamento de conveniência (...) consiste na união de dois seres, tendo cada um o mesmo modo de vida, a mesma profissão. O marido trabalha, a mulher trabalha. MARIA- É uma sociedade comercial.

MANUEL- Sim, mas vê o alcance enorme desta sociedade. Não é só a formação do pecúlio do casal, mas muito principalmente o desenvolvimento das classes, a seleção delas. O marido médico, a mulher médica... todos os filhos médicos...O marido advogado, a mulher advogada... (Ato I, Cena II, pp. 220-221).

Em razão disso, essa união é posta em questão por Maria Praxedes, que questiona a relação sentimental entre Luísa e Pereira, pois eles discutem o tempo todo suas teorias médicas, o que interfere na vida do casal. Contudo, o casamento acontece, o empenho profissional do Doutor e da Doutora Pereira é árduo e as discussões entre o casal continuam, agora também porque disputam pacientes. Luísa possui tantos pacientes quanto o Dr. Pereira e, por vezes, sente-se indisposta, causando preocupação à mãe e à criada portuguesa Eulália.

O grande problema ocorre quando Luísa, especialista em moléstias de senhoras e crianças, atende em seu consultório o doente Gregório. A Doutora prontamente o recebe e dá-lhe uma consulta. O Dr. Pereira descobre e mais uma discussão acontece, porém agora com tom de divórcio:

DR. PEREIRA- Minha senhora, chegamos a um estado em que a nossa vida juntos vai-se tornar impossível. Ou eu hei de abdicar à minha autonomia profissional, ou, o que é mais triste ainda, à minha posição de chefe na família, ou a senhora conserve-se no lugar que lhe compete. (Ato II, Cena X, pp. 261-262).

Luísa, com o orgulho ferido, diz que também deseja o divórcio. Então, pede auxílio ao advogado Martins que, assustado com o rumo dos acontecimentos, não encontra solução para o  caso, visto que na época não havia divórcio que não fosse por adultério ou sevícias. Como também era amigo da família, propõe a ela uma reconciliação. Mas a médica, decidida, está segura da decisão tomada O clímax acontece quando Dr. Pereira pede conselhos profissionais à segunda doutora da peça, a advogada Carlota de Aguiar. Mulher pública, portadora de grande domínio da linguagem, desempenha seu cargo com eficácia nos tribunais da cidade e goza de prestígio nos jornais.

Carlota, ao contrário de Martins, encontra uma saída para o divórcio e trama uma nova interpretação da lei para conseguir a separação; ainda propõe ao Dr. Pereira que, estando livre, poderá ele se casar novamente e com uma mulher de profissão diferente da que exerce, como uma advogada, por exemplo. Carlota, então, combina um novo encontro para falarem melhor sobre a situação e as implicações legais do caso.

 Luísa, escondida atrás da cortina da porta, escuta tudo e espera a saída da advogada para iniciar com Pereira outra discussão, tendo um ataque de ciúmes:

LUÍSA- Ah! ela queria vê-lo livre e desembaraçado... Para isto bastavam duas coisas apenas, duas coisas insignificantes, na opinião daquela miserável, torcer a lei e renegar as crenças! (Ato III, Cena XII, p. 309).

 A mãe aplaude a crise de ciúmes da filha e renova a esperança de que o casamento de
Luísa e Dr. Pereira seja salvo. O que se confirma quando Pereira percebe que as tonturas e enjoos que a Doutora vem sentindo são decorrentes da gravidez da esposa, a quem ele acolhe carinhosamente.

O desfecho segue, assim, para o curso natural do papel social das mulheres naquela época:

Luísa para de clinicar e se dedica a Luisinho, filho do casal.

Por volta de um ano depois, a família Pereira recebe a visita de Carlota e Martins, agora
casados e com uma criança no colo, Luisinha. Mesmo indignado com a atitude da filha de deixar tantos anos de estudo para a dedicação materna, Manuel finaliza a obra depositando em Luisinho, filho de Luísa e Pereira, sua esperança revolucionária:

MARIA- (a Praxedes) – Olha, meu amigo, em que deu o teu programa filosófico, político,  moral e social, a tua evolução do futuro.

MANUEL- Sim, mas não perdi de todo o meu latim. (tomando a criança e mostrando-a a todos) Aqui está um médico de raça! (dá-lhe muitos beijos). (Ato IV, Cena XV, p. 348).

[...]


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Fonte:
Emerson Calil Rossetti e Juliana de Oliveira Gonçalves Brandão: “Elementos de teatralidade e comicidade em as Doutoras de França Júnior”. Revista Eletrônica de Educação e Ciência – REEC Volume 02 Número 01 Março/2012 Páginas 10-29. Disponível em: http://www.fira.edu.br/

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