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Camilo pendular: o olhar
da tradição
A partir das sugestões interpretativas
de Teófilo Braga, importantes e respeitados estudiosos da Literatura Portuguesa não parecem propor
grandes mudanças analíticas. Feliciano Ramos em sua História da Literatura
Portuguesa retoma a análise psicológico-biográfica reconhecendo nos antepassados
do escritor “gente falha de integridade psíquica e moral”, herança que “[...] imprimiu
[...] caráter ao homem, e predispô-lo para desvairamentos e atos
indisciplinados. O seu temperamento literário foi permeável a tais práticas”
(1950, p.497). Mais uma vez, esse temperamento inconstante do escritor justifica
sua produção que para Ramos pode ser dividida em duas fases: “novela passional” e “realismo”.
Tal
dualidade que cinge a obra camiliana, é definida de forma canônica por Saraiva
e Lopes em sua História da Literatura Portuguesa. Reconhecendo na
trajetória camiliana três grandes momentos – uma espécie de evolução do início
de sua produção até os anos de 1850; uma fase intermediária que abarca os anos de
1850 a 1875;
e, finalmente, após 1875, já em seus últimos anos de produção, nos quais tem sua
obra influenciada pelas características do Realismo-Naturalismo – Saraiva e Lopes
dão especial atenção à fase intermediária, na qual, segundo eles “Camilo depura
o esquema da novela passional” (1984, p.782) e, paralelamente, desenvolve o
gênero da novela satírica de costumes. Para os críticos estas seriam as “duas tendências
alternativas” suficientes para definir a maior parte das produções camilianas nos
25 anos mais produtivos da vida do escritor.
Assim sendo, criam-se então
dois grandes blocos que já haviam sido anteriormente sugeridos por Teófilo Braga. O “idealista
sentimental”, responsável pela construção das novelas passionais adotaria a chamada
“religião do amor” na qual há uma promoção “do amor a categoria do sagrado, do
incomensurável com as normas morais correntes”
(SARAIVA; LOPES, 1984, p. 784). Já o “caricaturista”, responsável pelas novelas satíricas de costumes,
dar-nos-ia “o quadro de uma vida inteiramente dirigida pela sordidez argentária,
pelos prazeres da digestão planturosa, pela ânsia hipócrita, refalsada e brutal
da supremacia social, e por outras satisfações vulgares” (1984, p.782).
Portanto, a despeito da vastidão da produção e contrariando qualquer possibilidade
de inovação, atribui-se a obra camiliana a imagem de dois grandes rótulos que muito
embora facilitem a classificação e análise dos romances, inegavelmente simplificam um legado que se mostra mais complexo do que
parece.
A simplificação,
entretanto, não pára por aqui. Para além de categorizar sistematicamente os
romances camilianos, a maior parte dos estudos, indiscutivelmente dará maior atenção
às chamadas novelas passionais, gênero que, segundo ela, mais marcou a carreira de Camilo e que o imortalizou como o
maior representante do Ultra-romantismo português.
Com relação
a esse gênero, grande parte da crítica detecta uma espécie de fórmula que,
tirante seus detalhes, permanece a mesma em todas as narrativas passionais. Segundo Massaud Moisés, por exemplo,
[...] a novela
camiliana muda apenas e sempre no tocante ao enredo [...], mas o módulo central permanece
invariavelmente o mesmo [...]: sempre
o amor impossível e superior, ou marginal aos preconceitos sociais, pois brota do mais fundo da carne
e da alma, levando ao desvario
os apaixonados com as promessas duma bem-aventurança via de regra malograda. (1967, p.212).
Já para
Jacinto do Prado Coelho, um dos mais respeitados camilianistas, “a novela camiliana
típica, reduzido o enredo a esquema, não passa duma história passional para sacudir
os nervos e entreter a imaginação do leitor” (2001, p.465); “Camilo nos transporta
a um clima psicológico em que dominam as desgraças amorosas, os destinos cruéis, as vinganças terríveis e os remorsos
que matam” (2001, p.240).
Não é meu interesse aqui –
e seria demasiado cansativo – fazer uma recolha de todas as passagens
analíticas que simplificam a chamada novela passional camiliana. É apenas de grande valia destacar que a maior
parte das análises operadas desde a contemporaneidade do autor – em especial
aquelas presentes em histórias literárias – é incansavelmente reproduzida,
sendo igualmente reducionista. Entretanto, embora simplista, é esta a imagem que
hoje nos chega solidificada de um dos maiores romancistas
do século dezenove português.
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Fonte:
Juliana Yokoo Garcia: “Amores contrariados, puros e abnegados?”. (Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Literatura Portuguesa do Departamento de Letras Clássicas e Vernáculas da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo para obtenção do título de Mestre em Letras. Orientador: Professor Doutor Paulo Fernando da Motta de Oliveira). São Paulo, 2008.
Fonte:
Juliana Yokoo Garcia: “Amores contrariados, puros e abnegados?”. (Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Literatura Portuguesa do Departamento de Letras Clássicas e Vernáculas da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo para obtenção do título de Mestre em Letras. Orientador: Professor Doutor Paulo Fernando da Motta de Oliveira). São Paulo, 2008.
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