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O Romance O
Sertanejo e a Brasilidade (resumo - análise)
O
autor inicia essa obra demonstrando um pouco de nostalgia em relação ao seu mundo interiorano, onde passara a infância,
conforme se pode observar pela frase inicial do romance:
“Quando
te tornarei a ver, sertão da minha terra, que atravessei há muitos anos, na
aurora serena e feliz da minha infância? Quando tornarei a respirar tuas auras
impregnadas de perfumes agrestes, nas quais o homem comunga a seiva dessa
natureza possante?.”
Essas
indagações do autor nos levam a perceber que, da perspectiva de Alencar, o
sertanejo era quem ainda vivia em contato direto com a natureza, e que dela
poderia absorver sua força física e sua energia. Quanto mais proximamente o
homem vivesse da natureza, maior seria a intensidade com que ele se
beneficiaria da força da natureza, pois a vida no sertão lhe permite o
conhecimento da mata e estreita a sua relação com a natureza, o que nos revela
uma grande marca de brasilidade na obra.
É o podemos comprovar pelo seguinte
trecho da obra: “Para o sertanejo a floresta é um mundo, e cada árvore um amigo
ou um conhecido a quem saúda, passando. A seu olhar perspicaz as clareiras, as
brenhas, as coroas de mato, distinguem-se melhor do que as praças e ruas com
seus letreiros e números.” (O
sertanejo, p. 46)
Num
primeiro momento, parece-nos que os romances chamados regionalistas ou
sertanistas nascem dessa nostalgia do autor em relação às suas lembranças da
infância vivida no interior do Ceará. Porém, no prefácio a Sonhos d`Ouro
(1872), quando Alencar explica o que pretendia ao revelar o interior do País,
vamos encontrar razões mais fortes para a sua real intenção ao retratar o
interior do país:
Onde não se propaga com rapidez a luz da
civilização que de repente cambia a cor local, encontra-se ainda em sua pureza
original, sem mescla, esse viver singelo de nosso país, tradições, costumes e
linguagem, com um sainete todo brasileiro. Há, não somente no país, como nas
grandes cidades, até mesmo na corte, desses recantos, que guardam intacto, ou
quase, o passado.
Desta
passagem, podemos depreender a idéia de que, para Alencar, a verdadeira
essência brasileira, na sua condição mais original e simples, está no mundo
rural, no interior do país, o que mais uma vez revela o projeto do romancista
em mapear o país, revelando-o em toda a sua extensão geográfica, mostrando a
unidade da nação, os modos de vida do homem do interior, enfim, os aspectos
mais originais da vida rural. É justamente o que encontramos em O sertanejo: o
campo resguardado das influências dos centros urbanos, o campo que ainda
conserva em sua forma original de viver, as tradições e costumes do país, “com
um sainete todo brasileiro”
Assim,
nos romances regionalistas, vamos perceber o interesse de Alencar em focalizar,
da perspectiva romântica e, ainda que, de maneira imaginária, o aspecto
interior de cada região, o modo de vida de seus habitantes, seus costumes,
hábitos, tradições e as relações sociais ou os aspectos da vida coletiva,
deixando de lado os traços urbanos das capitais para revelar a capacidade do
homem do campo em aliar seus hábitos sociais à beleza natural das terras
brasileiras.
Para
Coutinho (1986, p. 262), o romance regionalista no romantismo de Alencar
significa o deslocamento do interesse do autor, do geral nacional para o geral
regional, já que depois de ter iniciado o registro da vida brasileira como um
todo, Alencar, como que limitando seu ponto de observação, propõe um romance
representativo de determinadas regiões, seja porque elas lhe pareçam mais
diferenciadas e de traços mais fortes, ou porque elas seriam regiões que
naturalmente dividiam o país: o norte, o centro e o sul. E dentro de cada uma
delas focalizaria o aspecto interior, a vida agrícola com suas peculiaridades,
seus hábitos, seus costumes, suas tradições, as relações sociais aí
verificadas, os pormenores da vida coletiva, abandonando o aspecto urbano das
capitais e ressaltando a figura do sertanejo, do homem do interior, valorizando
o seu modo de vida e o meio rural.
Importa
ressaltar que, embora o autor direcione sua atenção para o interior, ele não perde
de vista seu propósito maior: o de revelar pela descrição da paisagem física e
social do Brasil todas as belezas e singularidades da nação recém-independente.
Assim,
O sertanejo, uma das obras regionalistas de Alencar, pode, ser tomado como um
de seus romances mais brasileiros, pois nele percebemos o quanto Alencar dá
expansão ao seu estilo e gênero descritivos. É como afirma M. Cavalcanti
Proença “O sertanejo é um fragmento
do grande mural da nacionalidade que J. de Alencar realizou na sua obra de romancista”.
Nele,
assim como na maioria de seus romances, a natureza simples e bela ocupam lugar de destaque na obra.
Conforme
afirma Coutinho (1986) Alencar, embora não tenha sido o primeiro a publicar um
romance regionalista no Brasil – Bernardo de Guimarães e Franklin Távora já
haviam iniciado a publicação de suas obras - sobressaiu em relação aos demais
pelo cuidado em apreender e revelar o processo de desenvolvimento entre a vida
das capitais e a vida rural, demonstrando uma tendência realista já verificada
nos romances histórico e urbano. É importante ressaltar, ainda segundo Coutinho
(1986), que “o romance regionalista, na literatura universal, nasceu da
atividade e da estética românticas, como possível fruto da reação contra o
subjetivismo exagerado, cujo epifenômeno era a hipertrofia do eu”. (COUTINHO,
1986, p. 263)
O
mesmo autor explica que, no caso do Brasil, esse tipo de romance também nasceu
da estética romântica, mas não de uma reação ao subjetivismo exagerado, mas de
uma tendência realista que deu suporte e inspiração ao romance histórico.
O Sertanejo de Alencar torna-se, assim, um desdobramento do
romance histórico, elaborado a partir dessa tendência realista, o que lhe
configura o aspecto regionalista, embora haja por parte de vários historiadores
e críticos a tendência em não incluir o romance regionalista em nosso
Romantismo. No entanto, Coutinho (1986) entende essa parte da obra de Alencar
como regionalista, pois nela uma unidade regional está, tanto quanto o possível
representada e tem lugar de importância dentro da obra.
Por
exemplo, a região em que se passa O sertanejo, não é a mesma em que se passa O
gaúcho, nem no aspecto físico nem tampouco nos seus aspectos geográficos e
culturais. Podemos até dizer que Arnaldo guarda algumas características de
Peri, mas o mesmo não podemos afirmar em relação à figura do sertanejo com a de
Manoel Canho, pois tanto um quanto outro são produtos de meios diferentes, mas
sob uma perspectiva, que é a do autor. E essa perspectiva era romântica, e nem
se poderia exigir que não fosse, como aqueles que reprovam e criticam Alencar
por não ter aprofundado o seu regionalismo. O romance regionalista de Alencar
talvez represente, dentro de sua obra e mesmo no conjunto do romance romântico,
segundo Coutinho (1986),
aquele aspecto em que mais e melhor se
desenvolveu e fixou a tendência realista do nosso Romantismo. Foi preocupação
sua, aqui ou nos temas indígenas, registrar o que havia de típico em nossa
sociedade rural, desde o comportamento individual e as relações domésticas, até
o registro do folclore. (COUTINHO,
1856, p. 264)
Acrescenta-se
a isso, os dizeres do crítico Agripino Grieco (apud COUTINHO, 1986) sobre a
importância de Alencar para o estudo de nossas tradições, quando afirma que
Alencar “foi o autor que pretendeu ver um país em conjunto, de extremo a
extremo, e se tornou o grande poeta, o grande historiador, o grande pintor
desse país.” Grieco (apud COUTINHO, 1986, p. 264)
É
o que pode ser confirmado, também, nas palavras de Machado de Assis (1962),
quando assim se refere a Alencar:
O espírito de Alencar percorreu as
diversas partes de nossa terra, o norte e o sul, a cidade e o sertão, a mata e
o pampa, fixando-as em suas páginas, compondo assim com as diferenças da vida,
das zonas e dos tempos, a unidade nacional de sua obra. (ASSIS, 1962, p. 625)
Seus
romances regionalistas demonstram o interesse pelas regiões mais distantes do
Brasil, aliando os hábitos sociais da vida do homem do campo à beleza natural
das terras brasileiras. Ao contrário das obras urbanas em que as mulheres eram
figuras centrais, nos romances regionalistas os homens são figuras centrais,
com toda a sua ignorância e rudeza, enfrentando os desafios da vida. As
mulheres assumem papéis submissos e frágeis.
Finalmente, é preciso admitir que Alencar, se não realizou todo o seu
projeto de construção de uma literatura genuinamente brasileira, pelo menos,
abriu, através dos romances regionalistas, o caminho para o surgimento de um
grupo de escritores denominados regionalistas, isto é, escritores que,
preocupados em revelar o Brasil na sua variedade geográfica, com seus hábitos
específicos, passaram a produzir uma literatura de afirmação da nacionalidade
através da valorização e expressão da vida do homem do interior. Para tanto,
focalizavam as regiões revelando seus hábitos, crenças e sua a linguagem.
Vemos, pois, que Alencar, ao focalizar em seus
romances uma determinada região, como é o caso do Ceará em O sertanejo, não
estava preocupado, especificamente com o regional, mas com o nacional. Assim
sendo, é possível admitirmos que o elemento regional foi focalizado para
revelar a diversidade, a grandiosidade do país em todos os seus aspectos
sociais, culturais, geográficos e lingüísticos.
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Fonte:
Silvana Rodrigues de Souza Queiroz: “O VOCABULÁRIO ALENCARIANO DE O SERTANEJO: UMA ANÁLISE LÉXICO-SEMÂNTICA” (Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação em Lingüística – Curso de Mestrado em Lingüística do Instituto de Letras e Lingüística da Universidade Federal de Uberlândia, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Lingüística. Orientador: Prof. Dr. Evandro Silva Martins). Universidade Federal de Uberlândia, 2006
Fonte:
Silvana Rodrigues de Souza Queiroz: “O VOCABULÁRIO ALENCARIANO DE O SERTANEJO: UMA ANÁLISE LÉXICO-SEMÂNTICA” (Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação em Lingüística – Curso de Mestrado em Lingüística do Instituto de Letras e Lingüística da Universidade Federal de Uberlândia, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Lingüística. Orientador: Prof. Dr. Evandro Silva Martins). Universidade Federal de Uberlândia, 2006
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