05/10/2013

Memórias Póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis (PDF)

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Breve análise de “Memórias Póstumas de Brás Cubas”

Publicado em 1881, este será o primeiro romance da chamada fase “realista” de Machado de Assis. O foco narrativo é de primeira pessoa. Brás Cubas, o narrador, não é apenas um personagem que rememora o passado; é também um narrador que escreve suas memórias., a despeito de estar morto... Temos, pois, algo da história fantástica. Por estar morto e, portanto, disponível e sem a pressa que caracteriza aos vivos, Brás Cubas faz de sua vida passada uma narração descontínua, embora as linhas principais daquilo que ele julga mais importante sejam respeitadas. Assim, há um fio principal que liga os eventos mais importantes de sua passagem na terra, e outro fio, de baixo relevo, mas não menos interessante, que liga um amontoado de circunstâncias menores às quais todavia o narrador empresta uma vitalidade muito maior, porque são essas pequeninas notações corriqueiras que o narrador aproveita para fazer digressões finas e inteligentes sobre todo um conjunto de mitos da cultura (filosóficos, morais, religiosos, etc). De maneira que de um lado — teremos a aparição inicial do narrador (que se diz morto); a narração das circunstâncias que o levariam a morte, bem como o “delírio”; volta imediata para a infância; o primeiro amor (Marcela, que o enganaria); a ida forçada a Portugal (viagem de estudos); a morte de sua mãe e a volta ao Brasil; o projeto paterno de torná-lo deputado através de um futuroso matrimônio com Virgília; o casamento de Virgília com Lobo Neves (desiludindo o amor do filho e as esperanças do pai); o reencontro com Quincas Borba, amigo de infância, “livre pensador”, fundador de uma nova filosofia, o humanitismo; as relações adulterinas com Virgília; a morte de Quincas Borba, e finalmente a morte do próprio Brás Cubas, fechando o livro. Estes seriam os acontecimentos do que chamamos “fio principal”. O outro fio, das circunstâncias menores da vida, é uma espécie de costura transversal no vasto tecido das ocorrências principais. Não se pense que se trata de pormenores sem vinculação direta com a narrativa maior. Pelo contrário, é a análise, a digressão sobre tais circunstâncias menores que nos dá o caráter de Brás Cubas num plano mais amplo, mais abrangente. A esse respeito, leiam-se os capítulos XVI (“Uma reflexão imoral”), XIX (“A bordo”, uma das peças mais patéticas de toda nossa literatura) ou ainda o XXVI (“O autor hesita”, belo exercício de maneirismo paródico); ou então leia-se “A borboleta preta” (cap. XXXI, admirável por tudo, especialmente pela “antecipação” freudiana). Enfim, há mais de duas dezenas de capítulos com essa função.

Vemos assim que o narrador vai combinando vários tipos e temas, às vezes por simples justaposição ou veleidade associativa. É que a condição de morto e de certa forma um morto não redimido moralmente — abre possibilidades digamos infinitas de conversa, uma vez que não é essencialmente do passado que ele fala, mas do significado do tempo e da vida. Brás Cubas, contudo, não faz uma reflexão democrática, nem se interroga sobre o significado do tempo e da vida. Ele tem certeza do que fala, uma vez que esta morto e nada de maravilhoso aconteceu. Simplesmente nada aconteceu além da própria morte. Não há nenhum apocalipse. Não há os anjos. Não há nada depois da morte. Isto significa niilismo, negatividade absoluta. Por isso mesmo ele não tem de se arrepender de nada. Só nos arrependemos quando reconhecemos o erro, quando apontam nossa fuga ou nossa ofensa a um certo modelo “ideal” ou religioso. Mas para Brás Cubas não há nenhum modelo fora de seu próprio desejo. Enfim, temos impressão de que se ele voltasse a viver, faria tudo que já tinha feito. Brás Cubas faz pensar naquela velha verdade de que há modos e modos de se dizer as coisas. Cínico, cruel, sádico, pessimista, prevaricador, todos esses caracteres se contrabalançam com a distinção e polidez de sua escrita. Antes de tudo, Brás Cubas é o tipo de homem “educado”, tem a misteriosa tática de dizer o escabroso sem parecer escabroso. Noutros termos, o leitor se enreda na teia mirífica de Brás Cubas, na polidez e engenho do narrador.



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Fonte:
A. Medina Rodrigues, Dácio A. de Castro e Ivan P. Teixeira: “Antologia da Literatura Brasileira: do Classicismo a Pré-modernismo” – Volume I. Marco Editorial. São Paulo, 1979.

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