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O governo progressista cede ante as exigências da Grã-Bretanha
Os primeiros dias de janeiro de 1890 ainda refletiram as benignas
razões dadas pelo sr. Barros Gomes ao governo inglês. Não se podia exautorar
Pereira Ferraz e Serpa Pinto— dizia o ministro e diziam alguns jornais de
Lisboa — Prestando apenas crédito às informações dos funcionários britânicos.
Era necessário ouvir os dois expedicionários e ouvir-lhes as alegações que,
decerto, produziriam sobre a sua atitude em tão melindroso assunto. Uma parte
da imprensa acreditava até ingenuamente que a Inglaterra não tardaria a
modificar o tom agressivo das suas notas diplomáticas, substituindo-o por outro
de feição conciliadora: “em primeiro lugar, porque assim o quer o respeito devido
por cada nação a todas as outras; em segundo lugar, porque, se procurasse
entregar à violência a decisão de um pleito em que devem ser ouvidos e
escutados os argumentos de parte a parte e em que a justiça ou a equidade deve
proferir sentença em única instância, não só concitaria a nossa resistência
mas, porventura, também provocaria a indignação do mundo”. E essa parte da
imprensa ia mesmo mais longe na sua ingenuidade: “A Grã-Bretanha sabe que,
embora sejam enormes as suas forças comparadas com as nossas, poderia
arriscar-se a revezes se desrasoadamente acendesse a guerra na África...”
Ao abrir-se o parlamento, o rei D. Carlos, que, pela primeira vez, se
apresentava a desempenhar o seu papel constitucional de “chave de todos os
poderes”, lendo o clássico discurso da coroa, sublinhou estas passagens, que a
assembleia dos representantes da nação escutou com rara e justificada avidez:
“Recentemente as patrióticas aspirações da nação inglesa e do
governo de sua majestade britânica, a dilatarem as suas vastas possessões na
África, encontraram-se em mais de um ponto desse continente, com o firme
propósito de Portugal de conservar sob o seu domínio e de utilizar para a
civilização os territórios africanos que primeiro foram descobertos e trilhados
pelos portugueses, por eles foram revelados e abertos às missões
do cristianismo e às operações do comércio e nos quais as autoridades
portuguesas têm praticado os atos de jurisdição e influência consentâneos ao
estado social dos seus habitantes, atos que sempre bastaram para significar
domínio incontestável.
“Este encontro pôs em relevo desacordos de opinião entre o meu governo
e o de sua majestade britânica acerca das condições a que devem satisfazer e
dos títulos que têm de aduzir as soberanias europeias em África, para serem
reconhecidas pelas potências, e desses desacordos resultou uma correspondência
diplomática que ainda os não pôde sanar e que também houve de ocupar-se de
outras divergências, posteriormente suscitadas, sobre o modo de apreciar um
conflito, ocorrido nas margens do Chire, entre uma tribo indígena e uma
expedição científica portuguesa. O meu governo, inspirando-se no sentimento
nacional e conformando-se com o voto unânime das duas casas do parlamento, tem
diligenciado convencer o de sua majestade britânica do direito que assiste a
Portugal de reger os territórios ao sul e norte do Zambeze sobre que versa a
mencionada correspondência, limitando-se, durante o incidente e em todos os
seus termos, a manter domínios que sempre reivindicou, e reiterar declarações
que sempre fez. E nesta atitude persistirá com o apoio, que decerto lhe não há
de faltar, dos representantes da nação, esperando conseguir uma equitativa
conciliação de todos os legítimos interesses, que prontamente restabeleça, como
eu desejo, o perfeito acordo entre os governos de duas nações ligadas por
vínculos de amizade e tradições seculares”.
Pura ilusão! No dia 5 de janeiro, o ministro inglês em Lisboa,
rebatendo a asseveração do sr. Barros Gomes de que Serpa Pinto, travando
combate com os macololos, se limitara a “repelir o ataque de uma tribo hostil”
escrevia-lhe notando que “essa asseveração não parecia ao seu governo de muito
peso, pois que a ação dos macololos, quer tivessem ou não tomado a ofensiva,
fora unicamente determinada pelo desejo de proteger o seu território contra a
invasão dos portugueses”. A questão atingia, evidentemente, a sua fase aguda.
O Times, referindo-se-lhe, dizia que, se a Inglaterra não tomasse
prontas providências “para apagar a impressão causada pelas incursões do major
Serpa Pinto, toda a região dos Lagos Africanos se incendiaria; os macololos
tinham visto a Inglaterra grosseiramente ultrajada; era necessário que a vissem
reivindicar claramente a sua honra”. Por outro lado, o governo português,
desejoso, sem dúvida, de atenuar um pouco a irritação que o da Grã-Bretanha
denunciara na nota de 5 de janeiro, havia ordenado a Serpa Pinto que recolhesse
à metrópole. Mas nem com isso o colosso amorteceu a pancada.
[Trecho do livro]
[Trecho do livro]
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